20. Dilema

2.8K 213 14
                                    


Eu estava ficando desconfortavelmente íntima com a palavra "caos". Divórcio de meus pais, chegada de Lauren, descobrir que Alejandro não era meu pai biológico – uma história mais absurda do que a outra. Estava começando a me preocupar com qual seria a tragédia que viria a seguir. Já não sabia mais o que fazer diante de tamanhos problemas. Quando um ia embora, nada demorava para que outro chegasse. Eu estava me sentindo extremamente encurralada, presa, sem alternativas.

Naquele momento nada me tentava mais do que ir embora com minha mãe para Boston. Afinal, eu estava tão magoada com Alejandro que a possibilidade de morar sob o mesmo teto que ele me parecia muito remota. Embora eu o amasse muito, era inegavelmente difícil pedir para que eu aceitasse que um pai de verdade era aquele que dava educação, e não o biológico. A minha fragilidade era demasiada, ao ponto de eu pensar que me desfaria em mil pedaços diante de qualquer outro problema, por menor que ele fosse.

Entretanto, tudo isso nem se comparava com o fato de que eu teria de deixar Lauren para trás. Eu me sentia completamente incapaz de pensar sobre essa parte da história. Acho que faltava espaço em minha mente para processar tantos dilemas.

Minha mãe estaria em São Paulo apenas para passar o final de semana, nada mais. Na segunda-feira, logo pela manhã, teria que voltar para Boston. Afinal, as obrigações dela nos Estados Unidos eram muito maiores do que costumavam ser ali, no Brasil. Ela havia insistido inúmeras vezes para eu ir embora com ela para Boston, e eu queria muito, mas as coisas não eram tão simples assim. Eu sabia que poderia viajar e ficar apenas alguns dias junto com ela, mas era óbvio que eu não conseguiria voltar depois. Adaptar-me a ficar ao lado de minha mãe, quem eu tanto amava, seria absurdamente fácil. E depois, como eu faria para retornar para os braços de Lauren, se provavelmente não iria mais querer morar com Alejandro ao ter que manter tamanha distância de minha mãe?

Minha cabeça ia explodir.

Novamente... encurralada, presa, sem alternativas.

Olhei-me mais uma vez no espelho de meu closet, tentando encontrar uma palavra que definisse a expressão congelada em meu rosto. Os lábios estavam retorcidos e as sobrancelhas, unidas. Os olhos escuros tinham um misto do que parecia ser medo, dúvida, angústia e tristeza. Era melhor eu parar de pensar naquela confusão – como se fosse possível –, me recompor e tomar coragem para descer ao primeiro andar e jantar com minha "família".

Saí de meu quarto e praticamente arrastei meus pés até a sala de jantar. Parecia que a força da gravidade estava inúmeras vezes mais poderosa que o normal, me sugando e puxando para o chão. Ao entrar no recinto, encontrei Alejandro sentado na ponta da grande mesa. De seu lado esquerdo estava Lauren e do direito, minha mãe. Cada um tinha uma expressão diferente.

Alejandro estava com os ombros caídos, remexendo a comida em seu prato com o garfo de um lado para o outro, sem parecer encontrar seu apetite. Lauren comia em silêncio e sua expressão era indecifrável. Minha mãe comia com uma mão enquanto mexia em seu celular com a outra, coisa que ela odiava que os outros fizessem. Acho que era uma forma de tentar se distrair de toda aquela atmosfera pesada.

Sentei-me ao lado de minha mãe e permaneci em silêncio. Alejandro não teve coragem de me olhar e simplesmente continuou a mexer a comida. Minha mãe foi a única a me cumprimentar, sorrindo para mim.

Lauren.

Ah, Lauren.

Fora uma das piores sensações do mundo olhar para ela naquele momento. Embora seu rosto continuasse indecifrável, seus olhos eram muito expressivos. Vi meu medo, dúvida, angústia e tristeza serem refletidos naquele oceano esverdeado e escuro.

Uma Estranha Em Minha VidaOnde histórias criam vida. Descubra agora