Só para se juntar à monotonia, estava mais um daqueles dias gelados e ventosos que abanam todas as árvores da rua, levantam saias e revoltam cabelos impedindo-os de ficaram mais de cinco segundos decentes na posição escolhida. Encostei a testa ao frio vidro do meu quarto apenas para observar a janela do andar de cima, da casa em frente aberta, a cama vazia e a ausência do carro de Joey. Outro dia a madrugar com o trabalho, suponho.
Deixei-me andar nas minhas legguings cinza e na minha larga blusa rosa clara, hoje não era dia de me preocupar em arranjar, hoje era dia de ficar por casa a dormitar pelos cantos embrulhada em qualquer coisa quente.
- Saac, por favor, atende, é a mãe. – choramingo sentando-me na sua cama como se aqui fosse ele o adulto e eu a criança.
Entrego-lhe o meu telemóvel que como prometido tocava passado meros minutos. Ele como sempre fez-me uma cara preguiçosa, espreguiça-se primeiro e depois como já é hábito seu, atende.
- Olá mamã... - fala tentando demonstrar um ar desperto.
- Oh, olá pequeno. Liguei apenas para saber se está tudo bem. – sim, claro, o normal. Às vezes chego a pensar que ela tem alguma espécie de gravador no seu telemóvel que todos os dias à hora certa liga para o meu repetindo as mesmas palavras. - A tua irmã?
- A mana está-me a fazer cereais. – responde falsamente alegre. – E eu estou cheio de fome, por isso vou comer, está bem?
- Está bem meu querido, beijinho e porta-te bem, não dês muito trabalho à tua irmã.
- Está bem mamã, eu porto-me bem, beijinho! – responde o mais amorosamente que consegue, acreditando tanto nas suas palavras quanto eu.
Assim que a chamada se desliga ambos atiramos-nos para trás tentando arranjar uma posição confortável para voltar a adormecer. É sempre bom ter um irmão que coopera connosco.
Nem dez minutos se passaram para ambos despertar-mos com um estridente barulho no andar de baixo.
Ahgr, a sério mãe?!
Levantei-me em passos aborrecidos até chegar à cozinha e encontrar o maldito relógio de corda antigo que saltitava em cima da bancada como uma pipoca prestes a estourar.
"Agora sim, prepara o pequeno-almoço ao teu irmão. Amo-vos.", diz uma pequena nota colada no mesmo.
Eu disse, eu disse que ela sabia sempre de tudo! Ordena Isaac para não me dar muito trabalho, mas no final de contas quem me o dá é ela. Mãe chata. Sinto falta dos seus dias de folga, das suas mini férias que os deixavam passar mais algum tempo connosco. Tenho saudades disso, de mais tempo passado em família e sei que isso afecta em dobro a minha pequena peste, basicamente sou mãe e pai de um menino de seis anos a tempo quase inteiro, se é que sinto que tenho o mundo para lhe retribuir por ter tornado o meu num lugar muito melhor, por ter dado tanto amor ao meu coração.
Esperava por que as minhas torradas saíssem e a tigela de leite aquecesse, basicamente esticada no balcão com a cara apoiada e esborrachada entre a mãos, quando um par de talheres escorrega no lava loiça fazendo-me sobressaltar e endireitar suspirando de seguida, estou tão dormente, meu Deus, sinto quase como se tivesse feito uma enorme e dolorosa direta.
Eu odeio acordar cedo, sinto mesmo que não fui feita para isso e considero isso a pior invenção de todos os tempos. Acordar cedo dói.
- Mana? – chama de onde me pareceu ser a sala.
- Estou aqui na cozinha. – respondo por entre um bocejo que quase me desencaixou o maxilar.
- Mana está frio, porque é que tens a porta aberta? – ele pergunta após aparecer e parar na ombreira com os pequenos braços a agarrarem o seu próprio corpo enquanto o seu queixo treme.
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Fallen
ParanormalUm romance cheio de mistério, suspense, drama, criado principalmente para quem gosta de histórias emocionantes com fins imprevisíveis. "A sua única preocupação era conseguir ver o bonito sorriso dele a qualquer altura do seu dia. Haveria crianças ma...