13

57 12 0
                                    

Sebastian

— Seu filho de uma…
— Cuidado com o que vai falar. Apesar de não gostar da minha mãe, acho que a falecida
ao menos merece respeito…
— Ela teria desgosto de ver o brutamontes que você se tornou.
Não consegui me desgrudar do seu corpo, as mãos envolvidas em torno da sua cintura
delicada, o desejo de senti-la pele a pele correndo na veia, mas as roupas que não me importei
em tirar antes de nos jogar na água me impediam de fazer isso.
Uma loucura.
Não pensei direito quando decidi encerrar nossa pequena discussão com um banho na
cachoeira. É claro que isso se dava porque Carolina tinha língua afiada, era arisca e mostrava as
unhas igual a uma gata felina assim que botava os olhos em mim, nada mais justo que acalmar os
ânimos nos jogando dentro da água.
Só assim para apagar seu fogo.
Digo, o que ela tinha na boca.
Aos poucos, a duras penas, fui soltando-a, mesmo que a minha vontade fosse outra, de
continuar ali, bem agarradinho à gata valente.
— Acho que esse não é um bom momento para falarmos sobre alguém que já morreu, não
é mesmo? — Dei uma gargalhada, sem conseguir tirar o olhar dela.
— Você está certo, ainda mais que estamos no meio do nada, vai que acontece alguma
coisa. — Carolina mergulhou, deixando-me sem a visão do seu corpinho e rosto de anjo.Maldita.
— Onde pensa que vai? Volta aqui… — Fiquei aéreo, procurando-a.
Eu não gostava de nadar, nem mesmo em uma cachoeira, onde poderia facilmente ser
picado por alguma cobra ou outra coisa. Só que esta foi uma das habilidades que aprendi ainda
criança, meu pai me ensinou isso, dentre várias outras coisas do campo. Até mesmo plantar café.
Um barão precisava saber disso.
Eu sempre soube. Só que escolhi ganhar o mundo, estudar em outro país, viver em outra
cultura e trabalhar bem longe da fazenda. Foi uma decisão minha e nunca cheguei a me
arrepender por ter feito isso.
As últimas semanas vivendo no campo, na tranquilidade do aconchego da casa do meu pai,
a vida pacata e monótona me fizeram ter cada vez mais certeza de que meu lugar não era ali, e
sim bem longe. Pela primeira vez senti saudade da rotina agitada, de chegar tarde após um dia de
trabalho e reuniões, até mesmo de dar de cara com Luciana me fazendo perguntas idiotas,
fingindo que era ainda minha esposa. Senti saudade do meu filho e dos raros momentos que
tínhamos juntos.
E doeu constatar tudo isso.
Duas semanas se passaram e tudo continuava igual.
As filiais estavam todas dentro dos conformes, mesmo na minha ausência, o que não estava
realmente bem era a fazenda. Augusto não conseguiu descobrir nada sobre as saídas do caixa,
nenhum papel, nem um rastro sequer para indicar um furo que pudesse colocar meu pai como
culpado. E isso tirou meu sono, já que graças a esta situação teria que estender a minha estada na
cidade.
Porra!
Marcos Ward era impassível, e as nossas conversas foram diminuindo, visto que ele só
falava em comprar as terras da família Santos. Eu iria enrolar meu pai pelo tempo que
conseguisse, até descobrir que a solução para seus problemas não seria prejudicar aquele povo,
assim o deixaria contra a parede e tudo entraria nos eixos.
Esperava conseguir isso.
E já sabia por onde começar…
— Ficou com medo, barão?
Senti a presença de Carolina pelas minhas costas e me virei para encará-la, seus cabelos
bagunçados, a pele clara, pura e livre de procedimentos cirúrgicos, uma beleza que não se
encontrava fácil por aí.
— Que homem seria eu se estivesse com medo, hum? É claro que não estou, garota. Nem
um pouco — garanti, sem conseguir parar de fitar seus lábios rosadinhos e pequenos.Carolina revirou os olhos com desdém.
— Não tem medo de que algum funcionário de seu pai o veja comigo? Ou qualquer outra
pessoa… Sabe muito bem que isso pode virar fofoca.
Era uma probabilidade.
E nem sei como fui parar na cachoeira. Eu acordei disposto a passar um tempo na
plantação de café, conhecer mais e participar ativamente, até o momento em que saí andando
sem destino e vim parar no lugar que era meu ponto de diversão quando ainda tinha pouco
menos de dez anos.
— E o que o povo iria falar, senhorita?
— Que você está de casinho comigo — disse sorrateira, rindo. — E que sou pobre demais
para alguém do seu nível. Então, se não quiser estar na boca do povo, é melhor nunca mais fazer
o que fez agora há pouco.
— Desculpe, Carolina. É que não tinha outra forma melhor de fazer isso. — Mordi a ponta
do lábio.
— Fazer o quê?
— Apagar seu fogo.
Vi os olhos de jabuticaba se arregalarem.
— Está me chamando de dragão? É isso?
— Eu? Jamais! — neguei. — É claro que te acho uma gata felina, arisca, pobretona, mas é
só isso…
Eu não pensava isso dela, falei com intenção de provocá-la um pouco, só para ver seu rosto
ganhar um tom de fúria, de quem iria se defender com unhas e dentes. Era como se fosse uma
espécie de fetiche, já que nenhuma dentre todas as mulheres que eu conhecera chegara nem perto
da personalidade de Carolina.
Ela era única.
Inigualável.
Então eu meio que amava vê-la brava.
— Ah, é! Se sou um Dragão que solta fogo, você é um Curupira. — Sem esperar, ela rodou
a mão na minha cara. — Velho, chato e fora de época.
Senti só a ardência do tapa, mas não reclamei. Tudo que fiz foi dar risada.
— Pelo visto, não podemos ficar mais de dois minutos perto um do outro. Acontece
sempre a mesma coisa.
— Foi você que apareceu aqui do nada! — Soltou um longo suspiro.— Como você bem disse antes, até onde sei este é um lugar público.
— Vou ficar sem vir aqui até o dia em que o senhor for embora da cidade.
Franzi o cenho.
— Está contando os dias para isso?
— E rezando também. — Deu um sorrisinho. — Veio aqui disposto a comprar minhas
terras e, como não conseguiu, só te resta ir embora.
— Só tentei uma vez, Carolina. Como pode se dar por vitoriosa?
— Não tente uma segunda vez, ou, em vez de um tapa, será um chute no meio dos seus
ovos murchos.
— Agora você foi muito baixo, garota. Quem te disse que meus ovos são murchos? Foi sua
imaginação fértil?
— Um homem como você, com essa idade, é claro que tudo já deve ter caído… Flácido,
acabado, saturado.
Dei uma gargalhada alta.
Como ela ousa?
Eu poderia muito bem mostrar que a garota estava errada, mas seria desrespeitoso e ia
contra meus conceitos.
— Só não abaixo as calças e te mostro meus ovos porque, como eu bem disse, sou um
velho, mas de respeito.
— E assim me protege de ter pesadelos à noite. Quer saber, Sebastian? Até nunca mais.
Fiquei parado, estático, vendo-a mergulhar até a beira da cachoeira.
Eu não iria atrás, nem pediria desculpas, o mais correto a fazer era continuarmos afastados,
assim como estávamos por todos esses dias. Não fui mais à festa da padroeira da cidade para não
ter a chance de cruzar com ela, visto que todos os nossos encontros acabavam assim. Ela me
ofendendo e eu, devolvendo na mesma moeda.
Éramos um caos.
A soma de uma sequência de erros.
Fiquei igual a um tonto, babando, vendo-a recolher as roupas, vestir apressada para pegar a
bicicleta e sumir do meu campo de visão.
Era melhor assim…

Dêem ⭐

Os trigêmeos perdidos Onde histórias criam vida. Descubra agora