Sebastian
— Então… Pode me dizer por que estava andando como se estivesse sem rumo? —
Encostei-me no capô do carro, observando a vista à nossa frente.
Estávamos na parte alta da cidade, onde era possível vê-la por inteiro, de uma ponta à
outra, as casas espalhadas, montanhas, fazendas, tudo verde, visto que passara a época do
inverno, uma vasta e linda imagem para se admirar. Carolina que escolhera aquele lugar, eu não
fazia nem ideia de como chegar até ali. Tinha passado tanto tempo longe daquelas terras e mal
reconhecia minhas próprias origens.
Tudo ali era muito lindo.
Soledade Santa era como um daqueles diamantes preciosos escondidos no meio do mundo,
a cidade tinha uma população mediana, só que isso não tirava o seu brilho, sua essência pura, a
começar porque as pessoas ali eram sempre alegres, tinham gosto por trabalhar e dava para ver
que a grande maioria das fazendas eram ricas em produção agrícola.
Todas as produtoras davam empregos para as famílias que residiam ali.
E havia a minha fazenda de café, esta sem dúvidas era a maior e ganhara destaque pela
região assim como pelo país inteiro. Eu tinha um imenso orgulho de fazer parte disso tudo, ser
originalmente reconhecido e herdeiro do império que iria renascer pelas próximas gerações,
ainda que sentisse lá no fundo que meu único filho não teria gosto para seguir os meus passos.
Pensar em Enzo fazia meu peito se apertar. O pequeno tinha obsessão por aviões, e, se este
fosse o desejo quando crescesse, então teríamos um piloto na família, porque como pai eu iria
apoiá-lo em todas as suas decisões.
Sempre.Eu nunca seria capaz de obrigar meu único filho a ser um barão de café.
Nas últimas conversas com minha ex-esposa, pudemos tratar de assuntos importantes,
como a condição neuroatípica do nosso filho, o avanço das consultas e tratamentos
especializados. Luciana falara de alguns avanços notórios, aos poucos ele aprendera a falar frases
completas, indicar alguma coisa, como quando quer comer alguma comida, eram coisas
pequenas e simples, mas que fizeram a diferença.
Saber disso me deixava em paz.
Era claro e evidente que meu herdeiro precisava ficar sob a guarda da mãe, que, apesar dos
problemas de depressão pós-parto do passado, se mostrava recuperada, estável, bem e capaz de
dar tudo aquilo que eu não teria sequer o dom de fazer em seu lugar. Como dizem: mãe é mãe.
Eu em breve iria fazer parte disso tudo, iria acompanhá-lo nas sessões de psicoterapia,
fonoaudiologia e psicopedagogia.
Por muito tempo, eu não soube a real importância de ser pai, mas aos poucos tenho me
esforçado para mudar isso e estar mais presente na vida de Enzo, ainda que nesse momento
estivesse bem longe dele.
Era questão de tempo.
— Briguei com meu pai — finalmente ouvi a voz de Carolina.
Estava voltando da casa de um funcionário do meu pai quando a encontrei perambulando
pela estrada.
Parecia perdida.
Parecia não saber para onde ir.
— Brigou com o pai — constatei, repetindo suas palavras. — Isso não é meio normal?
Sabe, discussão entre parentes acontece até nas melhores famílias… O meu sogro vivia brigando
com a esposa o tempo todo.
— Ei. Como assim? Sogro? — Carolina se afastou do carro, parando em minha frente.
— Ex — corrigi a informação. — Fui casado por muito tempo… Foi um casamento mais
comercial do que por amor — revelei.
— Merda! Casado, Sebastian… E você me beijou! — Suspirou, incrédula.
— Divorciado, baby. Há muito tempo não somos um casal, sou solteiro e livre para beijar
quem quiser. — Dei de ombros.
Não sei por que, mas senti a necessidade de falar sobre esta parte da minha vida a Carolina.
— Divorciado, entendi. Só falta me dizer que tem um filho…
— Sim. Um rapazinho pequeno. — Estendi a mão para pegar no bolso da calça o meu
celular e mostrar a foto da tela de bloqueio, onde havia o rostinho de Enzo estampado. — Aqui.— Ele é muito lindo, só que não lembra nadinha você, barão — disse, sorrindo.
— Deve ser porque eu nunca o quis, aí nasceu parecido com a mãe. Meu casamento com a
Luciana foi um arranjo em que me enfiei sem nem imaginar que ela queria encaixar no pacote
um filho. Na verdade, tivemos alguns abortos no caminho até chegar a Enzo. — Suspirei. — Ele
é o nosso bebê arco-íris.
— Entendi… Imagino que o ame muito.
— Estou aprendendo a amá-lo. — Guardei o celular de volta no bolso. — Nunca sonhei
em ser pai, mas estou me esforçando para ser um e mais presente na vida do meu filho.
— Ahn. Você está certo. — Carolina voltou a se recostar no carro, com a cabeça inclinada
para o céu. — É isso que os pais fazem. Amam os filhos.
— Estou falando esta parte da minha vida para talvez fazê-la entender que às vezes, por
amor, somos capazes de atitudes egoístas… Por exemplo, sou egoísta quando digo que não quero
a guarda total do meu filho porque sei que a mãe dele cuidará melhor que eu, que nem mesmo sei
cuidar de mim, então isso pode ser classificado como egoísmo por pensar assim, a meu ver. —
Dei de ombros. — Eu o amo o suficiente para deixá-lo com a mãe, que o ama muito.
— Isso não faz o menor sentido, Sebastian.
— Talvez sim, ou não. Quem sabe? Tudo que sei é que amo meu filho, e irei tentar ser
melhor do que nunca fui para ninguém antes, mesmo que não esteja presente cem por cento. —
Sorri largo. — E não sei o que aconteceu com você e seu pai, mas acredito que tudo vai terminar
bem.
— Eu esperava tudo, menos conhecer essa sua versão metida a advogado com um toque
suave de psicólogo. Me contou uma parte da sua vida e de quebra emendou com outra. —
Meneou a cabeça para os lados.
— Foi a única forma que achei para distraí-la. Acho que consegui.
— Mais ou menos. — Deu de ombros. — Eu nunca tive problemas com meu pai, até você
vir a minha casa com aquela história de comprar terras…
— Engraçado que aquela foi a última vez que fui importunar vocês — deixei claro.
— E foi essencial para colocar na cabeça do meu pai que vender um pedaço pode nos dar
uma condição melhorzinha de vida — resmungou.
— Sinto muito que tenha causado discórdia entre vocês. Eu fiz a proposta, mas vender ou
não é uma decisão que cabe a vocês. De toda forma, as terras foram um presente da minha mãe,
mesmo que sejam herança minha. Veja, eu poderia muito bem colocá-los para fora, mas não foi
bem o que fiz…
— E com qual direito faria isso se a doação das terras foi legalizada no cartório?
— Existem meios para persuadir, mentir, burlar as leis… Só que não foi o que fiz, nem
mesmo farei isso, Carolina. É errado e sujo. Eu fiz a proposta, cabe a você e a seu pai decidir —falei indo direto ao ponto.
Ela nem sabia que meus planos mudaram…
— Só para deixar claro… Eu não vou vender nada! Se meu pai fizer isso, é um problema
dele e não vou lidar com as consequências.
— Compreendo.
Ficamos alguns minutos sem falar mais nada.
— Acho que não podemos chamar isso de encontro, não acha? — sussurrei, quebrando o
silêncio.
— É um passeio como todos os outros — respondeu. — Até que descobri mais sobre você,
que foi casado, tem filho e blá-blá-blá.
— Pois é. É agora que te faço um convite melhor… Aceita jantar comigo?
— É pecado recusar comida. Eu aceito.
— Passo na casa da senhorita para buscá-la, às oito em ponto. Fechado?
— Claro. Fechado! — Ganhei um sorrisinho meigo como resposta.Dêem ⭐
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Os trigêmeos perdidos
ФанфикSebastian Ward passou metade da sua vida em solo americano. Herdeiro do império do café, o bilionário é um dos homens mais renomados e conceituados do mundo. Aos quarenta e três anos, tudo que Ward quer é continuar expandindo seus negócios, não impo...