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CHRISTOPHER LUÍS VON UCKERMANNOito anos atrás
O capuz e o cabelo evitam que eu enxergue os detalhes do seu rosto, principalmente com a baixa iluminação, mas mesmo assim, consigo notar o sorriso que se forma.
– Você foi muito mais receptivo mais cedo – comenta, ainda sem se mover, o deboche brincando em sua voz.
Há algo errado.
– O que aconteceu? – pergunto.
– Posso entrar?
O tempo que demoro para responder não tem a ver com não querer que ela entre, porque é óbvio que ela pode entrar.
Minha hesitação tem a ver com o motivo pelo qual ela quer entrar.
Mais cedo, quando ela foi embora, ficou claro que nem eu e nem ela planejávamos nos reencontrar. Então por que é que ela está aqui, parada na porta do meu apartamento, usando um capuz que cobre quase todo o seu rosto?
– Mais uma vez, isso parece uma péssima ideia – quebrando o silêncio, ela repete o mesmo que disse hoje mais cedo, e quando também repete o gesto de tentar se afastar, faço o meu papel e agarro seu punho, mantendo-a no lugar.
– Olha pra mim. – Ela não obedece, se mantendo de costas enquanto meus dedos quase se fecham ao redor do seu braço. – Maria.
Dulce se vira e a luz que vem da porta do meu apartamento, com a nova posição em que estamos, ilumina seu rosto de maneira que eu note a mancha arroxeada em seu queixo.
Sem lhe dar tempo para evitar, empurro seu capuz para trás, então eu congelo. Há um corte em seu lábio inferior, mas o que mais prende minha atenção, é o hematoma gigantesco que cobre seu maxilar.
Já desferi e ganhei socos o suficiente pra conhecer a marca que um punho fechado deixa no rosto de alguém. A mesma marca que estou vendo nesse segundo.
As cicatrizes que encontrei em seu corpo, quando a vi nua são antigas, então não imaginei que ela ainda passasse por esse tipo de coisa, afinal, Maria já tem dezoito anos. Mas, aparentemente, ela ainda não se livrou do problema com sua mãe.
– Entra – peço e, gentilmente, a puxo para dentro. – Quer me contar o que aconteceu?
– Não – responde e , fazendo uma careta, joga os ombros para trás, deslizando o moletom pelos seus braços. – Posso só usar seu banheiro?
Não lhe respondo e, mais uma vez, não tem a ver comigo querendo recusar, só sou incapaz de desviar os olhos da região onde sua camiseta branca está tomada pelo vermelho em seu ombro.
Dou um passo em sua direção, encurtando a distância entre nós.
Nossos olhos se conectam e ela ergue o nariz, como se soubesse o que pretendo fazer e me desafiasse a fazer algo. Em seu rosto há o claro aviso de siga em frente por conta e risco.
E eu sigo.
Com cuidado, ergo o tecido da camiseta, encontrando a marca de uma mordida.
Tem. A. Porra. De. Uma. Mordida. Em. Seu. Ombro.
Estudo o machucado por menos de dois segundos antes de olhar em seu rosto.
– Não foi sua mãe que te machucou – digo e , mesmo que não seja uma pergunta, ela me responde com um balançar de cabeça negando.
Cerro meu maxilar.
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Amnésia
RomansDizem que o amor é tranquilo e sereno, mas o que sinto por Maria é o oposto. Existem amores suaves, mas o nosso jamais foi assim. Conheci Dulce Maria há oito anos, e desde o início, tudo foi caos. O caos mais envolvente que já vivi, ao lado dessa m...