Desejo Mortal

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  Kathy estava sobre algo macio e ao mesmo tempo sólido. Sentia seu corpo subir e descer em um movimento ritmado e suave. Haviam braços passados ao redor de sua cintura que a apertavam de vez em quando. Mas tudo era extremamente confortável.
  Deixou um suspiro escapar. Havia tempos que não se sentia daquela forma. Um sorriso se formou em seu rosto. Os braços estavam em torno de algo, mas ela não saberia dizer bem o quê. As pernas flexionadas e dormentes, provavelmente por estar agachada por muito tempo. Contudo, se sentia bem.
  O cheiro de suor inundava o lugar, embora de onde ela estivesse, o cheiro tinha um tom amadeirado e deixava o odor suportável. Mais que suportável. Ela inalou com gosto.
Tentou erguer a cabeça, mas o aperto em sua cintura foi mais forte. Não podendo se mover, ergueu os olhos.
  Minho. Era ele. Tinha o rosto sereno. De olhos fechados, parecia dormir tranquilamente.
  Por um longo momento, Kathy apenas observou o garoto. Aproveitou para olha-lo o quanto quisesse. O cabelo grudado na testa, ainda molhada pelo suor, a pele morena, os braços músculos que a envolviam... O peito onde estava encostada, parecendo tão cheio de músculos quanto os braços. Ela podia sentir cada parte do corpo dele contra o próprio corpo. Cada respiração, até seus batimentos cardíacos. Kathy acabou pensando se não era capaz de sentir outras coisas a mais, se conseguisse se mover um pouco mais para frente. Corou ao ter aquele pensamento.
  Olhou para o rosto dele novamente. Não havia deboche, não havia nada. Era apenas a calmaria de um sono em paz. Kathy, o vendo assim, começou a ver como ele era... Bonito...
  Ainda não o tinha olhado com atenção. Não queria ver a maior prova de seu fracasso.
  Sua maior recomendação era não se aproximar deles. Mas havia feito algo pior, havia separado um deles e, como se não bastasse, tinha se unido a ele!
  Cortando sua linha de pensamento, Minho se contorceu abaixo dela. Pelas bochechas, Kathy via a mandibula dele rígida. Os braços apertando-a contra ele com força. Estava tendo um pesadelo?
  Kathy tirou o braço da nuca de Minho e tocou na bochecha do garoto. A pele estava quente e molhada.
- Minho...? - Chamou ela baixinho.
  Ele deu um gemido baixo, mas logo seu rosto ficou sem emoção.
  Kathy ficou ali, parada com uma das mãos no rosto do menino, até ter um impulso. Aproximou seu rosto lentamente até ficar bem em frente ao de Minho. A respiração dele varrendo sua face. Com o polegar ela tocou os lábios dele. Eram macios, cheios, e estavam entreabertos. Tão convidativos...
  Se aproximou mais. Estava o mais possível colada a ele. Os dois corpos quase se tornando um. A cintura dela sendo apertada contra a dele. Seus narizes se tocando levemente, as respirações rápidas. Kathy olhava para aqueles lábios vermelhos desejando-os.
  Não podia fazer aquilo, não deveria, mas seu corpo pedia por aquilo. Tantas vezes ela quis...
  Tirou os olhos dos lábios do garoto e encontrou seus olhos puxados abertos. Os dois se encarando, um momento que para ela pareceu uma eternidade.
- O que você pensa que está fazendo? - A voz risonha dele perguntou.
- N-nada - Gaguejou ela. - Vamos sair daqui...
- Já comentei sobre seu dom de mudar de assuntos sutilmente? - Interrompeu Minho com ironia e provocação, enquanto apertava a cintura da menor. Ele havia acordado quando ela o chamou, e tamanha foi sua surpresa ao encontrar a garota o tocando.
- Cale a boca, idiota. - Kathy tentou ficar de pé rapidamente. Os músculos doendo, martelando, por ter ficado tanto tempo (quanto tempo?) parada. Se sentiu cair, fraca, a cabeça zumbido. Tudo girou, e então se viu nos braços de Minho outra vez.
- Vá com calma. - Disse ele sussurrando em seu ouvido.
  Um tremor percorreu a garota e quase o mesmo ocorreu com o menino.
- Me largue! - Ela empurrou.
  Erguendo os braços, ele a soltou.
- Certo, certo - Disse ele escondendo sorrisos e tentando disfarçar sua falta de experiências com relação a mulheres. - E então? O que faremos? - Olhou para fora, através do buraco na parede. O céu estava escuro, e algumas nuvens brilhavam em relâmpagos. Procurou pelo cadáver de antes. Não o encontrou, apenas o lugar onde ele estivera.
  Kathy puxou Minho, agarrando sua panturrilha.
- Tire essa cara feia daí! Quer morrer, idiota!?
  Minho quase deu um grito. Voltou rapidamente e deu um tapa na mão de Kathy, se encolhendo contra a parede.
  A garota olhou para ele desconfiada. Os olhos abertos pela agressão inesperada.
- Minho... O que você está me escondendo? - Disse se aproximando.
- Não estou "escondendo" - Ele fez áspas com as mãos, embora Kathy não pudesse ver aquilo no escuro em que estavam - mértila nenhuma!
- Sei... - Sem pedir, ela tocou a testa dele. Como antes, a pele continuava quente e molhada de suor. - Me deixe ver sua perna.
  Com um revirar de olhos, Minho estendeu a perna que ela havia tocado antes. Kathy pegou o sapato de Minho e desamarrou o cadarço, em seguida levantou a bainha da calça até o meio da canela. Mesmo no escuro, Kathy contemplou um sombreado suspeito.
- Oh, meu Deus... - Ofegou ela baixinho.
- Não é nada. - Dizia Minho tentando puxar a perna.
- Você consegue ficar de pé? - Indagou ela, já colocando a mochila nas costas e se erguendo.
- Claro que sim! - Pôs uma mão no chão e deu o impulso. Não se ergueu. Caiu novamente - Não, não consigo....
- Vem cá - Kathy deu um pequeno sorriso e ofereceu uma das mãos para ele. Já em pé, se apoiando nos ombros da menina, Minho disse:
- Agora vamos procurar meus amigos.
- Claro que não. - Suspirou ela pelo peso e proximidade dele. Tinha uma carga elétrica correndo do moreno para ela. "Kathy, não seja idiota, você não pode..." dizia para si mesma. - O deserto é perigoso de dia. Mas é muito pior de noite. Vamos amanhã. E também eu quero cuidar de você... Digo, de sua perna.
- Não é nada, já disse. Eu tô legal. Podemos ir agora mesmo. - Retrucou ele imediatamente. - Meus amigos precisam de mim.
- Sim, precisam de você bem, você não vai poder fazer nada se estiver morto. Vamos.
- Você diz que não podemos sair, que eu não devo sair, mas diz "vamos". Você está louca?
- Não seja ridículo. - Ela direcionou ele de costas para o buraco na parede. - O segundo andar desse prédio foi todo modificado por mim. Podemos ficar lá até o amanhecer.
  Deram um passo e Kathy parou, o que fez Minho parar também. Os olhos dela perdidos na escuridão à frente. Pensou se estava fazendo algo errado. Tudo estava dando errado. Os Clareanos separados, sua união com Minho, a perna dele...
- Kathy? - Chamou Minho preocupado.
- Hm?... Ah... - Kathy suspirou - Antes de subirmos... - Ela fez uma pausa
- O quê? - Interrogou ele curioso.
  Um sorrisinho dela foi ouvido, como se ela fosse dizer algo idiota. E então ela perguntou:
- Você gosta de Labirintos?

EM REVISÃO • Deserto MortalOnde histórias criam vida. Descubra agora