Capítulo 15 - Aquarela da Vida

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A vida não é brincadeira, amigo

A vida é arte do encontro embora haja tanto desencontro pela vida

Há sempre uma mulher à sua espera

Com os olhos cheios de carinho

E as mãos cheias de perdão

Ponha um pouco de amor na sua vida

Como no seu samba

Samba Da Benção - Vinicius de Moraes

Miguel estava imerso em seu próprio mundo, concentrado nas pinceladas que davam vida a formas que só ele compreendia. Eu observava cada movimento dele, tentando encontrar consolo na simplicidade da cena à minha frente, mas minha mente estava distante, presa em pensamentos que eu não conseguia controlar. O beijo que dei em Nascimento ainda queimava em meus lábios, como se o toque dele estivesse impregnado em mim, e isso me consumia por dentro.

A tinta vermelha escorria pela minha tela, formando manchas que refletiam o caos dentro de mim. Eu deveria estar focada em qualquer coisa que não fosse ele, em qualquer coisa que não fosse aquele momento proibido que teimava em voltar à minha memória. Tentei me perder na atividade, mergulhar na pintura como uma forma de esquecer, mas a culpa sempre me encontrava.

Foi quando o telefone tocou, me arrancando de meus devaneios. Meu coração acelerou, e meus dedos trêmulos mancharam o aparelho com tinta ao ver o nome que piscava na tela: Mãe

Suspirei antes de atender, já sabendo o que viria a seguir. Dona Helena nunca ligava só por ligar; seus convites para "passar o dia" na casa dela sempre vinham com um peso que eu preferia evitar.

— Alô? — tentei soar despreocupada, mas sabia que ela captaria a tensão na minha voz.

— Manuela, querida. Como você está? E o Miguel? — a voz dela era suave, mas sempre havia algo a mais, algo que eu não conseguia ignorar.

— Estamos bem, mãe. Estamos pintando.

Olhei para Miguel, que retribuiu meu sorriso com um olhar curioso. Ele sempre prestava atenção em mim, mais do que eu gostaria que prestasse.

— Que bom, meu amor. Estava pensando... por que você não vem passar o dia aqui comigo? Traga o Miguel, ele sempre se diverte no jardim, e eu sinto tanta falta de vocês.

Eu sabia o que estava por trás desse convite. Minha mãe nunca aprovou meu relacionamento com Eduardo, e sempre que tinha a chance, ela fazia questão de me lembrar disso, de uma maneira ou de outra. A questão financeira era uma parte, mas eu sabia que não era só isso. Ela nunca gostou dele, e com o tempo, comecei a entender o porquê, mesmo que fosse difícil admitir.

— Mãe, eu... — hesitei, querendo recusar, mas me sentindo presa. — Tudo bem, vamos sim.

Desliguei o telefone com um suspiro, sentindo o peso da decisão que havia tomado. Não queria ouvir mais críticas sobre Eduardo, não hoje, não com tudo que já estava acontecendo na minha cabeça, mas sabia que ir até lá era inevitável, e talvez, de alguma forma, necessário.

Mais tarde, quando estacionamos em frente à casa da minha mãe, senti um frio na barriga que eu não sabia explicar. A mansão brilhava sob o sol, imponente como sempre, com seu jardim perfeitamente cuidado e as paredes brancas que pareciam intocáveis. Miguel, como sempre, saiu correndo em direção à avó, que o aguardava com um sorriso largo.

— Meu querido! Como você está? — a voz da minha mãe era cheia de ternura ao abraçar Miguel, mas quando seus olhos encontraram os meus, vi aquela mesma preocupação disfarçada que ela tentava esconder.

Paixão nas Sombras | Capitão NascimentoOnde histórias criam vida. Descubra agora