Caixa de Surpresas

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As folhas densas da floresta estavam sendo trocadas pela visão da McKey Avenue, a maior e mais movimentada avenida de Oregon, agora quase inabitada pelo horário. Alexander Grace, seguido por Charlie Rain, saem da Floresta 09 de Oregon e avistam uma barreira policial logo a frente. Várias e várias viaturas com fortes luzes vermelha e azul estavam enchendo a avenida. O mais velho puxa o outro pelo braço, os escondendo detrás de uma rocha próxima a eles.

Um segundo depois, um grande raio de luz vindo da área policial é lançado no lugar onde estavam.

"Obra de Vitae, provavelmente" - Pensa Alex - "Como vou sair daqui sem ser visto?"

Ele arrisca para dar uma olhada, movendo um pouco do rosto para o lado da pedra que os escondia. Muitas viaturas, muitas pessoas de uniforme. Ele volta para sua posição original e olha para o garoto ao seu lado. O menino estava observando cada detalhe de tudo. As árvores, o chão, o céu. E quando Alexander fitou seus olhos, se perdeu. Aquelas cores o deixavam sem chão, sem rumos.

Mas logo se recuperou, lembrando-se de seu atual objetivo.

Fechou os olhos e se concentrou. A dor veio novamente mas foi controlada em questão de segundos. Em sua mente acontecia a mesma coisa sempre, um mapa completo da área ao seu redor. Observou o garoto ao seu lado novamente. Ele já o estava fitando-o antes, com aqueles olhos que mudavam de cor hora ou outra. Então fechou os olhos e encosta seu corpo na pedra, a fim de se concentrar melhor.

Eram dezoito viaturas, tendo como 75 policiais no total. Todos armados com, pelo menos, uma pistola carregada e um cacetete. Cerca de 20 maquinados com uma AK-47. Também conseguia ver quatro homens de terno, secretários de Vitae, provavelmente. Eles estavam em pontos estratégicos na multidão, dando ordens. Alexander tenta expandir a área de seu poder mais um pouco, mas a dor estava sendo insuportável. No entanto, consegue ver a entrada para os subterrâneos do outro lado da enorme avenida.

O metrô.

Tinha que chegar lá de alguma forma. Mas agora, tinha que passar por essa muralha de policiais.

Em seu mapa, via que não tinha muita vegetação próxima, exceto a floresta que é do lado oposto ao objetivo. Então ele abre os olhos.
O feixe de luz ainda buscava sinais de vida vindos da floresta. Alex vira o rosto para o lado da pedra e observa de relance seus alvos. Não tinha a mínima ideia de como levaria Charlie para o outro lado sem ser visto. Talvez se conseguisse levar a atenção de alguns para o outro lado...

Ele rapidamente olha para a rua e avista uma garrafa de cerveja jogada no acostamento. Ele rapidamente se rasteja até lá e segura o vidro esverdeado com firmeza. Volta para onde estava, Reencostando suas costas na rocha.

Charlie começa a sentir uma dor tênue em sua cabeça. Ela parecia não incomodar tanto antes, mas agora estava forte demais. Sentia essa dor algumas vezes, sendo a última algumas horas atrás enquanto fugia da sua própria casa. Seria outra visão. A ideia lhe causou um arrepio na espinha. O poder de clarividência apenas era outra soma para sua lista de anomalias. Era realmente um monstro como seu pai sempre disse.
Então, não suportando mais a dor, fecha os olhos com força, levando suas mãos à cabeça em uma tentativa nula de amenizar seu sofrimento.

A visão é algo que nunca entendeu. São feixes de momentos que vêm e vão, formando uma só mensagem. A dor irritante se acentua enquanto recebe a premonição. Vê uma arma presa ao corpo de alguém com farda azul, um feixe de luz, uma grande rocha próxima ao acostamento, gritos, o rosto de Alexander sendo iluminado, uma pistola sendo levantada, tiros.

Charlie entendeu o que acontecerá. Nunca errou uma visão, nem mesmo uma vez sequer.

Nem mesmo quando sua mãe foi morta.

Era isso.

Abriu os olhos com velocidade e virou o rosto para o garoto ao seu lado. Ele estava apoiado com uma mão na pedra e se aproximava para a borda da rocha. Tudo se encaixa. Alexander vai observar além da pedra e será avistado com a luz.

Um dos policiais verá Alex e vai atirar nele.

Charlie não poderia deixar que isso acontecesse. Levou suas mãos para os ombros de Alex e o puxou para si. O garoto cai sobre o menor, que este o segura com força. Apenas dois segundos depois, o enorme feixe de luz passa pelo lugar onde o mais velho estava.

Charlie conseguiu.

Mudou aquilo que viu na premonição.

Ele salvou uma vida.
Alexander, após perceber aquilo que aconteceu, se posicionou para observar melhor o garoto ao seu lado.

O observou atentamente. E se perdeu naqueles olhos quando foram abertos depois de um suspiro pesado. Sempre se perde nos olhos daquele menino.

- Obrigado - ele disse ainda sentindo os dedos frios em seus ombros. Sua resposta foi um sinal positivo de cabeça.

Nunca acreditou em visões do futuro ou coisas do tipo. Não até presenciar uma.

O menino tem o poder de vidência também!

Sua vida acabou de ser salva por aquele que é sua missão. Isso apertou seu coração.

Tinha que tomar mais cuidado.
Então percebeu que ainda o encarava. Desviou o olhar para a garrafa em sua mão. Não tinha certeza de que seu plano funcionaria.

Não custava tentar.

Lançou a garrafa de vidro o mais longe possível. Atingiu em cheio a viatura mais distante. Uma dúzia de políciais foram em direção ao som. Um caminho estava livre agora. Se fossem rápidos e silenciosos, talvez conseguissem chegar à entrada do metrô.

Alexander puxa Charlie cuidadosamente pelo pulso e seguem em direção à primeira viatura. Falta apenas três para chegar ao outro lado. Eles se abaixam quando se aproximam do carro. Alex solta o pulso do mais novo para observar o movimento.

Limpo.

Parece que a sorte finalmente está a favor.

Ele pega a mão de Charlie dessa vez e avançam dois carros para a frente. Sente a mão gelada do garoto novamente.

Agora falta apenas mais um carro para chegarem ao outro lado da Avenida. Alex percebe quando Charlie encosta seu corpo na porta da viatura. Parecia cansado. Então seus olhares se encontram novamente.

Um banho de cores, era isso o que ele via nos olhos do menino. Dessa vez, era um castanho e outro azul bem escuro. Alexander se perguntou se as cores mudavam conforme a emoção do garoto no momento.

Talvez sim. Talvez não.

O som de botas batendo no chão fez com que Alexander saísse daquela linda hipnose.

Botas! Os policiais!

Ele tinha perdido a noção do momento em que estava e não percebeu dois policiais se aproximando. Era o fim. Foram pegos.

Quando foram avistados, os policiais apontaram as armas na direção dos garotos. Rapidamente, Charlie levantou sua mão em desespero.
Sentiu outra dor em sua mente. Mas essa era diferente de quando tinha premonições. Era menor.

Mas ele já estava acostumado com essa.

A dor quando usava seu poder de telecinese.

Quando olhou para os policiais, eles continuavam lá. Parados.

Como se o tempo estivesse em pausa.
Charlie permaneceu com o braço levantado, concentrado no que estava fazendo e espantado com o que fez.
Ele podia, além de mover, deixar estático.

Alexander observava aquilo. Quantos poderes aquele garoto consegue ter?

"É mesmo uma caixinha de surpresas" -pensou.

- Vamos Charlie - Ele segurou o pulso do garoto novamente, o levantando. Eles correram juntos até atravessarem por completo a McKey Avenue. O menino continuou com o braço levantado até entrarem na abertura para o metrô.

- Senhor? - O policial tentava contatar Theodore Vitae com seu ponto no ouvido - Eles estão indo em direção ao metrô. Devemos segui-los? 

-Não - A voz rouca do homem de 54 anos ainda era forte, até mesmo por comunicação - Isso faz parte do meu plano. Apenas reforcem as forças na periferia. O garoto é mais poderoso que pensei.


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