Ginásio Morto

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          Ao longe, ecoando pelo ar, que cada vez mais ficava quente e seco, os gritos ainda eram ouvidos. Bem como o som de passos pesados e raivosos na areia aquecida. As vozes carregadas de fúria cega, descontrolada.

  Assim como, se prestasse bastante atenção, também era possível distinguir as respirações pesadas de dois jovens beirando a exaustão. Seus passos eram diferentes, seus movimentos e também postura. Claro, eles ainda estavam plenamente conscientes! Ainda. Esse ponto talvez não pudesse ser aplicado a garota, que se deixava arrastar pelo menino de pele dourada. Ela se preocupou ao começar a ver tudo através de uma névoa tortuosa. O restos de asfalto coberto de pó estavam tremulando assustadoramente rápido e ela sentia uma ardor quase insuportável no alto de sua cabeça. As lágrimas que escorriam por suas bochechas depois de se acumularem em seus olhos atrapalhavam menos que os fios de cabelo que insistam em ficar em sua face. Não, nada disso devia importar, nada devia tirar seu foco.

— Temos de dobrar... — Ela apontou adiante. Sua voz parecia o esfregar de pregos em asfalto, de tão rouca.

  Haviam chegado à uma rua larga que, assim como todas as outras, estava coberta pela areia. No céu, os perigosos raios solares aparecendo com surpreendente rapidez para anunciar a chegada de mais um infernal dia quente. Parecia que seus pés afundavam naquele mar branco. Era quase como se cada passo fosse mais lento, mais pesado. Era como se cada grão de areia estivesse puxando-os para que o calor pudesse pegá-los assim que surgisse.

— Para onde está me levando, fedelha?! — Perguntou aos gritos o garoto suado. Seu desespero era evidente, quase palpável. Apesar de seu preparo físico, o rapaz achava que não aguentaria muito mais, não tendo de suportar seu peso e carregar aquela menina. — Eles estão chegando perto!

  A garota tropeçou novamente, mas ele a segurou apertado pela cintura e a pôs de pé. Seus dedos sentindo as costelas dela sob surrada a blusa fina. Sim, ele podia sentir como ela era minúscula, mas isso não significava que seu peso não se fazia presente. Ainda assim, mesmo pensando que talvez não fosse aguentar, ele não a deixaria para trás. Não era da sua natureza.

Aquele garoto não era do tipo que abandonava alguém sem antes tentar ao menos o mínimo.

— O... Gin... — Sem conseguir falar por causa de uma tosse repentina, a moça apenas gesticulou em uma direção à frente.

  Ele deixou que seus olhos virassem para onde ela indicou. Foi o teto de metal brilhando sob a luz do amanhecer que chamou a atenção do menino. As letras na fachada foram destruídas pelo tempo, o que tornou impossível para ele saber que tipo de lugar aquele tinha sido no passado. Mas a jovem parecia saber o que estava fazendo, parecia saber onde estava. E ele precisava acreditar nisso! Precisava ceder minimamente e ter fé naquela que se agarrava firmemente ao seu corpo. Porque, se aquele era o lugar que ela queria ir, eles estavam perto. Talvez chegassem à tempo e isso significaria que ainda havia uma chance para ambos, já que a jovem parecia ter algum plano. 

  A corrida já se tornara uma tortura muitos passos atrás. Agora, cada movimento enviava pontadas de dor, como agulhadas em todas as partes, como se os músculos estivessem envolvidos em lava. Ele sentia que logo teria câimbras, ou algo pior. Ela já estava com a garganta fechada, o ar não chegava em seus pulmões... ou era o que lhe parecia, a sensação era essa. Se tivessem que correr por mais um minuto que fosse...

  Mas finalmente chegaram aos portões de metal do enorme local. Suas mãos tocando a fria lataria antiga em busca de apoio. Sem resistir ao impulso, os jovens deram uma ligeira olhada por cima de seus ombros para trás. A garota gritou ao ver uma mulher, tão próxima, que se erguesse os braços a tocaria. Rápido, o garoto deu um chute no peito da Insana, derrubando-a no momento certo. A adoentada caiu sobre o que fora uma área pavimentada. Sobre a areia, completamente perdida em sua própria mente corrompida, a Insana gritava e chorava. A mão cheia de feridas tocando onde havia sido atingida pelo chute. De sua boca de tortos dentes amarelados, além de saliva e sague, saíam palavrões e risinhos balbuciantes, acusações. A minha que o Corredor havia salvado não conseguia tirar os olhos da cena, seu peito subindo e descendo em busca de ar da mesma maneira que da Insana ao chão.

EM REVISÃO • Deserto MortalOnde histórias criam vida. Descubra agora