Dor

11 1 0
                                    

A noite foi longa. Meu corpo estava exausto, mas minha mente não parava de girar. Cada vez que eu fechava os olhos, era como se o olhar profundo de Suguru me encarasse, trazendo à tona o momento em que ele disse que o que sentia por mim não era ódio. E depois, o beijo. Meu coração batia acelerado só de pensar nisso. Como alguém que passou tanto tempo me desprezando poderia mudar tão rápido? Será que ele estava falando sério?

Quando o sol começou a nascer, eu desisti de tentar dormir. Estava cansada, meus olhos pesavam, mas não havia tempo para descansar. Tínhamos uma missão importante. Era algo que exigia concentração, foco absoluto. Mas eu? Eu estava perdida em pensamentos.

A missão começou tranquila, pelo menos para os padrões que estávamos acostumados. Suguru, Satoru, Shoko e eu estávamos juntos, mas a tensão entre mim e Suguru era palpável. Eu evitava olhá-lo, sentindo o peso do que aconteceu na noite anterior, mas era impossível afastar completamente a sensação de que algo estava diferente.

Enquanto nos movíamos pelo local da missão, minha mente não conseguia se concentrar. Eu cometia pequenos erros, distraída, mas ninguém parecia notar. Meus pensamentos ainda estavam voltados para Suguru, tentando decifrar o que significava tudo aquilo.

Então, aconteceu. Em um movimento rápido, Suguru foi atingido. Eu só me lembro de vê-lo sendo lançado para trás, seu corpo colidindo com o chão com força. Tudo ao meu redor parou. O som dos feitiços, das batalhas, sumiu, e tudo o que eu via era ele, caído no chão, com sangue escorrendo de um ferimento profundo no ombro.

— Suguru! — gritei, correndo em sua direção sem pensar.

Satoru e Shoko estavam ocupados lidando com o inimigo, mas eu só conseguia focar nele. Meu coração batia forte no peito enquanto me ajoelhava ao seu lado. O sangue manchava o chão, e ele respirava com dificuldade, segurando o ombro ferido. Seus olhos, porém, ainda estavam fixos em mim. Não havia raiva, nem dor, apenas um olhar que eu não conseguia interpretar.

— Você está bem? — perguntei, a voz saindo mais trêmula do que eu gostaria.

Ele tentou sorrir, mas o esforço fez com que uma careta de dor tomasse seu rosto.

— Já estive melhor... — disse ele, em um tom irônico, mas sua voz estava fraca.

— Fica quieto, eu vou te ajudar.

Com as mãos trêmulas, tentei aplicar o máximo de pressão no ferimento, mas o sangue continuava a escorrer pelos meus dedos. O pânico começou a tomar conta de mim, mas eu não podia mostrar isso. Precisava ser forte, precisava mantê-lo acordado.

— Você precisa parar de me distrair... — ele murmurou, seus olhos fechando por um momento antes de abrir de novo. — Isso é sua culpa, sabia?

— Minha culpa? — perguntei, surpresa, tentando esconder a preocupação. — Você é o idiota que ficou no caminho.

— É... — ele riu, mesmo com a dor evidente. — Mas você... você ainda tá na minha cabeça.

Eu queria gritar com ele, dizer que não era hora para brincadeiras, mas a verdade é que aquelas palavras me atingiram com força. Ele estava machucado, talvez gravemente, e mesmo assim, ainda conseguia fazer com que meu coração batesse mais rápido com apenas uma frase.

Satoru finalmente chegou, lançando um feitiço que afastou os últimos inimigos, e Shoko correu para tratar de Suguru. Mas eu permaneci ali, ao lado dele, sentindo o peso do que tinha acabado de acontecer.

Eu não sabia o que aquilo significava, mas uma coisa era certa: as coisas entre nós nunca mais seriam as mesmas.

Eu me agachei ao lado de Suguru, e, pela primeira vez em muito tempo, senti meus olhos se encherem de lágrimas. Não era apenas o medo do que poderia acontecer com ele; era algo mais profundo, algo que eu não conseguia explicar. Tudo estava confuso — quando as coisas mudaram? Por que me importava tanto agora?

Suguru, deitado ali, sangrando, deveria estar em pânico, mas seus olhos... seus olhos estavam diferentes. Eles estavam cheios de vulnerabilidade, algo que eu nunca tinha visto nele antes. Não era o olhar orgulhoso ou o desprezo que costumava lançar na minha direção. Era como se ele estivesse, de algum jeito, pedindo para eu não deixá-lo ali, para eu continuar ao seu lado.

Mas, ao mesmo tempo, ele sorria. Aquele sorriso suave e encantador que, por mais que tentasse, eu não conseguia ignorar.

— Você tá chorando? — ele perguntou, ainda com aquele sorriso no rosto, a voz fraca, mas provocadora.

Eu tentei secar as lágrimas rapidamente, negando com a cabeça, mas era inútil. As lágrimas continuavam a descer, uma após a outra.

— Não, claro que não — murmurei, tentando manter a compostura. — Só... só tô preocupada com o quanto você é idiota por se machucar assim.

Ele riu, ou tentou, mas o som saiu entrecortado, e uma careta de dor tomou conta do seu rosto por um momento. Eu segurei sua mão, e ele apertou de volta, o que me deixou ainda mais angustiada.

— Não precisa se preocupar tanto... já passei por pior, sabe? — Ele ainda sorria, tentando aliviar a tensão.

— Não é engraçado, Suguru — disse, tentando manter minha voz firme, mas falhando miseravelmente. — Eu... você podia ter morrido.

Suas sobrancelhas se levantaram em surpresa, e por um segundo ele ficou em silêncio, apenas me observando. O sorriso em seus lábios diminuiu, e ele suspirou.

— Não vou a lugar nenhum... Não agora — ele sussurrou, seus olhos escurecendo um pouco, talvez pela dor ou talvez por algo mais.

Aquela promessa, dita de maneira tão simples, me fez sentir algo inexplicável. Vê-lo naquele estado — vulnerável, mas ainda tentando manter sua fachada tranquila — foi demais para mim.

Eu não sabia o que fazer, não sabia o que dizer. Só conseguia olhar para ele e torcer, silenciosamente, para que não o perdesse.

E, naquele momento, percebi que, por mais que eu tentasse negar, por mais que nossos encontros anteriores tivessem sido marcados por brigas e provocações, algo dentro de mim havia mudado. Eu me importava. Muito mais do que estava disposta a admitir.

Satoru apareceu correndo, claramente irritado com toda a situação. Ele não disse nada a princípio, apenas olhou para Suguru com uma mistura de preocupação e frustração. Eu sabia que ele estava preocupado, mas, como sempre, ele expressava isso do jeito mais estranho possível.

— Porra, Suguru! — Satoru resmungou, colocando Suguru cuidadosamente em suas costas, apesar do peso das palavras. — Você realmente precisa aprender a não se machucar tanto. Eu juro que, um dia, vou ter que te carregar até o fim da vida.

Suguru, ainda com o rosto pálido, soltou uma risada fraca, o som mal passando pelos lábios.

— É... você pode reclamar o quanto quiser, mas ainda assim me carrega, não é? — Ele respondeu, a voz fraca, mas com aquela típica provocação.

Satoru revirou os olhos, claramente irritado, mas com uma ponta de alívio ao ver que Suguru ainda conseguia falar besteira.

— Cala a boca antes que eu te jogue no chão — ele rebateu, apertando um pouco mais os braços ao redor das pernas de Suguru para garantir que ele estivesse firme.

Eu não consegui segurar um riso nervoso diante da cena. O alívio por ver que Suguru ainda estava consciente misturado com a preocupação me fazia sentir uma confusão de emoções.

— S/N, vem logo — Satoru me chamou, dando um olhar rápido antes de começar a andar. — Vamos dar um jeito nesse idiota antes que ele decida desmaiar só pra me irritar.

Balancei a cabeça e fui atrás dele, tentando afastar o aperto no peito. Suguru podia ser um idiota às vezes, mas naquele momento, ele era o idiota que eu não queria perder.

Entre Olhares e Mistérios - Suguru GetoOnde histórias criam vida. Descubra agora