VIAJAR

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Adrien era mesmo um idiota, foi a conclusão que Arely chegou assim que trancou o portão e caminhou na direção da porta, se esforçando para manter as vozes afastada e permanecer lúcida. Ele fora contra o que tanto Ruby como Allan tinham sugerido: que ela continuasse na sede do clã Carvalho, por causa do risco que os pais dela corriam caso ela mergulhasse na insanidade. Ele apenas alegara que estar perto dos pais deveria era facilitar que ela permanecesse lúcida e capaz de descobrir seu pior medo.

Idiota. Sem dúvida alguma. Cada coisa que as vozes e as visões contavam e mostravam sobre ele aumentavam o quão idiota ela o achava. Inferno de maldição que a fazia, apesar disso, ainda amá-lo.

Abriu a porta da sala de cabeça baixa, empurrando-a com uma das mãos. Algo pinicava em sua mente, as vozes agitadas, loucas para arrastá-la. Havia muito silêncio na casa. Nunca se acostumaria com a ausência de Kyara e Tigrinho, mas ainda estava muito silencioso.

Ergueu a cabeça e encarou com desconfiança a mesa onde sua mãe fazia-os sentar para comer ao menos nos fins de semana; deixou a bolsa com suas coisas cair perto da porta antes de se aproximar. Viu uma panela com macarrão à bolonhesa até a metade, no centro da mesa, uma vasilha com salada de alface e tomate, e pratos com a macarronada, meio comidos, os garfos apoiados no vidro. Tocou com cuidado a comida, confirmando que estava fria.

Um arrepio de pavor subiu por sua coluna. Percorreu rapidamente o térreo, vendo as portas para os fundos com os cadeados trancados, antes de parar ao pé da escada.

- Pai?! Mãe?! – a voz tremeu quando os chamou. Sentiu os olhos começarem a marejar quando passou-se um minuto sem resposta. Os chamou de novo, mais alto, e de novo apenas o silêncio a cumprimentou.

Subiu correndo os degraus e, apesar de ter percorrido aquela escadaria incontáveis vezes nos últimos dois anos, conseguiu tropeçar duas vezes; só não quebrou a cabeça nos ângulos agudos por ter conseguido se segurar no corrimão, o ombro reclamando pelo esforço.

As portas estavam todas abertas. Verificou a mini-biblioteca e o próprio quarto antes de entrar no dos pais.

A cama estava impecável. A porta do banheiro, disfarçada para parecer uma porta do armário embutido, também. Tentou chama-los uma última vez, de novo sem sucesso.

O carro estava na garagem. E a comida tinha sido abandonada na metade. Aquilo não fazia sentido. Algo acontecera com seus pais. Sentiu a garganta começar a apertar conforme a vontade de chorar de desespero aumentava.

Virou-se, prestes sair do quarto e a correr para baixo, pegar o celular na bolsa e ligar para Allan, mas alguém barrava seu caminho.

O cabelo era preto num corte militar, deixando-a ver todo o rosto de pele escura de sol de expressão sonolenta. Mas os olhos eram de um azul claro leitoso que expunham tudo, menos sono. Uma inteligência astuta e perversa. Não se deixou enganar pela pose relaxada do corpo magrelo. Havia algo na forma como os braços estavam soltos ao longo do corpo que lhe dizia que ele era capaz de mata-la com um estalar de dedos.

- Você demorou. Louis já ligou umas duas vezes perguntando de você. – ele bocejou, sem se preocupar em cobrir a boca. – Sou Jabez, aliás. – Jabez. O segundo Bruxo. Um Mensageiro que matou e aceitou parte de um Demônio no lugar. O primeiro a fazê-lo. – Vamos. Louis vai acabar matando seus pais só por diversão se demorarmos muito.

Sentiu seu coração gelar. Molhou os lábios devagar, abrindo e fechando as mãos. Controlou-se para não avançar e tentar atingir o rosto do Bruxo. Mesmo as vozes tinham se calado, como se aquele momento fosse tão crítico que precisavam dela lúcida.

Ela vira Allan ligar para Matheus e perguntar se estava tudo bem, antes que a deixassem em casa. Como tinham furado a segurança em torno do lugar e levado seus pais em tão pouco tempo?

Arely A Mensageira - The War IOnde histórias criam vida. Descubra agora