Coexistindo

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                Depois do que aconteceu no primeiro treino de basquete, eu fiquei com ódio do Eduardo. Ódio da forma como ele falou comigo. Ódio dele se exibindo para aquelas assanhadas da seleção. Ódio do quanto ele é bom no basquete, o que não faz o menor sentido, porque ele disse que estava na escolinha para aprender... Para aprender a pegar as piriguetes do primeiro ano, só se for! Assim, na sala de aula, as coisas só ficaram mais tensas entre nós dois, nas semanas seguintes: quando não ignorávamos um ao outro, falávamos mal. Até os professores já tinham percebido, porque viviam querendo que a gente fizesse parte do mesmo grupo – não sei que mania besta é essa desse povo de querer organizar as equipes com base no número da chamada... Desse jeito, a gente sempre fica juntos, porque ele é o 9 e eu sou o 10. Bem que entre Eduardo e Fernanda poderia ter, sei lá, um Emanuel, um Fábio... Mas, não...
               No primeiro trabalho, a gente conseguiu resolver esse problema, porque era o do professor de Inglês, o Tadeu. Meu Deus, ele é muito lesado! Os meninos vivem fazendo aquela piada do "tá deu ou tá dando, professor?", e ele não diz nada, acha é graça! Como pode? Acho que ele nem entende o que os meninos estão querendo dizer com isso, porque, para acabar de completar, o homem parece que é meio mongol... Sei lá o que é aquilo... Tudo pode na aula dele. Aliás, não sei nem se aquilo é aula, sinceridade. Um dia, um colega lá da sala, o J.J. (José Juarez... ninguém merece!), depois que o Tadeu pediu para a gente fazer silêncio porque a diretora estava na sala ao lado, subiu foi em cima da mesa dele e dançou um funk aí, enquanto o povo batia palma, um absurdo! Pergunta o que o Tadeu fez... Nadinha! Ficou foi vermelho, fumaçando, olhando para a porta, vendo se a diretora não vinha, mas não fez nada. Pensei que ele ia chorar. Parece que tem é medo dos meninos, o coitado. Por pouco a diretora não pega o J.J. ralando o tcheco na mesa.
                Pois o homem, simplesmente porque a galera disse que não queria fazer prova, inventou de passar esse trabalho, em que cada grupo deveria aprender uma letra de música em inglês e cantar lá na frente.

                – Do número 1 ao 5, pessoal, é a primeira equipe, tá?

                – Ave Maria, Tadando! Tem que cantar em inglês?

                – Claro... É a minha matéria...

                – Mas, se rolar um portunhol tu aceita, né? – eu é que não duvido...

                – Do número 6 ao 10, é a outra, e assim por diante, de 5 em 5. Entenderam?

                Eu olhei para um lado... Olhei para o outro... O Eduardo estava escrevendo alguma coisa no caderno, não se manifestou. Eu criei coragem e fui falar com o professor, achando que ia ser uma dificuldade burlar o esquema de equipe dele.

                – Tadeu, sabe o que é? É que eu, o João e a Sofia sempre fazemos trabalho juntos, porque...

                – Pois, façam vocês mesmos as equipes, é melhor!

                Hilário esse cara, não é? Não...

                Mas, quando o trabalho foi de Física, aí não teve negociação. Se com o Tadeu, a gente fazia tudo que queria, com o Gildo, nossa!, ele só deixava a gente respirar porque enfim ninguém nunca pediu permissão para fazer isso... Pense num sujeito mal encarado! O ar parece que congela ao redor do homem. Uma coisa que sempre me intrigou é o nome dele, Gildo... Não parece um apelido? O nome dele deve ser Hermenegildo ou Astrogildo, sei lá! Mas, ao mesmo tempo, eu não consigo acreditar que ele deixe a gente chamá-lo por um apelido... Eu acho que é Gildo mesmo. Aliás, pelo jeitão que ele tem, se o nome dele fosse Astrohermenegildo, era capaz de a gente ter que o chamar assim mesmo.

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