Capítulo 16 - A entrega

183 12 32
                                    

Que jogo cruel de se jogar

What a wicked game to play

Fazer eu me sentir assim

To make me feel this way

Que coisa cruel de se fazer

What a wicked thing to do

Me deixar sonhar com você

To let me dream of you

Wicked Game - Chris Isaak

Dentro do carro, o silêncio entre nós estava carregado de tensão. Eu sentia a presença dele ao meu lado como se fosse uma corrente elétrica que percorria o ar. Cada movimento parecia mais pesado, mais consciente. Meus pensamentos estavam em desordem, e o tempo parecia se arrastar enquanto a cidade passava borrada pela janela.

De repente, Roberto quebrou o silêncio com uma casualidade que me pegou desprevenida.

— Tá com fome? — ele perguntou, sem tirar os olhos da estrada, sua voz grave ressoando no espaço fechado do carro.

Eu o olhei de relance, surpresa pela sua pergunta. Minhas mãos estavam nervosamente entrelaçadas no colo, e aquele convite repentino fez meu estômago dar um nó.

— Podemos comer algo lá em casa, se quiser. — ele acrescentou, mantendo o tom despretensioso, mas o subtexto era inegável.

Meu coração acelerou. Eu sabia que aquilo era errado, sabia que aceitar era cruzar uma linha da qual não haveria volta, mas naquele momento, não queria pensar nas consequências. Eu tinha passado um dia incrível, longe das tensões que normalmente me cercavam. Talvez fosse o desejo de prolongar aquele sentimento de liberdade que me fez responder sem hesitar.

— Pode ser. — minha voz saiu mais baixa do que eu esperava, quase um sussurro.

Ele não respondeu, mas percebi um leve levantar de sobrancelhas, um sinal de que ele havia captado minha aceitação. Seguimos em silêncio até chegarmos ao prédio dele. Assim que saí do carro, senti um frio na barriga. Cada passo que eu dava em direção ao apartamento de Nascimento parecia mais pesado, como se algo maior estivesse à espreita, aguardando.

Quando entramos no apartamento, fui imediatamente surpreendida. O lugar era muito diferente do que eu imaginava. Simples, mas incrivelmente organizado, o que me pegou desprevenida. Eu esperava algo mais desleixado, talvez até um reflexo da intensidade dele. No entanto, tudo estava impecavelmente em ordem, até o ar ali dentro parecia controlado.

Eu me movia pelo espaço, sem saber onde me colocar, sentindo-me subitamente intimidada pela presença dele, agora tão próxima e em seu território. Era como se eu estivesse invadindo algo profundamente pessoal.

— Não repara na bagunça — ele disse casualmente, mas era óbvio que não havia bagunça alguma.

Sorri de leve, tentando quebrar a tensão, enquanto ele se dirigia à cozinha. Ele começou a tirar algumas coisas da geladeira, e por um momento, eu me permiti observá-lo. Era fascinante ver aquele homem tão controlado em uma situação tão doméstica, o contraste era quase desconcertante.

— Eu só sei fazer sanduíche — ele disse, sem olhar para mim, suas mãos habilidosas já ocupadas em montar algo simples, mas que de alguma forma parecia perfeito naquele instante. — Mas é bom, prometo.

Dei uma risada baixa, sentindo mais à vontade com a simplicidade do gesto. Ele se movia com uma segurança que eu sempre associava a alguém que tinha controle sobre tudo, até mesmo sobre os detalhes mais triviais da vida.

Paixão nas Sombras | Capitão NascimentoOnde histórias criam vida. Descubra agora