Capítulo 21 - Máscaras

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Um mês. Trinta dias inteiros se passaram desde aquela noite com Roberto. Era assim que eu tentava pensar, contando os dias, como se marcar o tempo pudesse me ajudar a enterrar o que aconteceu. Porém, não importava o quanto eu me esforçasse, a memória dele ainda estava ali, me assombrando. Eu tinha decidido seguir em frente. Concentrei todas as minhas energias em Miguel, no ateliê, tentando afastar a culpa e o desejo que pareciam grudar em mim. "Foi um momento de fraqueza", eu repetia para mim mesma. Mais um erro em uma lista que eu tentava não olhar de perto.

Eduardo, por outro lado, estava cada vez mais envolvido com o trabalho. Todos os dias ele saía mais cedo, voltava mais tarde, o que de alguma forma me dava um certo alívio, mas ultimamente me deixava nervosa. Eu tinha um mal pressentimento que me acompanhava, como uma sombra. Sempre tive esse pressentimento em relação ao trabalho dele, mas ultimamente... era como se algo estivesse prestes a acontecer e eu odiava não saber o quê.

Ele me pediu desculpas pelo último "deslize". O pedido de desculpas sempre vinha, seguido da fase de atenção e carinho exagerado. Dessa vez não foi diferente e, como sempre, eu o "perdoei". Eu o fiz por Miguel, por mim, por aquela imagem que me obriguei a manter, mas não era mais a mesma coisa. Algo dentro de mim tinha mudado. O Eduardo que me dava esperança em outros tempos, agora me deixava indiferente. Seu toque, suas palavras... nada disso tinha mais o mesmo efeito. E o pior de tudo? Quando eu fechava os olhos à noite, era Roberto, não Eduardo, que surgia nos meus pensamentos. Sempre Roberto.

Às vezes, eu tinha a impressão de ver o carro dele passando em frente à casa. Me pegava olhando pela janela, tentando encontrar algum sinal, mas sempre me repreendia logo em seguida. "Isso é loucura, Manuela. Não pode ser real." Mesmo assim, a sensação persistia, como uma marca invisível.

Depois da última briga, Eduardo pareceu ter engolido minhas desculpas de que, no dia em que Miguel passou mal, eu havia saído apenas para distrair a cabeça. Disse que fiquei com vergonha de contar que o tinha deixado na casa da minha mãe. E ele, por alguma razão, acreditou. Talvez porque, assim como eu, ele também estivesse tentando ignorar os problemas que se empilhavam entre nós, mas aquilo só me deixou ainda mais inquieta. Eu sabia que essa paz momentânea era ilusória.

Nos últimos dias, tudo parecia calmo demais. Eduardo estava até mais presente em casa, mais animado, falando sem parar sobre a viagem que faríamos para Ilha Grande. "Vamos passar o feriado na casa de praia do Coronel Ricardo", ele dizia. Era uma tradição levar as famílias dos iniciantes para essa festa, algo que eu sei que ele adorava exibir. Fazia questão de me levar como se eu fosse um troféu. Antes, eu gostava disso. Gostava de me sentir desejada, admirada, mesmo sabendo que não passava de uma farsa, mas agora... agora eu só queria parar de fingir. Não aguentava mais as máscaras, as falsas esperanças, o teatro que se tornou nossa vida.

Estávamos no carro, a caminho de Ilha Grande e eu não conseguia afastar esses pensamentos. Eduardo estava ao meu lado, tagarelando, cheio de empolgação. Ele falava sobre o feriado, sobre os planos para a casa do Coronel, sobre como seria bom para Miguel se divertir. Eu respondia mecanicamente, um sorriso frágil no rosto, fingindo entusiasmo. E por dentro, minha mente girava em círculos, remoendo a mesma coisa.

"Por que você ainda pensa nele?" Eu me perguntava repetidamente. Tentei me concentrar nas árvores que passavam pela janela, nas curvas da estrada, mas a voz de Eduardo continuava, implacável, enquanto ele me contava os detalhes da viagem. E tudo o que eu sentia era um cansaço profundo.

Eduardo não percebia. Ele nunca percebia. Só via aquilo que queria ver. E, por algum motivo, isso me deixava ainda mais incomodada. Como ele podia estar tão alheio a tudo? Como eu podia estar ali, ao lado dele, e me sentir tão distante?

Eu respirei fundo, tentando sufocar a sensação de sufoco que crescia em mim. Mais algumas horas e estaríamos na ilha, rodeados por outros soldados e suas famílias, e eu teria que colocar o sorriso de sempre.

Paixão nas Sombras | Capitão NascimentoOnde histórias criam vida. Descubra agora