Rio de Janeiro, 2016.
CAROL POV
A música altíssima do despertador de Gabriela me acordou. Com as costas doloridas, percebi que não estava na minha cama habitual. Eu e Gabi dividimos apartamento desde a temporada passada, quando ela entrou para o Sesc Rio como ponteira. Já eu, estou a mais tempo aqui, e como central. Tirando o fato de que ela não consegue matar aranhas, dorme no meio dos filmes e é a pessoa mais atrasada que eu conheço, Gabi é a melhor companheira de apê da vida.
-Porra, Gabriela, você me deixa dormir no sofá e nem me acorda? Logo no primeiro treino da temporada me presenteando com uma noite de sono péssima?
-Eita, parece que a nossa capitã acordou estressadinha hoje!
Revirei os olhos. Já era minha terceira temporada no Sesc-Rio, e finalmente Bernardinho havia me concedido o título de capitã. É uma responsabilidade e tanto, mas já me sinto mais do que capaz de carregar esse peso. Fui a melhor bloqueadora de quase todos os campeonatos que disputamos na última temporada, e estou disposta a continuar com esse título, além de ajudar meu time a ser campeão da SuperLiga e, quem sabe, ganhar o MVP.
— Vem tomar café, Carolina. Não quero que você passe mal no treino e dê uma péssima impressão para as novatas.
— Novatas? — Perguntei, ainda com sono. É óbvio que teriam novatas. Mas ainda nem tinha tido tempo de pensar nisso, e a observação da Gabi me deixou curiosa.
— Lógico! Você sabe que seu papel como capitã é ao menos orientar elas, né? Principalmente aquela gringa misteriosa. — Contava a Gabi enquanto dava um gole em seu suco verde.
— Nem começa, gay. Eu nem inglês sei falar! — Resmunguei.
— Pois vai aprender! Quero ver quando o Bernardinho suspeitar que você não tá dando a devida ajuda para as novas. Vou te contar, hein, a fama da holandesa não é das melhores, você sabe, não adianta só ser uma das melhores da Europa, né? A arrogância é maior que...
— PUTA MERDA, O BERNARDINHO! — Cortei a Gabi num grito. Minha mente parou na segunda frase dita por ela. O Bernardinho jamais tolera atrasos, e o tempo passou tão rápido durante nossa conversa, que agora só faltavam 5 minutos para o treino.
Pedimos o Uber na velocidade da luz. E o pior é que quanto mais pressa temos, mais eles demoram. No mínimo 5 motoristas cancelaram, e tivemos que ligar para a Roberta. Por sorte, a mesma também perdeu o horário e passou no nosso prédio de carro para nos buscar.
— Roberta, você acaba de salvar 2 vidas. — Falei entrando no carro, ofegante de desespero.
— Agora está nas mãos de Deus, espero que o Bernardinho tenha acordado com o pé direito. — Roberta sorriu nervosa e nos fez dar risada também.
Eu sentei na janela, atrás da motorista. O carro na velocidade máxima e a linda paisagem do Rio passando rapidamente ao meu lado me deixaram com muito frio na barriga. Eu repetia pra mim: "Pelo amor de Deus, Carolina. Que tipo de pessoa que está há uma década no vôlei fica nervosa no primeiro dia de treino?" Mas a ansiedade não passava. Era uma mistura de medo, responsabilidades e cansaço. Sim, e a SuperLiga ainda nem havia começado.
Roberta estacionou e fomos correndo para dentro do ginásio. As meninas conseguiram chegar e foram no mesmo minuto se justificar para Bernardinho. No meu caso, corri tão rápido pelos corredores do Tijuca, que ao chegar na porta do vestiário feminino, aparentemente vazio, não consegui frear. Quando vi, meu sapato, as joelheiras e todos os objetos que poderiam estar na minha bolsa estavam espalhados pelo vestiário.
Estava olhando pro chão. Quando olhei para cima, uma loira muito alta, de olhos quase transparentes me encarava, me julgando de cima a baixo. Mesmo naquela cara de nojo, eram os olhos mais lindos que já tinha visto. É, o vestiário não estava vazio. Vi que ela tinha derrubado uma garrafa d'água perto das minhas coisas. Ela se abaixou para ajuntar, e eu, na esperança de que a mulher me ajudaria, tentei agradecer. No entanto, ela apenas pegou sua garrafa, arqueou as sobrancelhas, e depois de 5 segundos me encarando com cara de desgosto, levantou e deixou o vestiário, em direção a quadra.
"Ah, então essa é a gringa. Bom, ela não deve entender português, é claro. Por que fui agradecer em português?" Falei baixo para mim mesma, tentando ser otimista quanto à novata.
Já na quadra, fizemos uma roda e Bernardo começou a introduzir as jogadoras.
— Pessoal, nossa mais nova contratação é Anne, Anne Buijs. Ela ganhou o campeonato Europeu pela seleção holandesa na última temporada, além do prêmio de melhor jogadora e melhor ponteira. Ela ainda não fala português, então gostaria que alguém se prontificasse para lhe guiar, pelo menos nesse primeiro dia. — Ele disse, já dirigindo o
olhar para mim.— Vai fazer feio, Carol? Levanta a mão, vai, é seu papel. — Gabi cochichou rapidamente no meu ouvido.
Mesmo com plena noção de que não sei falar nem português direito, dei uma de corajosa e levantei a mão.
— Obrigada, Carol. Anne, essa é a nossa central e capitã, ela com certeza poderá te ajudar. — Falou Bernardinho para a Anne, em inglês, e deu um empurrãozinho até que ela ficasse do meu lado.
Anne apenas assentiu com a cabeça. Nem ao menos um sorrisinho de canto me deu.
— Uma mulher de poucas palavras, eu diria. Ainda bem que ela não entende português, né? — zombou Roberta para mim.
— Hoje cedo eu já avisei para Carolina sobre a ignorância dessa aí. E você sabe, duas mulheres de personalidade forte juntas não dão certo! — Gabi piscou para Roberta, rindo.
Jesus! Nessa hora acho que deveria ter prestado mais atenção no que Gabriela me contou hoje cedo. Por sorte, Bernardo me chamou para a sala dele durante o aquecimento. "Por sorte" pois para mim, a dor nas costas que estava sentindo naquele dia já era demais. Se tivesse que ficar por muito mais tempo ao lado da holandesa fingindo simpatia, teria dor de cabeça também.
— Ana Carolina, agora a senhorita já sabe de suas novas responsabilidades sendo capitã. Se te dei essa oportunidade, é porque confio em você, então não deixe ela escorrer por seus dedos. Agora você não é a única estrela do time, creio que já deve ter visto as habilidades da novata. — Bernardinho finalizou seu sermão assim enquanto me levava até a quadra para treinar com as meninas. Infelizmente, só haviam se passado 10 minutos, ainda tinha um bom tempo de treino com elas, e agora, com o dobro de pressão nas costas. Estava com medo.
Notas da autora: Minha primeira vez escrevendo uma fic, galera, aceito ideias e críticas hahaha me contem também se gostaram do andamento, para que eu possa continuar, e não me deixem no vácuo, é muito vergonhoso 🤪
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Court Lights | Buijrol
RomanceSinopse: Quando a promissora jogadora de vôlei Anne Buijs é transferida para o Sesc Rio, ela imediatamente desafia Carolana, a estrela da equipe, tanto em quadra quanto fora dela. A tensão entre as duas é palpável, e o que começa como uma rivalidad...