FUGIR

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Frio.

Escuro.

Falta de respiração.

Falta de batimentos.

Água.

Água.

Água em todas as direções.

Nada de superfície logo acima.

 

Sentou-se num pulo, o cabelo grudando-se ao rosto e a camisola ao corpo. Quase podia sentir ainda a pressão da profundidade em seus ouvidos e a água passando pelas vias respiratórias. O coração acelerado, sentindo a pulsação logo abaixo de suas orelhas, lhe dizia que estava viva, que ainda respirava.

Suspirou, lutando para estabilizar a respiração descompassada. Por que estava voltando a ter aqueles pesadelos?

Primeiro, ao encarar os olhos descolorados de Louis. Depois, no mesmo dia, aquele estranho sonho em que as mãos sangravam. E agora, isso. Desde a semana anterior à mudança para Goiânia, quando ainda morava em São Paulo, que não tinha pesadelos tão intensos.

Viu uma réstia de luz penetrar pela cortina, e ao observar, viu que o céu começava a iluminar-se. Era segunda-feira. Passara o que sobrara de seu sábado e boa parte do domingo no hospital, e o resto do domingo conversando com Ruby, que fora embora tarde. E não estava com um pingo de ânimo de sair da cama e encarar os colegas. Na verdade, estava sem coragem alguma era de encarar Louis. Os demais ela suportaria.

Suspirou, relegando um último olhar ao rádio-relógio que marcava seis horas, deu as costas para a luminosidade que se infiltrava lentamente pela janela escancarada, cobriu-se até o queixo e voltou a dormir.

Ela já deveria ter se levantado há no mínimo vinte minutos se quisesse chegar a tempo no colégio mesmo...

Seu coração queria parar, lentamente, perdendo a batalha... Só entrava água ao invés de ar através da traqueia.

Estava quase desistindo de tentar alcançar a superfície.

Quase...

Alguém agarrou seu braço com uma força esmagadora. Mãos grandes. Calejadas. Quase sem perceber, timidamente envolveu o braço do estranho que lhe estendia a salvação com a própria mão. Sentia os músculos definidos e tensos.

E então, quem quer que fosse, a puxou para fora, como se ela não pesasse nada. Como se a água não estivesse tentando reclamá-la para suas profundezas misteriosas, sombrias e solitárias.

Seu peito reclamou o ar desesperadamente, enquanto os olhos buscavam aleatoriamente o rosto daquele que lhe salvara.

O rosto estava borrado por névoa. Apenas os olhos amarelados eram visíveis, brilhantes como faróis. E a sensação de que já os vira latejando em sua cabeça.

 

Acordou novamente. Dessa vez, o maior culpado era o celular, apoiado em cima do rádio-relógio.

Bufando por ver que eram ainda nove e pouco, Arely esticou o braço para atender o insistente aparelho que tocava “Njord”, do LeavesEyes.

— Alô... – a voz delatava: estava morrendo de sono e só suas boas maneiras fizeram que ela não mandasse quem quer que tinha lhe ligado àquela hora para o Inferno, tomar naquele lugar, o que ele preferisse.

Ly?! Você tá bem?! – a voz estridente de Patrícia. Por que a garota estava tão preocupada com ela? Sequer eram amigas... Apenas alguns trabalhos em grupo.

Arely A Mensageira - The War IOnde histórias criam vida. Descubra agora