Cheiro de Mato

Conversa

Passei o dia todo dentro do quarto. Decidi arrumar o meu guarda roupa, que não estava tão desarrumado ao ponto de me incomodar, mas eu precisava ocupar a mente com alguma coisa ali dentro.

Na hora do almoço, Camila não se juntou a nós, na tentativa de me ignorar novamente. À tarde, não tinha mais nenhuma tarefa para mim, por isso estava andando de um lado para o outro no corredor.

A porta do quarto de Camila estava aberta, e uma grande curiosidade gritou dentro de mim. Eu sabia que era errado invadir a privacidade dela, mas eu não tinha nada para fazer e ela mal saberia que eu estava lá.

O quarto não era muito grande, mas me lembrava dele, era um de visita, que normalmente meus avós usavam quando íamos para a fazenda nas férias. Antes era enfeitado somente com um quadro de nossa senhora, mas agora havia um quadro de um cavalo no lugar, uma cruz em cima da porta. Havia várias medalhas penduradas na parede em cima da cama. A janela, que ficava ao lado do guarda roupa, dava vista para uma grande árvore que tinha ao lado da casa. Me lembrei de quando subimos lá quando crianças. Os lençois de Camila eram rosa claros, estampados com pequenas e delicadas flores, e em cima deles havia um caderno de capa vermelha, com uma fita marcando uma das páginas.

Abri onde a fita marcava, percebendo logo de cara que aquilo se tratava do diário de Camila.

" Lauren me beijou. Eu sei que disse que não deixaria aquela chata se aproximar de mim, mas eu devo admitir que ela tem um charme, e que charme... Talvez eu goste dela, ou pelo menos do beijo dela."

Não consegui conter a risada. Fechei o diário, o devolvendo para o mesmo lugar. Ler aquilo era o suficiente para saber que Camila gostava de mim. Com isso, um sorriso bobo se formou em mim.

Quando a noite caiu eu estava na sala, vendo um leilão que passava na televisão. Minha tia anunciou que o jantar estava pronto, então fui até a mesa, logo Camila desceu, ela havia tomado banho, o cheiro de sabonete fresco exalava dela, suas roupas haviam sido trocadas, agora ela estava com uma calça legging e uma regata branca.

- Então - Diana se sentou conosco na mesa, começando a se servir do macarrão que havia feito.- como foi o dia de vocês?

Camila ficou calada, observando seu prato vazio.

- Foi bom. - disse. - hoje o namorado da Camila veio aqui,

Finalmente ela me olhou, erguendo o seu olhar, surpresa e incrédula que eu havia dito aquilo como se fosse a coisa mais normal do mundo.

- Namorado? - Diana a olhou com um sorriso no rosto.

- Ele não é meu namorado. É meu amigo. - ela respondeu com raiva.

- Bom, ele ficou todo vermelhinho quando citei o seu nome hoje cedo. - continuei a provocando.

- Já disse que ele é só meu amigo.

- Então tá bom. - dei de ombros, começando a comer.

O jantar seguiu em silêncio. Camila me dava alguns olhares de raiva às vezes, e eu ria, a deixando mais brava ainda. Quando terminamos de comer, Diana foi para a sala, terminar de ver o leilão.

- Ah! Esqueci de falar! - ela gritou antes que pudéssemos deixar a cozinha e irmos cada uma para o seu canto. - chegou uma carta para você Camila, tá em cima da cômoda.

Ela foi até o pequeno móvel, ao lado do telefone, onde ficavam as chaves e correspondências. Após pegar a carta, subiu para o quarto, onde teria privacidade para lê-la.

- Quem que manda carta em pleno século 21? - perguntei para mim mesma, dando de ombros e seguindo para os meus aposentos.

Quando caminhei pelo corredor, ouvi o barulho de um suspiro longo e pesado vindo do quarto de Camila. Espiei, vendo que a porta estava aperta. Ela estava no chão, sentada, com a carta aberta em mãos, e seu rosto coberto por lágrimas.