capítulo um ~ Jonathan

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13/07/2023

Hoje é o jogo valendo a classificação para a semi final da Copa do Brasil e eu acordei sem esperanças. Sendo mais honesto, não confiava que eu teria um bom desempenho em campo, mas acredito no time e que eles podem superar esse desafio também. Temos a vantagem de um gol, conquistada no jogo de ida, então se conseguirmos segurar o resultado, já será o suficiente.

Olhei pro lado da minha cama e lembrei que acabei usando a Patrícia novamente. Não consigo definir se acho que ela pode um dia vir a ser uma amiga, ou se só é ok estar com ela porque nunca me confrontou em nada. A única certeza que tenho sobre ela, é que acabou se tornando uma opção fácil, em todos os sentidos possíveis.

Respirei fundo, peguei meu celular na mesa de cabeceira do lado em que estou na cama e vi que ainda estava bem cedo. Poderia muito bem tentar dormir mais, mas já estava sentindo a ansiedade do pré-jogo decisivo batendo. Levantei e fui dar uma volta pela casa, pra tentar espairecer a mente.

Não deu certo.

E pra piorar, começo a lembrar da péssima ideia que tive de aceitar o convite de um amigo, e dar uma entrevista para seu canal na internet. Foi péssimo porque acabei me esquecendo que aquilo não era apenas um bate papo entre amigos, e que logo estaria disponível online pra quem quisesse ver. Acabei abrindo que esse ano minha vida pessoal estava virada ao avesso, e que vivi dias difíceis ao lado da solidão. Foi só esse vídeo lançar para uma parte da torcida do São Paulo concluir que essa minha declaração era o motivo da fase sem gols. E sim, eles estão certos no ponto de que como atacante, meu principal objetivo é marcar gols, mas mesmo sem conseguir ajudar nisso, não faltou dedicação em nenhuma partida. Apesar das minhas questões pessoais, sempre me esforcei muito pra estar inteiramente focado em campo. Então alguns comentários que li dizendo coisas como: "ele deveria se afastar e se cuidar", me magoaram. Imagina se eles soubessem que não estou completamente recuperado da lesão que sofri no começo do ano e que estou jogando no sacrifício já tem alguns meses? Continuo com a cabeça fritando e pensando em muitas coisas juntas, até que escuto os passos do meu cachorro se aproximando e isso me alegra.

- Jokic hijo, buen día! - falo o abraçando, enquanto ele me dá várias lambidas.

Passo um bom tempo brincando com ele e felizmente meu coração já fica mais tranquilo. Vejo que ele cansou e decido dar sua comida, e em seguida preparar meu café da manhã.

Só quando já estava acabando de comer me lembrei que havia alguém dormindo na minha cama. No fundo me sinto até um pouco mal por considerá-la tão descartável assim. Talvez se eu não tivesse a conhecido pós o término de um relacionamento tão longo, as coisas poderiam ser diferentes. Mas ela e tantas outras mulheres que já saí são apenas corpos que eu uso. Até hoje nenhuma me despertou a vontade de querer algo além de sexo. É verdade que com ela ainda existe até uma interação maior, ou melhor, uma tentativa dela de interagir comigo, mas são assuntos que não me prendem. É como se ela tentasse conversar as mesmas coisas que conversa com a sua melhor amiga, que por muita ironia do destino, namora um grande amigo meu e companheiro de time. Às vezes observo conversas do Giuliano com sua namorada e tenho vontade de perguntar: "De verdade, como você consegue?", mas sei que pode soar ofensivo e guardo pra mim.

Finalizei meu café, organizei a pequena bagunça que fiz na cozinha e subi pro meu quarto.

Pensei se me arrumava primeiro ou se acordava a Patrícia pra dizer que precisava sair logo. Achei melhor a segunda opção, e assim o fiz.

- Hey, acorda aí, já são 07h30, preciso sair jajá! - digo em pé cutucando seu braço.

Ela acorda com cara de assustada e após processar por um minuto me responde:

- Nossa, sempre tão carinhoso. Bom dia pra você também. -  ela diz com um tom de voz meio que triste, se levanta para organizar suas coisas e complementa: - Posso pelo menos tomar um banho antes? - ela me pergunta enquanto vai resgatando partes da sua roupa e acessórios que estão pelo quarto.

- Falando assim até parece que eu sou um monstro, né? Claro que pode. Fica à vontade aí que eu vou tomar o meu banho em outro quarto, só não demora porque eu não posso me atrasar hoje. E o grande monstro aqui ainda vai ter que te deixar em casa. - respondo e já vou saindo do quarto levando tudo o que preciso para me arrumar.

Durante o banho penso nas palavras dela: "sempre tão carinhoso". Isso me pega porque realmente sempre fui muito carinhoso, não só no meu antigo relacionamento amoroso, mas com minha família e amigos também. Assumo e sei que desde que estou solteiro meu jeito mudou muito. Me tornei um homem frio. Sem perceber eu criei uma grande barreira com as pessoas ao meu redor e hoje provavelmente só confio cegamente no Jokic. Talvez ele não tenha sido o melhor presente que já ganhei na vida, mas certamente foi o que o que eu mais precisava.

Terminei meu banho e de me arrumar. Chamo a Patrícia e ela também já está pronta pra sair. Já estávamos no andar de baixo, próximos da porta, quando ela me pergunta:

- Você não vai comer nada antes de sair? - ela diz me olhando, após falhar na tentativa de fazer carinho no Jokic.

Já passou pela minha cabeça a loucura de que o fato dele não simpatizar muito com ela seja um sinal que ele está tentando me passar. Será mesmo uma loucura? Se for, ela não é a única, ele tem essa mesma reação de ignorar toda mulher que trago aqui.

- Já comi, acordei muito cedo. Eu realmente preciso sair agora, mas se quiser pega lá uma fruta pra ir comendo no carro. - falo enquanto me despeço do meu cachorro.

- Não sei por que eu ainda me surpreendo com esse seu jeito. Mas vai, vamos logo, em casa eu como. - ela diz novamente com uma tristeza na voz e eu abro a porta para irmos logo.

O trajeto até a casa dela é em completo silêncio no carro. Quando chegamos ela olha pra mim, me dá um beijo no rosto e diz: 

- Boa sorte hoje! Se der tudo certo pra vocês, depois me manda onde vai ser a comemoração, e na pior das hipóteses, se precisar de mim, posso te encontrar também. - ela fala com um sorriso meigo no rosto.

- Valeu! Se for ter algo sua amiga te avisa. - olho pra ela e respondo bem direto, percebo que isso não a agradou também.

Ela sai do carro, entra em seu prédio e eu continuo meu caminho para o CT de treinamento. Como era contrafluxo, seria coisa rápida, mas o suficiente pra eu pensar no porquê ela não gostou da minha última resposta. Ela não deve ter entendido, mas eu quis dizer no sentido de que eu não pegaria tanto e tão rápido no celular, pelo menos comparando com o Giuliano, que está lesionado e irá apenas nos acompanhar, então até mesmo por isso, muito mais rapidamente ele estaria falando com sua namorada e combinando onde iriamos encerrar a noite. Enfim, não posso me responsabilizar pelas interpretações alheias.

Chego no CT para a concentração e já mudo o foco totalmente para a decisão dessa noite. O time e a torcida não precisam do Jonathan e seus problemas, e sim do Calleri decisivo.

la mejor compañia ~ Jonathan Calleri Onde histórias criam vida. Descubra agora