Folhas Caídas

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As portas do elevador executivo finalmente se abriram depois de alguns minutos de viagem até o escritório de Theodore Vitae. O branco das paredes, semelhante ao terno do empresário sentado na mesa centralizada, porém distinto do terno negro de todos os seus secretários, dava a impressão que o lugar era ainda maior. As enormes janelas espalhadas por todo o ambiente permitiam que a luz ofuscasse a visão do rapaz ao dar seu primeiro passo ao sair do elevador. Um leve sorriso é formado nos lábios de Vitae após notar sua presença.

- Boa tarde, senhor Grace - O homem cordialmente se levanta para dar um aperto de mão no garoto, que corresponde o gesto - Tenho uma missão a você.

- A senhorita King me pediu que viesse o mais rápido possível - O garoto puxa a poltrona a fim de se sentar - Qual a missão que ela mencionou?

O homem entrelaça os dedos e os põe próximos a sua boca. Depois de certo tempo assim, se levanta da poderosa poltrona de couro e caminha lentamente pela sala.

- Charlie Rain, um garoto pobre que, recentemente perdeu os pais em um trágico acidente, está foragido. Ele é perigoso e deve ser curado. 

Alexander contrai as sobrancelhas.

- Curá-lo? - Pergunta nervosamente - Ele está doente?

- Digamos que ele tem um dom mais forte que o seu - Dá um sorriso malicioso - Nunca ouvi outro relato semelhante e pode se tornar letal contra os outros.  Preciso curá-lo para que não afete outros humanos, entende? 

O garoto apenas faz um sinal positivo com a cabeça.

- Quero que o encontre na Floresta 09 de Oregon. Conquiste sua confiança e depois de uma semana com ele, traga-o para cá. Meu pessoal irá levá-lo até o local. Seja amigável e fuja daquela área para alguma casa ou apartamento na periferia. Deixe que cuido da parte dos gastos que acarretarão. Eu pressuponho que sete dias seja suficiente para que seja realizada a operação com êxito. Apenas tenha cuidado com ele. Ele não pode se ferir nesse meio tempo.

Alexander escuta em silêncio as ordens, então se lembra de um ponto que passou quase que despercebido.

- O senhor disse que o dom dele é mais forte que o meu. Mais forte quanto, exatamente?

A caminhada de Vitae chega ao fim. Ele observa o rapaz sentado antes de responder.

- Apenas faça o que eu digo: Se torne amigo dele.

As gotas da chuva tocando o vidro do carro começaram a aumentar sua velicidade. Em menos de dez minutos, já estava na entrada da Floresta 09 de Oregon. O transporte providenciado por T. Vitae foi de imensa ajuda. Digamos que Alexander entrou pela primeira vez em sua vida no lendário Bugatti Veyron, um carro que chega a marca de 415 km/h. Ele saiu do veículo, escoltado por dois secretários com um imenso guarda-chuva. 

Foi em direção à entrada da floresta. Teria de fazer isso sozinho e confiar em seus poderes era essencial para isso. Estava pensando na conversa que teve com o cientista. O garoto era mais poderoso que ele. Uma faísca de medo o cobriu por um pequeno tempo mas logo a afastou dos pensamentos. Ele tem que cumprir sua missão.

Entrou correndo na floresta, deixando os secretários e os carros de policiais para trás. O lugar era um dos maiores de Oregon, cheia de árvores altas. Seria impossível encontrar um garoto naquela floresta, já que ele estaria provavelmente escondido.
Hora de usar suas habilidades.

Sempre foi proibido do fazer isso em sua casa. É algo anormal. Isso não deixa as pessoas terem segredos.

Mas era necessário. Caso descumprisse as ordens de Vitae, seu pai era morto.

Ele fechou os olhos e se concentrou. A dor irritante em sua cabeça já era familiar, então nem se importava muito. Começou a sentir a presença de tudo ao seu redor: árvores, animais, água, vento.

Era uma espécie de mapa pessoal. E quanto mais aprofundava sua visão da floresta, mais a dor crescia. Era um mapa 3d de tudo.

E conseguiu ver uma mancha desconhecida. Era o garoto. Estava sob um tronco caído em uma área mais baixa, se protegendo das gotas de chuva. Tentou ler os pensamentos do menino mas não conseguia. Era a distância de três quilômetros tornando impossível a leitura, deixando apenas um rastro de névoa.

Iniciou a corrida até seu prêmio, usando seu mapa mental como bússola. Era incrível a precisão que seu poder dava. Tudo estava ali, e se atualizava de acordo com seu movimento ou dos animais ou árvores.  Ou seja, se o garoto mudasse de posição, saberia. Correu desviando de troncos e poças ocasionadas pela chuva. Ouvia o som do vento e da água batendo nas folhas caídas. Usou atalhos para diminuir o tempo e logo avistou o tronco. Podia sentir a presença do garoto escondido do outro lado.

Se agachou e, dando passos leves, foi se aproximando até ver o menino. Aparentava ter pouco mais de 16 anos. Usava apenas uma calça preta folgada, provavelmente o tecido de moletom, e uma blusa de manga longa, cor cinza, encharcada pela água da chuva. Estava com as costas encostadas na madeira, com as pernas esticadas. Seus braços seguravam seu cabelo negro com força, mantendo os olhos fechados com força, como se sentisse dor. Estava descalço.

- Olá - Arriscou, se aproximando. Tinha que ser amigável para conquistar a confiança dele.

O garoto se assustou muito ao ouvir sua voz. Olhou para Alexander ao seu lado e rapidamente se levantou, correndo o mais rápido que pôde.

Alexander sabia que não podia deixar o garota fugir e correu também, tendo uma vantagem: Ele tem um mapa completo da floresta, aquele garoto não. Se aproximaria dele rapidamente de novo.

"Como ele pode ser uma ameaça para Vitae? - pensou - É apenas um garoto assustado"

- Espera, eu não vou te machucar! - Gritava mas o menino à sua frente não parava.

Corria em direção ao garoto descalço e viu o momento que ele escorregou em uma poça, desabando ao chão.

Se aproximou do menino caído.

- Desculpe por te assustar - Disse ofegante - Não vou lhe fazer ma...

O garoto gritou, levantando a mão em sua direção. Automaticamente,  o corpo de Alexander foi arremessado por metros de distância, se distanciando do menino. Sentiu seu corpo tocar um tronco caído com força, e uma pontada dolorosa acima do quadril. Soltou um grito de dor e olhou para o local que sentia o desconforto. Um galho de algum tronco estava lá, preso ao seu corpo. Rapidamente, puxou a madeira e gemeu dolorosamente ao fazer isso. Buscou o garoto com os olhos e o avistou levantado, com as mãos tapando a boca num sinal de medo.

"Telecinese - Pensou - É esse o poder."

O garoto se aproximou do ferido. Tinha medo expresso em seu rosto ainda. Medo de ter machucado o outro.

- Desculpe - Falou e Alexander finalmente ouviu sua voz. Era lenta e trêmula, preocupada. Tinha uma feição preocupada. Um rosto jovem e limpo.

Então ele viu os olhos do garoto. Um era vermelho cor de sangue, o outro era um azul muito claro, próximo ao cinza. O garoto mergulhou na infinitude das cores. Eram hipnotizantes.

- Não precisa ficar preocupado comigo - Alexander disse - Vim te proteger.

O outro apenas assentiu, se acalmando. Então continuou.

- O meu nome é Alexander Grace, mas pode me chamar de Alex - Se posicionou melhor, ainda olhando nos olhos coloridos do rapaz - Qual o seu?

- Charlie Rain - Disse com o mesmo tom de voz.

- Vou te tirar daqui, Charlie. Mas precisa confiar em mim, certo?

O garoto assentiu novamente.

O plano de Vitae estava dando certo. Teria que ganhar a confiança de Charlie e leva-lo à sede do cientista em sete dias. Alex se levanta e, usando o mapa da floresta que fez em sua mente, segue na direção mais próxima da periferia da cidade.

Sendo seguido por Charlie.

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