Marcão narrando
Eu estava na boca com o Taubinha, enquanto trabalhava para mandar o fluxo do morro. O Taubinha estava com a cara no telefone, falando com um dos nossos informantes.
E o Zepi estava fora do morro, tentando fazer com que uma das lojas perto da escola cedesse as imagens mais próximas ao portão da escola.
Enquanto isso, o Foguinho ficou na casa da Dona Ana, ajudando a cuidar da índia, que de hora em hora está tendo crises, o que me deixou assustado, porque nunca vi uma pessoa tendo uma crise na minha frente.
No momento, eu só queria abraçá-la.
É uma parada de louco que até há uns dias atrás eu só queria me enfiar dentro dela e hoje eu tô aqui ajudando a encontrar o filho dela.
Ela é uma pessoa maneira, que passou por uma barra das grandes, enfrentou muitas e não merece passar por todo esse sofrimento.
Perdido em meus pensamentos, nem vi quando o Zepi entrou na minha sala com uma cara de quem estava se casando.
Zepi: Com muito custo, eu consegui mais duas filmagens que mostram uma mulher de estatura mediana, de uns cinquenta anos, de pele morena, saindo quase arrastando o menino até um carro sem placa – ele falou, se jogando na cadeira à minha frente.
Taubinha: Um dos nossos informantes falou que viu um menino parecido com o Henri e uma mulher parecida com a que o Zepi descreveu, indo para uma estrada – falou, olhando para o telefone.
Taubinha: Mas ele não sabe se é o menino mesmo ou se é só coincidência – falou, por fim.
Marcão: Então, levanta o rabo da cadeira e vai chamar o Foquinho para ir atrás desse moleque logo, que o morro não pode ficar parado –
Saímos somente Taubinha e eu, já que o Zepi tinha acabado de chegar e ia ficar responsável pelo morro na minha ausência.
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Mayara
Os dias estão se arrastando e minha ansiedade está cada vez mais difícil de controlar. Todos estão se esforçando para encontrar o meu filho.
Aqui na casa da dona Ana, onde todos nós estamos, até os meninos.
O foguinho quase não sai do meu lado depois da última crise de pânico que me fez desmaiar por quase uma hora.
Minha mãe vive à base de chá de camomila e suco de maracujá.
Eu sinto que estou enlouquecendo. A cada minuto que passa, meu coração bate mais forte, e minha mente começa a criar cenários terríveis. Onde está meu filho? Está seguro? Será que eu vou rever ele?
Minha mãe tentava me confortar com suas palavras suaves, mas ela também estava igual a mim; ela aceitava a ajuda da dona Ana. O silêncio na casa é pesado, apenas interrompido pelo som da TV.
Estava perdida em meus pensamentos, tentando firmemente não me entregar mais uma vez ao pânico de não ter o meu filho em meus braços, que nem percebi quando o Marcão e a Taubinha entraram na sala, com expressões sérias e preocupadas.
Marcão: Mayara, temos uma nova pista – ele falou, olhando para o Foguinho, que estava do meu lado.
May: Vocês encontraram o meu filho?
Taubinha: Ainda não, mas um dos nossos informantes disse que viu alguém com uma criança parecida com o Henri em um bairro distante – ele falou, ainda com a cara no celular.
Eu quero tanto ir com eles, eu quero ir atrás do meu filho, mas acho que na situação em que estou, é bem capaz de atrapalhar mais do que ajudar.
É com esse pensamento que meu corpo começa a tremer sozinho, minha cabeça começou a girar e meus olhos se encheram de água.
Foguinho: vai ficar tudo bem, nós vai encontra ele, e eu vou cumprir a promessa de levar ele para dar uma volta de moto pelo Morrão – ele falou e me abraçou, um abraço apertado.
Ele me deu um beijo no topo da minha cabeça e saiu junto com os outros.
Não aguento mais ficar quieta; eu sei que foram eles. Eu sinto dentro de mim que foi a Flaviana e aquele monstro que pegaram o meu filho.
Eu tenho que fazer alguma coisa. Eu dou a minha vida se isso for preciso para o meu filho voltar para casa.
Por um momento, fechei os meus olhos, e flashes vieram com força à minha memória.
Lembranças dele passando a mão pelo meu corpo, dos meus pulsos presos, da dor nas minhas partes íntimas.
O sorriso sórdido que ele dava quando via o meu desespero, os olhos brilhantes me vendo debater debaixo dele.
A dor da minha alma era gritante, a dor física e mental.
Com essas lembranças, os tremores do meu corpo voltaram com força total, me fazendo chorar como uma criança de cinco anos que não ganhou o seu doce favorito.
E com o peso dessa lembrança eu apaguei
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Taubinha
Porra, nesses anos todos que eu tô no tráfico, já presenciei várias coisas. Já fiz coisas imperdíveis, algumas das quais me arrependo e outras nem tanto.
Já fiz várias mães, pais e famílias chorarem, mas ver a índia nesse estado tá me corroendo. Ver todo esse sofrimento dela e da mãe dela é de partir o coração. Eu nunca tinha sentido nada disso antes e nem sei descrever o que estou sentindo.
Ver o foquinho se esforçando para manter as duas, sem ao menos conhecer elas direito, é um bagulho foda.
Agora, tá eu e o Marcão no carro, indo atrás de pistas, quase do outro lado da cidade.
Esse também é um cara que, mesmo com seu jeito durão e tendo desconfiado da índia na primeira vez que a viu, hoje está aqui procurando o filho dela como se fosse alguém da família.
Foram mais ou menos uma hora e meia de carro até chegar em Santíssimo, e mais meia hora até achar uma estrada de terra, quase um deserto, tirando duas fazendas, uma de frente para a outra.
Mas algo não estava certo ou não estava fazendo sentido; se a pessoa quisesse dinheiro, já teria entrado em contato.
Taubinha: Porra, mano, tem alguma coisa estranha,– falei, olhando pela janela do carro.
Marcão: Também tô achando, irmão. Tô achando melhor nós ir embora e manda uns caras vir pra cá pra uma olhada melhor,– ele falou, olhando pro seu lado do carro.
Aí, em vez de dar a volta, não, ele seguiu reto e bem devagar, prestando atenção no caminho, assim como eu.
Um lugar bem mais distante tinha um armazém aparentemente abandonado; chega a estar caindo aos pedaços, então esse foi o primeiro lugar a ser desclassificado da lista.
O foguinho tava vindo atrás de nós, mas ele seguiu outro caminho em busca de alguma pista.
Nós tá tipo detetives particulares, kkk