VEINTIUNO | DÍA UNO

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E V E L I N E

Estava acordada. Pelo que vi, mais ou menos há cinco horas. Ela estava ali, bem ao meu lado, dormindo serenamente na poltrona reclinada do jatinho. Caiu no sono assim, assistindo a paisagem até que não pudesse mais segurar os olhos abertos.

Por que a estava encarando?

Essa seria uma resposta que não conseguiria dar nem se me esforçasse para encontrar.

Passei as horas admirando seus detalhes, como um amante da arte assistia a Monalisa. A pele negra roliça. O nariz afilado. Os lábios carnudos e bem desenhados. Os cachos perfeitamente encaracolados. O jeito que respirava tranquilamente.

Era inegável. Eu estava me apaixonando. Admitir isso para mim mesma era mais difícil do que imaginava. Constatei o óbvio quando fui pêga sorrindo enquanto a olhava.

"A última vez que vi esse olhar para alguém, foi quando visitei meus falecidos pais, se olhavam exatamente assim." - disse a aeromoça. Soltei o ar, que não sabia que segurava, e juntei as sobrancelhas olhando para ela.

Eu não sabia o que responder. Não tive coragem de negar, muito menos de confessar. Ela me serviu a bebida que tinha pedido minutos atrás e se retirou sem falar mais nada. Mal sabia ela, que simplesmente, tinha posto uma bomba dentro da minha cabeça. Que não demorou muito para explodir.

A ficha caiu como um banho de água fria. Constatei que era um fato a não ser discutido quando não tive argumentos para negar nem a mim mesma. Eu não poderia negar. Jamais. Seria uma grande ofensa a ela, e a mim mesma. Como poderia renegar uma mulher como àquela? Não podia. Essa era a questão.

E ali estava ela. Alheia a toda minha confusão mental. Dormindo tranquilamente.

Será que ela sentia o mesmo?
Será que ela ainda acreditava no acordo?
Será que ela estava apenas jogando comigo?

Ora, se recomponha mulher!

Estava parecendo uma adolescente. Insegura e paranóica. Eu não era assim. Eveline Moralez era chefe de gangue, comandava assassinos, exportava drogas e fechava negócios com homens e mulheres poderosos. Ela não era essa garotinha apaixonada. Eu não tinha espaço para isso em minha vida.

Tudo isso tinha começado com um intuito. Conseguir uma aliança em troca de proteção. Era esse o único objetivo. Amor não era uma opção.

A vida na máfia é perigosa demais para esse tipo de coisa...

Mas como poderia negar? Se uma completa desconhecida conseguia desvendar-me como um livro aberto, como poderia esconder isso de todos e para mim mesma?

***

"Cecí" - chamei. - "Cecília, chegamos."

Ela abriu os olhos preguiçosamente e eu senti meu coração errar uma batida. Em seu rosto agora tinha um sorriso fofo e precisei me afastar para não cometer um erro.

"Eu dormi tanto assim?"

"Não fomos muito longe."

"Hum. Vai me contar para onde viemos agora?"

"Vamos e você verá." - ela sorriu mais uma vez e não consegui controlar a tentação em encara-la.

Amor Vermelho Sangue - Livro III | Trilogia Amor De BandidoOnde histórias criam vida. Descubra agora