Capítulo 16

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Fazia duas semanas que Maya e Carina não se viam.

Essas duas semanas tinham sido longas e complicadas para as duas mulheres. A rotina de trabalho das duas havia se tornado uma barreira quase intransponível. Os dias livres não coincidiam, suas agendas pareciam estar em descompasso, e a cada dia que passava, sentiam mais e mais o peso da distância entre elas.

Era como se algo dentro delas estivesse fora de lugar, e o humor de ambas já não era o mesmo. A ausência física se transformara em uma lacuna emocional, criando uma tensão sutil que se espalhava para tudo ao redor.

Para Maya, o estresse estava se acumulando de forma notável no trabalho. Ela era, geralmente, a pessoa que mantinha tudo sob controle, que conseguia segurar as pontas, manter-se organizada e eficiente, mas isso começava a desmoronar.

Ela estava mais quieta, menos receptiva às piadas que circulavam pela estação. Vic, que era normalmente a mais engraçada e animada do grupo, tentava envolvê-la em uma conversa descontraída, como sempre fazia, mas Maya não reagia com os sorrisos e risos costumeiros. O rosto dela mantinha uma rigidez que ninguém na estação costumava ver.

A equipe notou a diferença. Todos percebiam, mas quando alguém tentava perguntar se estava tudo bem, Maya apenas murmurava respostas vagas, sem querer prolongar o assunto.

“Não é nada", dizia, mas seus olhos cansados e a maneira com que evitava contato visual contavam uma história diferente. Ela estava imersa em seus próprios pensamentos, preocupações e saudades, mas não queria falar sobre isso.

Carina, por sua vez, enfrentava uma versão semelhante de exaustão e frustração. O hospital, normalmente um espaço onde ela encontrava sua vocação e onde se sentia no controle, parecia ter se tornado uma arena de constantes tensões.

Ela estava lidando com internos inexperientes, e o comportamento deles, que antes ela tolerava com paciência, agora a irritava profundamente. Em algumas ocasiões, Carina levantou a voz mais alto do que pretendia, repreendendo os erros dos internos com uma severidade que não era habitual. Ela não tinha paciência nem para os familiares dos pacientes. Respostas ríspidas e olhares cansados substituíam o sorriso empático que costumava oferecer.

Amelia, sempre observadora, percebeu a mudança rapidamente. Tentou suavizar o clima com uma de suas piadas usuais, mas a expressão de Carina era severa, quase impassível. Amelia entendeu a mensagem e se afastou, deixando Carina sozinha para lidar com seu mau humor crescente.

Elas faziam chamada de vídeo quando conseguiam, mas não era o suficiente. As conversas virtuais serviam para acalmar momentaneamente a saudade, mas não substituíam o toque, o conforto de estarem juntas no mesmo espaço. A conexão entre elas era forte, mas a tela de um celular não transmitia o calor do abraço de Carina ou o som real da risada de Maya. Eram pequenos fragmentos de um relacionamento que, embora sólido, sentia o impacto da distância física.

Sem conseguir ver Carina, Maya tentava preencher o vazio com algo que, para sua surpresa, havia começado a trazer uma inesperada paz: passar mais tempo com sua mãe.

Desde o almoço do domingo, elas vinham se aproximando de uma maneira nova, como mãe e filha, e não como duas pessoas presas em um ciclo de trauma e expectativas. Cozinhavam juntas, algo que Maya não se lembrava de ter feito com ela enquanto crescia. Eram momentos simples, mas significativos — cortando vegetais lado a lado na cozinha, compartilhando receitas e pequenos comentários sobre a vida. Também saíram para o parque algumas vezes, aproveitando o clima, e até fizeram algumas compras juntas.

Katherine sorria mais. A terapia estava fazendo diferença, e Maya não se lembrava de ter visto sua mãe tão leve, tão genuinamente feliz. Ver essa mudança na mãe lhe dava uma sensação estranha de conforto, mas também um pouco de desconforto. Havia algo profundamente bonito em testemunhar a recuperação de Katherine, mas ao mesmo tempo, Maya sentia uma ponta de tristeza ao perceber quanto tempo tinham perdido com mágoas do passado.

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