DOZE

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As flores estavam se tornando uma previsibilidade divertida a cada vez que Enzo encontrava Odete.

Estavam sempre em algum lugar, no vestido, no cabelo ou nas sandálias, esperando serem encontradas e enquadradas como rosas, lírios ou o que mais o observador pudesse especificar.

O passatempo vinha se mostrando útil enquanto a diretora inspecionava o caderno de desenho. Enzo cruzou os braços e olhou os brincos, mas eles eram apenas pontinhos de rubi, parecendo no máximo balas de cereja. Nada de mais era visto no cabelo, e o vestido não dava pistas promissoras, a não ser em um momento em que a mulher pareceu satisfeita, abaixou o caderno e deixou ser possível ver o broche de girassol.

– Tenho que admitir – disse ela –, o menino sabe me surpreender.

– A interpretação dele de como deveria ser a escola é muito boa. – Enzo olhou para a diretora. – Mas não oferece nenhuma ideia de reforma, não é?

– Por que não? Não me diga que subestima os desenhos de seu filho.

– Um grafite no muro é uma coisa, mas construir paredes com base em desenhos de criança? – Ele olhou para o pátio, onde Vinícius deslizava sozinho pelo escorregador. Os colegas tinham ido embora e parecia ser bom aproveitar o playground todo disponível para ele nos minutos em que o pai demorava a mais na hora da saída para conversar com a diretora.

– Você é formado em engenharia civil. Devia reconhecer mais do que ninguém o talento do garoto para projetos arquitetônicos e pensar sério no caso. Deve ter muito mercado em Defrim agora.

– Brincar de arquiteto deve ser divertido, quando você não tem que trabalhar de verdade nessa idade.

– E como decorador? Ele tem experiência nessa área. – Odete pôs a sugestão no ar e sorriu antes que Enzo levasse demasiadamente a sério. – O que quero dizer é que entendo o que está acontecendo.

– Entende?

– Você ainda está se adequando ao papel de pai e tem medo que isso tome proporções com as quais não consiga lidar. – Ela estendeu o caderno de volta. – Você viu a alegria dos alunos com a pintura no pátio e a prestação de contas do leilão beneficente deixou claro que os quadros farão a diferença para muita gente. Veja o que o talento dele fez. Devia dar mais chances a esse dom e a você mesmo. Acredito que nada acontece por acaso e acho que devia fazer o mesmo.

Enzo fechou o caderno, entocou-o na mochila e, engasgado, disse qualquer coisa na despedida que nem lembrava direito. Torcia para que a atitude não tivesse sido rude, já que não tinha ficado necessariamente irritado ou ofendido, mas não conseguia parar de pensar no que ela tinha falado. Medo do talento de Vinícius? Era um viés inesperado por qual se pensar.

– Papai! – O filho o despertou dos devaneios. – Tem alguém batendo na porta. Posso atender?

Distraído no sofá e com a televisão em um canal qualquer, Enzo não tinha percebido o barulho.

– Pode deixar. – Ele se levantou e abriu a porta. Cristina estava do outro lado, o olhar oculto por trás de óculos escuros de lentes redondas e armação amarela.

– Boa tarde – falou ela com o acessório emoldurado pelo cabelo Chanel, um estilo praiano, apesar do tempo frio. – Espero que estejam prontos para um passeio.

– A diretora viu os desenhos que Vinícius fez durante o jantar – disse Enzo, sentado no banco do carona do carro. Vinícius estava no banco traseiro, perscrutando pela janela os lugares por onde passavam.

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