Segredos Mortais

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  O beijo foi breve e delicado, não queriam correr o risco de alguém acordar e dar de cara com eles assim. Se afastaram sem nenhuma vontade de faze-lo.
- Temos de ir deitar. - Sussurrou Kathy. - Faltam poucas horas para o amanhecer. O dia pode ser longo...
  Kathy se virou para a cama, Minho a puxou de volta. Os dois se chocando pela força exagerada, como de costume, que o garoto usou.
- "Dissipador"? - Indagou ele.
  Os olhos de Kathy se arregalaram. Na luz fraca da noite ela parecia pálida, mas depois dessa palavra seu rosto ficou como a claridade dos raios e relâmpagos de horas antes.
- D-Dissipador? Sim, sim. - Gaguejava ela. - Você me contou, lembra?
- Não. - Respondeu ele com os olhos semicerrados, mesmo que ela não pudesse definir se estavam ou não fechados.
  Com passos lentos, Kathy recuou. Um resmungo gritado foi ouvido. Os dois se assustaram e olharam em volta. Um dos Clareanos agitava a mão direita e praguejava Kathy por tê-lo pisoteado.
- Eu vou para a cama. - Sem esperar resposta a jovem dançou entre os garotos no chão até o colchão, se atirando sobre ele e se embrulhando.
  Um momento longo se passou. Minho teve vontade de ir atrás de Kathy, subir no colchão, sufocar a menina com o travesseiro e faze-la falar. Mordeu o lábio inferior em frustração, se encaminhando para seu "luxuoso colchão" de cobertores no piso empoeirado, sem ter muitas opções do que fazer naquele momento.
  Deitou esmurrando os panos, até formar uma bola onde pôs a cabeça, como travesseiro. Suspirou. A raiva o dominando.
  Kathy por vezes o deixou confusqo. Mas dessa vez, ele teve certeza de que algo estava errado. Muito errado.
  Havia aquele desejo entre eles. Atração, ele tinha de admitir. Como se ele gostasse daquele louca desde sempre. Talvez se conhecessem, mas ela lembraria.
  Doía tanto nele não poder lembrar do seu passado! Queria poder arrancar o instrumento em sua cabeça. O "Dissipador" como Kathy dissera...
  Voltou para o ponto de partida. Como ela poderia saber o nome daquela coisa em sua cabeça? Ou como ela poderia citar o Labirinto momentos antes de entrarem no segundo andar? Fora tudo coincidência?
  Teve ímpetos de gritar a plenos pulmões. Tinha a sensação de estar sendo... Iludido.
  Novamente a dor. Respirou fundo. Pelo visto não imaginava o quanto gostava de Kathy, e isso fazia o peito doer mais.
  Resolveu não pensar mais naquilo. Porém, com a janela aberta e a fraca luz das estrelas, um brilho alcançou seu rosto vindo do chão próximo ao seu pé.
  Uma das provas de que Kathy escondia mais do que aparentava, a arma que ele havia jogado no chão depois de atirar em Thomas. Como ela poderia ter aquilo?
- Mértila... - Saiu de sua boca um murmúrio irritado.
- Shh! - Protestou alguém próximo a ele.
  Quase ergueu o braço e socou a pessoa, mas se conteve. Não iria descontar em quem nada tinha a ver.
  Tentou de todo modo esquecer, não pensar na arma, ou em Kathy, embora nada adiantasse. Como se não fosse suficiente, a perna começava a latejar. Os outros ferimentos leves pareciam formigar, Minho se obrigou a ficar quieto, mesmo que sua vontade fosse enfiar as unhas e tentar acabar com aquela tortura.
  Agoniado, se sentou. Sem perceber, acabou por pegar a arma do chão.
  Se moveu devagar até a janela que deixaram aberta, inspirando o ar da noite. Apontou a arma para o céu. Mirou as estrelas. Seus ombros caíram depois de um tempo. A arma, nas palmas, sendo examinada. Os cotovelos feridos um pouco afastados da beiradas da janela, enquanto ele se apoiava nos antebraços.
  Virou a arma de um lado para o outro, tentando de todo modo receber uma resposta. Começava a achar que olhava para a arma por não ter mais o que fazer.
  Convencido disto, resolveu largar o objeto. Mas não o fez, apenas o tirou de seu campo de visão. Olhou para a rua deserta.
  Passou uma das mãos pelo cabelo. A outra segurando a arma de modo firme. Não gostaria de perder algo que poderia salva-lo em um momento difícil.
  A mão pousada em sua cabeça desceu rapidamente quando ele viu algo. Acima do gatilho encontrava-se uma inscrição pequena. Com letras amarelas, podia-se ler duas pequenas palavras. Ficou perplexo, depois de definir o que dizia, por longos minutos.
  Minho relançou um olhar desconfiado para a cama onde Kathy parecia dormir. Apertou o cabo da arma e decidiu voltar a deitar, antes colocando o objeto letal escondido na parte superior da janela.
  Fechou os olhos com força. Não dormiu. Apenas ficou sem se mover, enquanto sua mente girava entorno de Kathy e seus segredos. Vez por outra, surgia em meio a tudo isso a frase que fora cravada na arma:
  Propriedade - CRUEL.

EM REVISÃO • Deserto MortalOnde histórias criam vida. Descubra agora