Maglun e Efer

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    Visto a roupa que está em uma mochila que Boris deixou ao pé da cama, dou uma última olhada em meu pai e saio do quarto atravessando a porta branca de mola que volta depois de passar.
    O corredor é longo e com o chão liso e escorregadio, a parede esquerda possui três janelas devidamente separadas, todas as coisas brancas, tanto por fora como por dentro, algumas mesinhas enfeitam o local com vasos brancos cheios de água, não sei pra que servem porém não questiono.
    Atravesso outra porta como aquela, ela me leva pra uma sala cheia de cadeiras brancas e um balcão da mesma cor com alguém atrás dela. Uma mulher ruiva com os olhos castanho claro, ela usa roupas brancas e parece mexer em alguma máquina estranha que produz coisas em uma tela.
    Ela mexe na máquina sem olhar para nada além da tela, algumas pessoas ocupam as cadeiras brancas enfileiradas no centro, elas tossem e não parecem muito bem, a sala retangular habita também alguns cartazes de coisas como, corpo de um ser humano, órgãos, cérebro e coisas do tipo.
    Chego no balcão e vejo que ela programa algo sem parar, é um computador, ou parece ser um, como sei disso? Tudo que sei li em livros da biblioteca, a poeira nunca me impediu de aprender mais.
    — Olá?
    — Olá. — responde ela sem olhar para mim.
    — Sabe como sair deste lugar? — pergunto.
    — Por aquela porta. — fala ela apontando para uma porta a esquerda.
    — Ahn me desculpe mas sabe aonde encontro o rei?
    — Ele provavelmente está no salão central, o salão do trono. — reponde ela. — fica não tão longe daqui.
    — Aonde mais ou menos?
    — No centro da cidade, é só pegar alguma dessas ruas que ela vai te levar para lá.
    — Obrigado. — agradeço.
    Ela fica quieta depois disso.
    Passo por algumas pessoas até chegar a porta, a tranca estala atrás de mim quando passo pela porta branca recém pintada, o ar puro entra em meus pulmões passando uma paz anormal pra mim.
    A rua é feita apenas de um caminho sem grama, olho para trás e vejo que o lugar de onde acabei de sair se chama hospital, o nome chama atenção com uma cruz vermelha no "t".
    Caminho pela terra úmida da cidade com meu tênis all star preto agitando a terra, árvores balançam em um ritmo único deixando-me encantado, nunca havia visto uma árvore nem nada disso a não ser pelos livros, o chafariz deve ser o centro as ruas levam direto a ele.
    O sol sobe no céu deixando rastros de nuvens desenhadas como giz de cera que um dia os exploradores trouxeram daqui de fora. A vida não era a melhor mas as pessoas tornavam tudo mais mágico, minha mãe estava sempre fazendo coisas para mim como se nada tivesse acontecido, a sua felicidade era contagiante, acho que bem lá no fundo ela sabia que meu pai estava vivo mesmo depois de ter ido ao seu enterro sem chorar uma lágrima.
    George gostava das mesmas coisas que eu, ele teria um futuro bom mineira do com seu pai, ele era meu melhor amigo, as coisas eram mais fáceis com todas aquelas pessoas boas.
    Vejo Amie sentada em um banco da praça comendo algum tipo de pão estranho, ela parece triste ou apenas calada como sempre. Me aproximo com a mochila leve como uma pena nas costas e sento-me ao seu lado.
    — Tudo bem? — pergunto.
    — Ah oi Aiden, tudo. — responde ela com sua voz gentil um pouco envergonhada.
    — Por que está aí tão quieta e não está se divertindo?
    — Fica um pouco difícil se divertir com o mundo acabando a sua volta. — fala ela.
    — Não precisa pensar no mundo se acabando quando tudo que você vê é cor e felicidade.
    — Mas e todas aquelas pessoas morrendo lá fora?
    — Precisa de um descanso, você não é de ferro. — falo suavemente.
    — Tem razão.
    — Eu sei que é difícil esquecer tudo aquilo mas se ficar persistindo na dor você nunca será feliz, pessoas felizes vivem mais. — fala sorrindo.
    Seu cabelo ondulado e castanho cai sobre seus olhos escondendo todo o azul que ali estava.
    — Mas não tenho motivos para viver. — fala ela olhando para baixo.
    — Eu me importo com você, quero que seu coração continue batendo e deixando o meu louco quando você chega perto, a vida não é boa mas se você achar com quem compartilha-la tenho certeza que vai valer a pena cada respiração. — falo levantando seu queixo com o dedo indicador e retiro seu cabelo dos olhos com a outra mão.
    Amie olha nos meus olhos e posso ver todo o azul que me derrete por dentro, permaneço firme para não deixar seu olhar me afetar, sua boca pequena e avermelhada parece feita de sangue, como um desenho de coração que vi desenhado em um dos livros da biblioteca, sua boca chama a minha e puxo suavemente seu corpo para o meu e nossos olhos se fecham ao mesmo tempo em um beijo único e demorado, todos ao redor somem na minha mente deixando meu coração falar mais alto que todo o barulho em volta.
    — Ahn Aiden? — Grump interrompe o beijo com sua voz calma e paciente.
    Nossas bocas se separam quebrando  o clima, Grump nos olha como se tivéssemos feito algo de errado depois olha para os lados e fica vermelho.
    — Ahn obrigado por me animar, tenho que ir, tchau. — fala Amie sorrindo.
    — Ttudo bem. — falo gaguejando um pouco. — tchau.
    Amie pega sua bolsa e sai rindo, Grump permanece vermelho.
    — Ooi Grump.
    — Ahn desculpa ter atrapalhado seu primeiro beijo hahahaha. — Grump ri sem parar enquanto olho de cara feia pra ele.
    — Não é meu primeiro beijo. — falo.
    — A não? — pergunta ele. — Sua mãe não conta Aiden.
    — Eu eu... Okay foi o meu primeiro beijo, feliz?
    — O rei está te esperando no salão central. — fala ele secando os olhos. — vem comigo.
    Sigo Grump que beira a fonte entrando em um salão escrito Moriarte em uma cor parecida com ouro, a porta é de vidro e ela corre para o lado sem produzir som.
    O salão é grande e cheio de colunas, algumas bandeiras estiradas nas paredes e um trono onde está o rei. Um tapete vermelho se estende da entrada até o trono, o resto da sala está vazio.
    — Bom te ver Aiden. — fala o rei.
    — Bom te ver também rei. — falo.
    — Suponho que precise de respostas. — fala o rei.
    — Sim.
    — Então, vou começar do começo, meu bisavô estava preso nesse mundo sombrio e sem vida, a batalha pela sobrevivência lhe custou muitos homens, depois de tanto procurar por algum tipo de vida ele achou Thamory em meio aos destroços, um livro velho e grosso se escondia debaixo dela, suas palavras eram em dialetos antigos, o rei não entendia o que diziam e colocou-o na mochila junto com a espada, as coisas mudaram daí por diante, as sombras surgiam como água brotando da pedra, o rei corria grande perigo com aquela espada em mãos, ele se cansou disso e decidiu levar o livro ao antigo ancião que morava no alto da colina, o ancião conhecia a língua e esplicou-a ao rei, "A espada se chama Thamory, ela é um dos objetos sagrados dos cinco feiticeiros do infinito, os objetos estão espalhados pelo mundo a procura de alguém que mereça tal honra, a espada de Phantom, o escudo de Ghameth, o machado de Tridan, o bastão de Lian e o arco de Diane são os cinco objetos sagrados que possuem poderes extraordinários." O rei a encontrou portanto ele era o escolhido, a paz reinaria no mundo novamente como dizia a profecia, mas ele estava errado, um dia enquanto descansava em seu reino Lucius o servo de Zafir roubou a espada para seu mestre, o rei acordou e percebeu o que havia acontecido, ele talvez não fosse o escolhido mas precisava proteger o seu povo então pediu aos deuses que o ajudassem, a sua procura por algo que talvez o ajudasse terminou no dia seguinte, ele achou a pedra de Efer, a pedra da paz, a pedra da luz e da bondade. Ele a achou em uma caverna protegida por armadilhas, ele a colocou no centro do reino na estátua de Elise sua esposa falecida, a vida retornou a este lugar depois disso, o sol voltou a aparecer e  a grama cresceu novamente, a nossa água ficou mais limpa que o normal e o povo teve sua paz de volta.
    — Me desculpe interromper mas quem é Efer? — pergunto. Minha voz ecoa pelo salão me deixando um pouco tímido.
    — Maglun e Efer, os irmãos do equilíbrio. — fala uma voz de trás de uma das bandeiras próximas ao trono.
    Uma sombra familiar retira a bandeira do caminho e revela sua identidade, é o velho louco que vi na cidade de baixo.
    — Você?
    — Bom te ver também. — fala ele.
    — Como sobreviveu?
    — Do mesmo jeito que você, eu corri. — responde ele.
    — Quem é você? — pergunto.
    — Ah me desculpe não me apresentei, sou Gale.
    — Por que v...
    — Maglun e Efer eram irmãos gêmeos que eram completamente opostos, Maglun era malvado, sombrio e destruía tudo ao seu redor, Efer era bondoso, amigável e trazia paz as pessoas que o conheciam. Eles tinham amuletos, o amuleto de Maglun era escuro, ou roxo como você pôde ver, já o de Efer era cristalino quase branco mas transparente, os dois eram muito diferentes mas traziam equilíbrio ao mundo, seus amuletos eram poderosos mas os dois sobreviviam com eles juntos, antes mesmo de o mundo ficar assim, é claro que já depois de muitas guerras mas mesmo assim ainda era bom. Maglun era muito odiado por ser tão mau mas Efer sempre protegia o irmão, um dia o povo de uma vila próxima a casa dos irmãos se cansaram das guerras e mortes causadas por Maglun e foram atrás dele com tochas e tridentes, Efer tentou acalmar o povo mas o povo em sua fúria acabou matando Efer, depois foram atrás de Maglun e o mataram também. Depois de roubarem seus pertences um fazendeiro que viu o amuleto de Maglun o achou bonito e pegou-o, todo o mau de dentro da pedra se voltou contra o povo da vila transformando todos em meras sombras malignas, que evocaram Zafir o rei das sombras e senhor da escuridão e seu servo Lucius que governaria depois. Eles possuíam então, a pedra de Maglun e transformou muitos em sombras mas nenhuma dessas sombras ou mesmo pessoas poderiam tocar na pedra de Efer, ela emanava um poder tão bom e brilhante que um só toque já destruiria qualquer um.
    — Então foi assim que o mundo acabou desse jeito. — falo. — mas como o rei então pegou a pedra de Efer?
    — Ele não a tocou, usou uma luva. — fala Gale.
    — Por que acham que eu sou o escolhido?
    — Você é o único a tocar na pedra de Maglun e continuar como humano e continuar respirando. — fala o rei.
    — Então, não tenho dúvidas de que é sobre você a profecia, senhor Aiden. — fala o rei se ajoelhando perante mim com a espada em suas mãos.
   

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