Eu tive um sonho, um sonho bom, nesse sonho eu não estava nesse lugar com essa gente, não sofria nenhum tipo de preconceito e meus pais me amavam. Era um lugar bom, mas aí eu acordei com o soar das buzinas pelo corredor grande esverdeado com portar de aço, levantei e me dei conta de que sim eu estava em um manicômio, eu gosto de como essa palavra soa, chega a ser sofisticado, mas não sei se realmente é pelo simples fato de eu estar em um.
Me levantei e fui até a porta esperando ela ser aberta, uma das poucas coisas que nos privam aqui além de viver com o resto do mundo era a porta aberta durante a noite, acho que por motivos óbvios. Assim que ela abriu, vi várias pessoas paradas ao lado da porta de seus quartos, fiz o mesmo e só depois de um tempo percebi o porque, remédio, eu não precisava tomar não é? Eu não era louco, eu matava, era diferente.
Por azar, quem me trouxe o remédio em uma bandeja com diversos remédios com diversas cores e formas, foi o filho da diretora, ele me olhou e engoliu em seco, reação exagerada . Ele estendeu o remédio sem falar nada, eu não o peguei, não iria tomar.
-Por favor...- Ele falou baixo quase não dando pra mim escutar.
Fiquei com dó, ele estava sendo forçado a trabalhar aqui e isso está na cara, ele sente medo. Peguei por dó.
-Do que é que você tem medo.-Disse tirando da sua mão o remédio e tomando.
Ele apenas me olhou sem entender e foi para o próximo paciente. Quando acabaram de dar remédios aos pacientes falaram que poderíamos ir para a sala de refeição, eles tem um linguajar sofisticado demais para um lugar como esse. Eu me dei conta de que não sabia onde era o refeitório, me dei conta também que todos os pacientes já haviam saído do corredor, fui até um dos funcionários e perguntei onde era e para minha sorte ele era educado, segui suas instruções e cheguei ao lugar certo, sempre fui bom em coordenadas. Fui escoteiro por uns dois anos, os anos que minha mãe ainda se importava comigo, depois de fazer 10 anos tudo desmoronou, meu pai sumiu e ela me tirou do escoteiro, da aula de piano, da aula de natação e me colocou na escola publica, não que isso seja um problema, mas foi onde todo aquele inferno começou. Eu acho que isso tudo é culpa dela, se ela não tivesse me tirado de tudo, se ela tivesse me dado atenção, se meu pai não tivesse me deixado, tudo estaria bem.
Peguei uma bandeja que estavam enfileiradas junto aos pratos, aos talheres (mais precisamente apenas colheres), perto dos potes para as sopas e dos copos de plástico. Coloquei na bandeja um prato, um copo, uma colher e fui para a fila da comida e enquanto esperava reparei na forma como o refeitório era organizado, os mais ''loucos'', vamos dizer assim, ficavam sentados em mesas a direita na parte norte com os enfermeiros já que as pessoas consideradas perigosas ou os mais loucos eram supervisionados por enfermeiros e não por simples funcionários, tinha mesas que eram cercadas por uma grade para manter aqueles agressivos longe dos demais. Já os outros pacientes sentavam na parte esquerda, sempre sendo observados pelos funcionários para ver se eles estavam comendo direito, para ver se eles não estavam brigando, entre outras coisas.
Chegou minha vez de pegar a comida e me surpreendi novamente, a comida tinha uma cara muito boa, era apetitosa, diferente do que eu achei que era, inclusive era melhor até que a da escola. Pedi um pouco de macarrão, arroz com couve-flor e suco de uva. Olhei as mesas e as pessoas sentadas em cada respectiva mesa, eu não me enquadrava em nenhuma porém não tinha nenhuma vazia a não ser por uma, mas sei não, ela é muito perto da grade e perto dele. Não queria me sentar perto de ninguém mas também não queria sentar perto dele, ele se sentia desconfortável e eu não queria deixar ele assim. Fui andando em direção a mesa vazia e me sentei na cadeira mais longe possível, senti seu olhar em mim. Apenas ignorei e comecei a comer, após devorar toda a comida que estava em meu prato me levantei e coloquei a bandeja na pilha de bandejas suja que ficava embaixo de uma placa enorme e eu não estou sendo exagerado escrito ''BANDEJAS AQUI.''
Sai do refeitório e fui diretamente para fora, as portas eram de madeira talhada, o gramado era verde e tinha várias árvores, resolvi sentar na sombra de uma com os olhos fechados e assim fiquei por um longo tempo, analisando como minha vida mudou do dia pra noite. Eu tinha uma casa que era minha, um quarto que era meu, uma vida que era minha, tinha Niall e agora eu não tenho nada. Abri os olhos e então vi ele do outro lado do pátio, vários funcionários olhando os pacientes e conversando entre si, apenas um não fazia isso. Ele estava afastado dos outros, sozinho em um banco de mármore esculpido com anjos na ponta, acho que senti meu corpo esquentar, o filho da coisinha olhava diretamente para mim e quando percebeu meu olhar sob ele, virou rapidamente a cabeça em outra direção, passou a olhar para sua ficha. Tomei uma decisão, talvez um pouco estúpida, de me levantar e ir falar com ele, ele não iria me responder mas nada custa tentar.
Fui andando em passos leves e calmos, quando cheguei ao banco olhei para ele que me olhava com medo e envergonhado e eu só me perguntava porque. Todo o sentimento que eu sentia perto dele era angustia por não o entender, por não entender por que ele tinha todo esse medo de mim.
-Posso sentar? - Perguntei saindo dos meus devaneios e apontando para o lugar livre .
-Vai mudar algo se eu disser não?- Ele disse baixo quase não dando para lhe escutar novamente, to começando a achar que ele fala sempre baixo.
Agora que estou perto dele reparei em duas coisas que não tinha reparado, e se tinha não me lembro. Ele tem covinhas e não é uma ficha e sim um livro, que conta a história de um amor bem tóxico na verdade.
-Meio tóxico, não? - Apontei para o livro. Ele desce o olhar para capa e de volta para mim.
-Talvez.
-Você tem medo daqui? - Acho que foi demais pra ele pois ele arregalou os olhos e baixou a cabeça.- Você tem um olhar que mais ninguém aqui tem, você claramente não gosta de estar aqui né?
-Sendo sincero? Odeio. - Então se levantou e saiu apartar uma briga.
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Suicidal Love
FanfictionLouis sofre uma vida inteira de injustiças e decide se vingar, considerado incapaz pelo júri e então mandado para o hospital psiquiátrico em que Harry, futuro psicólogo, trabalha para passar o resto da vida.