Capítulo 09

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BIANCA MONTANARI

-Querida, nós temos negócios a resolver. Não demoramos muito, tudo bem? - Lorenzo fala com sua esposa após sair do escritório sendo seguido pelos demais homens da casa. Não pude deixar de sentir uma pontada de inveja pela maneira que ele olha para a esposa.

Saber que nunca terei isso gera um aperto forte no peito. Eu não menti quando dei a Luca uma amostra do futuro, dificilmente a Famiglia permitiria que eu me casasse, meu cérebro é considerado valioso demais para ser desperdiçado com casamento e filhos - por mais que eu deseje muito, minha vontade não é importante. Não posso deixar de destacar como minha pequena confissão foi surpreendente, mesmo que eu enfrente problemas constantes de "língua salta", esse tipo de temor sobre meu próprio futuro nunca tinha além da minha mente, eu nunca havia externo para alguém, muito menos para mim mesma e agora Luca Santinelle sabia das minhas inseguranças.

-Tudo bem. - Lana lhe dá um sorriso amplo e apaixonado - Nos vemos em breve.

Raphael também se despediu de Emma, enquanto os irmãos Luca e Pietro apenas acenaram com a cabeça antes de todos partirem. Não pude deixar de notar um certo clima de tensão entre os homens e mesmo com pouco tempo de convivência as belas piscinas azuis que Luca chama de olhos me disseram que ele está preocupado e pensativo, como se precisasse elaborar um plano rápido e funcional.

-Como conseguem? - A pergunta escapou de meus lábios no instante que a porta de entrada foi fechada e me viro para encarar as duas mulheres na sala - Como conseguem manter um casamento sabendo do risco que seus maridos correm e de todo o sacrifício que seus filhos precisarão fazer em prol da Famiglia?

-Você ama seus pais, Bianca? - Lana, a primeira dama da Famiglia e possivelmente a mulher mais poderosa do planeta, me questiona.

-Com tudo de mim.

-Como pode saber que sua família está segura?

-Porque sei que meu pai jamais permitiria que algo de ruim acontecesse conosco. Ele queimaria no fogo por aqueles que ama.

-Nós fazemos a mesma coisa. - Emma diz com um sorriso acolhedor no rosto - Nós ajudamos nossos maridos a cuidar da Famiglia e somos seu suporte nos momentos mais difíceis. Somos nascidos e jurados no sangue, vivemos e morremos pela causa e tudo o que eles fazem é visando nosso melhor. Eles querem a Famiglia mais forte, poderosa e influente.

-Costumamos ter essa ideia de que os homens são fortes e imbatíveis. - Lana fala - Que Homens Feitos serão nossos protetores e que nada os abala, mas a verdade é que até o mais forte deles precisa de apoio. O sentimentalismo não é exclusivo para mulheres, homens também sentem mesmo que se esforcem o triplo para não demonstrar. Às vezes eles precisam ser a pessoa abraçada na conchinha.

-Nunca parei para pensar dessa forma. - Confesso. Lana segura uma de minhas mãos e dpa um leve aperto para demonstrar sua compreensão.

-Posso dizer por mim, sei quanta responsabilidade está sob os ombros de Lorenzo e como ele precisa lidar com grande pressão e estresse. Se quiserem atacar a Famiglia os primeiros alvos são Lorenzo e nosso filho, o Chefe e seu herdeiro. Há dias que ele chega em casa tão exausto que precisa apenas deitar a cabeça no meu ombro.

-Raphael costuma me abraçar. - Emma se serve de mais um pouco de café e se recosta no sofá encarnado o líquido escuro em sua xícara de modo nostálgico - Quando ele se sente sobrecarregado simplesmente me abraça, nenhum de nós fala nada e eu não o encho de perguntas, eu entendo que essa é a maneira que ele encontrou para sentir que tem apoio, amparo e sabe que sempre estarei ao seu lado.

-Como aprenderam a lidar com a vida conjugal?

-Ninguém nasce sabendo. Um dia você acorda sozinha, preocupada com os planos para si mesma e no outro você está dividindo sua cama, sua privacidade e sua intimidade com alguém. - Emma desvia os olhos do café e os foca em mim, por um segundo perdi minha respiração com a carga de emoções em seu olhar - Não vou lhe dizer que é fácil, nunca é, mas uma boa convivência não acontece magicamente. É necessário um esforço mútuo para fazer acontecer.

-A vida é cheia de surpresas. - Lana sorri novamente - Acredite, sei disso melhor que ninguém, mas você deveria seguir sua intuição. Eu vi a maneira como você e Luca se olharam e vejo um grande potencial aí. Nossos receios e inseguranças podem atrapalhar um futuro brilhante, digo isso como uma pessoa que quase se perdeu dessa maneira. Na noite em que me casei eu estava magoada, amargurada e poderia ter colocado tudo a perder.

-Eu estou a frente de grandes projetos para a Famiglia, mesmo que pudesse acontecer algo entre Luca e eu, o Conselho nunca permitiria. Seria visto como uma distração sobre o meu trabalho.

-Você é um ser humano, não uma arma. - Emma contrapõe - Se mesmo uma arma viva como Melissa Santinelle pôde se casar, não vejo motivo para te impedirem. Viver nos Estados Unidos não significa abandonar suas funções, nossa família não faz restrições e você teria liberdade para conciliar seu trabalho e sua própria família.

Não era certo, mas meu peito idiota e inocente se encheu de esperanças ao ouvir sua fala. Talvez o sonho de ter minha própria família não fosse tão impossível assim, eu poderia argumentar com o Conselho e pedir ajuda de Lorenzo para interceder ao meu favor. Ter um marido e filhos não atrapalharia o funcionamento do meu cérebro e meu cônjuge, sendo parte da Famiglia também, estaria ocupado em suas funções me dando tempo necessário para os programas em desenvolvimento que estou trabalhando.

-Além disso. - Lana continua - Se Dona Mellanie ou a senhora Melissa, mesmo a jovem Bella, descobrem que o Conselho a proibiu de casar por questões tão esdrúxulas elas mesmas invadiriam a reunião e fariam um grande estrago. Sei que tudo será resolvido de modo tranquilo, Bianca, mas saiba que se precisar estarei ao seu lado e intercederei ao seu favor.

-Eu também. - Emma fala e toma mais de sua bebida quente.

Mesmo que eu lute para me manter realista quanto a essa questão, a felicidade ameaça explodir meu peito. Imaginar que eu teria apoio da esposa de um Capo e da primeira dama da Famiglia é mais do que qualquer plano que já creiei, uma grande chance de conseguir uma liberdade de escolha que eu pensava não ter: meu próprio casamento. Dio Santo, ainda há esperança!


O Matador - Contos Santinelle 01Where stories live. Discover now