XIX

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Certo. Eu não deveria ter acordado. Deveria ter dormido mais umas duas ou três horas. Não faria mal a ninguém. Eu conseguiria evitar a briga e meus novos machucados. Teria conseguido evitar aquele sentimento pesado que eu sentia. Mas como eu ia saber? Eu realmente deveria virar uma vidente e evitar minhas burradas na vida. Entretanto, eu não sabia. Não evitei.

Acordei depois de cinco horas com o corpo dolorido. O cinto de segurança havia feito marca no meu rosto e a faixa da minha perna estava bem úmida de sangue. Eu tinha que refazer o curativo até aquilo cicatrizar. Paramos o carro na beira da floresta e descemos. Eu não queria parar a viagem, mas sabia que nem todos ali estavam acostumados com longas horas dentro de um carro. Então paramos para descansar. Não era a viagem que esperava. Estava sendo mais estressante do que divertida. Juntamos alguns gravetos do chão e fizemos uma fogueira. O clima aqueceu e até que ficou agradável. Thomas decidiu ficar no carro. Não contrariei, já que era o que queria. Eu encostei no carro, observando as chamas. Mason ficou do meu lado, passando seus braços pela minha cintura. Comemos e começamos conversar por um tempo, com a intensão de nos distrair um pouco.

Assim que a lua ficou alta no céu, anunciei que seria melhor apagar a fogueira e voltar para a estrada. Mason e Henry começou a chutar um pouco de terra para acabar com o fogo. Branca de Neve foi a primeira a ir na direção do carro. Vi o exato momento em que ela se desequilibrou e caiu no chão. Fui na sua direção. Era só o que me faltava! Ela se machucar também.
-Ei, você está bem?- perguntei, oferecendo minha mão para que levantasse.
-Por que você fez isso comigo, Alexa? O que eu te fiz?- perguntou ela gritando.
-Oi?- perguntei , totalmente confusa.
- O que foi?- questionou Mason se aproximando.
- Alexa me empurrou e eu cai. Meu tornozelo está doendo.- resmungou a princesa.
-O que? Mas...- comecei a me defender, sem saber como ou se deveria.
-Lexy, você fez isso?- perguntou Mason novamente, segurando firme no meu braço.
-Ai! Está me machucando. - respondi, tentando puxar meu membro. Ele ia cortar meu fluxo sanguíneo daquele jeito.
-Alexa, responda-me!- pediu ele, desta vez elevando o tom de voz.

Consegui livrar meu braço e o olhei espantada. Ele.. ele.. não mesmo!
- Você não está achando que ...- e ai eu vi dúvida em seu olhar.- Eu não estou acreditando nisso! Não! Quer saber, se é isso que acha, então fique com a merda da sua opinião!

Comecei a ir em direção da floresta.
-Para onde está indo?- perguntou ele, gritando.
-Isso não te importa! Na verdade, nada importa. Vai ver como ela está e esqueça que eu existo!- gritei em resposta e corri entre as árvores.

Senti as lágrimas escorrerem pelas minhas bochechas, mas não diminui a velocidade. Eu precisava me afastar o mais rápido possível. Precisava estar longe. Ai, você me pergunta: mas, Alexa, você não estava com a perna machucada? Como estava conseguindo correr? Sim, eu estava. A dor da minha perna era bem mais suportável do que a que eu carregava comigo. Como ele pode? Eu jamais faria aquilo! A raiva subiu pelo meu corpo e acabou servindo de combustível para que eu ignorasse a dor da minha perna, fazendo-me correr mais. Eu não conseguia acreditar naquilo! Meu Deus, como eu estava indignada e no momento tão triste. Eu deveria ter visto aquela maldita raiz no chão, mas não vi. Cai com tudo. Isso deu mais impulso as minhas lágrimas, fazendo-me chorar mais. Meu braço ardia no local onde havia apertado, assim como meus joelhos. Eu tinha ralado eles. Pude senti isso assim que caí na terra. Minhas mãos também tinham pequenas perfurações, devido as pedras do chão. Aquilo foi demais para mim. Juntei meus braços à minha frente e apoiei a cabeça neles, liberando a passagem livre das lágrimas. Nada mais me importava. Eu me sentia uma criança caída ali, chorando tanto a ponto de soluçar. Eu estava quase chamando minha mãe, como sempre fiz em situações de total desespero. Mas ela não poderia mais me ajudar. E isso doeu também. Minha cabeça latejava. Quanto tempo levaria para eu morrer ali? 5 dias? Não, levando em conta as lágrimas que desperdicei, levaria no máximo dois dias, por conta da desidratação. Tudo bem. Eu poderia ficar ali no chão quietinha, esperando minha morte chegar. Não ia demorar mesmo.

Senti braços me tirarem do chão, envolvendo-me em um abraço reconfortante.
-Para de chorar, Alexa.- pediu Thomas.
-Ele gritou comigo.- retruquei, entre soluços.
-Eu sei. Eu ouvi. Vocês dois até parecem duas crianças. - resmungou ele, ajeitando-me em seus braços.
-Dá para me devolver no chão? Está estragando meu plano de morrer. - pedi, limpando as lágrimas que insistiam em cair.
-Não dá. - e me colocou sentada em um tronco. - Como se senti?
-Como a maior merda do mundo.- respondi, abaixando a cabeça. Vi o sangue escorrer pelo rasgado nos joelhos. Como se eu precisasse de mais ferimentos.

Thomas se sentou no tronco e suspirou. Virei na sua direção e perguntei:
-Você também acredita que eu a derrubei?
-Não. Nem suas brincadeiras mais infantis chegaram a esse ponto. Ainda mais estando armada. Se estivesse de saco cheio com a princesa, atiraria nela, em vez de apenas empurrar.- respondeu ele.
-Exatamente.- concordei, voltando minha atenção aos meus joelhos.
-Eu posso te contar um segredo?- perguntou ele.
-Acho que pode.- exclamei.
-Sabe o número que te dei? Aquele do cartão?- questionou novamente.
-Sei.- confessei, pegando meu celular nas mãos sujas de terra e sangue.
-Então, só você tem esse número. É uma linha única. Se alguém me ligar neste celular, saberei que será você.- contou ele, mostrando-me seu aparelho.

Por curiosidade, achei seu número na minha lista de contatos e liguei. Um luz verde se acedeu em seu celular e me surpreendi. Ele colocou o aparelho na minha outra mão e eu os observei por um bom momento.
- Por isso, quando precisar, não pense duas vezes em ligar.- falou ele, sério.
- Obrigada.- respondi, segurando forte os dois aparelhos.- Então, somos amigos?
-Sim, Alexa. Somos amigos. - disse ele,desta vez sorrindo.
-Legal.- exclamei de volta.
-Em uma batalha, sempre é bom ter fortes aliados.- respondeu ele.
-Eu não quero estar em uma batalha.- retruquei.
-Ninguém quer, mas ás vezes, algumas são necessárias.- contra-atacou ele.

De repente, um barulho me chamou a atenção e levantei a cabeça. Mason estava ali, parado como um poste. Fechei a cara, brava.
-Posso falar com ela a sós?- perguntou ele.
-Claro. Eu vou deixar vocês conversar. - disse Thomas e começou a se afastar.

-Thomas!- chamei-o e joguei seu celular no ar, rezando para que conseguisse pegá-lo antes que caísse no chão.

Ele sorriu ao pegar o aparelho e sumiu entra vegetação. Respirei fundo.
-O que você quer?- perguntei a ele.
-Pedir desculpas.- respondeu ele, se aproximando de mim.

Senti-me ser puxada do meu banco natural e ser envolvida em um abraço quente. Não resisti e joguei meus braços ao seu redor.
-Desculpe-me, Lexy. Eu sinto muito por ter gritado com você e eu jamais quis te acusar daquilo. Sei que não foi você. É a minha Lexy e nunca faria isso.- disse ele, no meu ouvido.

Fiquei muda, apenas escutando.
-Se fosse para fazer algo, você teria feito algo que causaria um dano maior e não teria negado. Você sempre faz isso. Igual quando colocou sal no meu suco ou quando achou uma caneta no seu quarto enquanto eu dormia e decidiu desenhar. De novo.- continuou ele.

Soltei um riso. Aquilo tinha sido muito legal de se fazer. Eu acho que esse era meu passatempo favorito: perturbar o Mason. E isso pareceu nunca estressa-lo ou deixá-lo bravo. No final de tudo, sentávamos e riamos.
-Você vai me perdoar?- perguntou ele.
-Ainda não sei.-respondi.
-Tudo bem. Não importa. Eu te amo e quero que saiba disso.- exclamou ele.
-Eu também te amo, mas a próxima vez que gritar comigo, eu vou te socar.- ameacei-o.
-Não vai ter próxima.- respondeu, abraçando-me mais forte.

Enrolei meus dedos em seu cabelo, puxando-o para beijá-lo. Ele segurou firme na minha cintura e grudou nossos lábios. Naquele momento tudo voltou a ficar bem novamente. Para mim, era impossível ficar brava com ele. Nossas brigas não duravam muito. Senti sua mão entrar dentro da minha blusa, aperta minhas costas. Separei-nos devagar e o vi sorrir.
-Estamos bem?- perguntou ele.
-Não. Você continua sendo um idiota. E ainda estou brava com você.- e sai indo na direção o carro.

Ele deu uma corrida e parou do meu lado, para me acompanhar. Ele entrelaçou nossos dedos e o olhei por um momento, percebendo o sorriso bobo que carregava na cara. E assim caminhamos na direção da van.

The Cursed HeartOnde histórias criam vida. Descubra agora