Capítulo 25 - "Até ao fim."

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- Feliz? – Perguntei ao encontrá-lo junto da sala.

Um nó enorme estava instalado na minha garganta e a dificuldade em falar era mais que óbvia. Era como se cada vez que tentasse articular fosse o que fosse, o coração fosse sair-me pela boca ou os meus pulmões fossem pisados repetidamente, deixando-me com uma sensação de sofreguidão insuportável.

- Tu és um homem, filho. Orgulha-te disso.

- Porque é que amar outro homem me torna menos homem? – Perguntei já com algumas lágrimas próximas dos meus olhos, que me vi obrigado a retrair.

- Não digas parvoíces. Tu não amas outro homem coisa nenhuma. – Ele disse, continuando a passar os canais na televisão à sua frente. – Diz-me.

- O quê?

- Quero ouvir-te dizê-lo. Tens de dizê-lo, tens de esquecer essas idiotices de crianças perdidas que não sabem o que fazer da vida. Tens de estudar Niall, não andar aí a fazer experiências.

Mantive-me em silêncio e uma das minhas lágrimas acabou por escorrer silenciosamente pela minha face. Cerrei os maxilares e inspirei fundo tentando manter-me concentrado.

- Eu não amo outro homem.

As palavras atuaram como um boomerang, acertando-me com toda a força de imediato, fazendo-me até estremecer com o quanto magoava dizer aquilo.

- Sentes alguma coisa?

- Não.

- Alguma vez vais sentir?

Eu parei e tive de enfrentar o olhar expectante do meu pai que se focou em mim devido à demora por minha parte.

- Nunca.

- E porquê?

Voltei a inspirar fundo mas quando ia falar as palavras quebraram já na minha boca.

- Porque sou um homem e homens devem estar com mulheres.

- Exato. Agora vai estudar.

Eu apenas assenti e virei costas, arrastando a minha mochila pelas escadas até poder finalmente trancar-me no quarto tendo vontade de nunca mais de lá sair.

Atirei a mochila contra a parede com todas as minhas forças e agarrei uma das almofadas espalhadas pela minha cama. Cerrei as minhas unhas curtas na mesma e enterrei a minha cara nela para poder soltar um grito de raiva que rasgou a minha garganta. Depois gritei mais uma vez... E outra... E outra... Até deixar cair a almofada levemente no chão, juntamente com o meu corpo que escorregou encostado à parede atrás de mim. As lágrimas rolavam interminavelmente pelo meu rosto deixando os meus olhos a arder imensamente, realçando o azul predominante neles. Soluços caíram dos meus lábios, sendo rapidamente abafados pelos meus braços que eu mantinha em volta das pernas fletidas. A minha testa apoiada nos meus joelhos. Queria apenas tornar-me tão pequeno quanto possível. O suficiente para me esconder e ninguém dar pela minha falta. Queria o Greg e os seus concelhos, o seu apoio e as suas palavras sábias. Eu sei que ele provavelmente concordaria com o pai. Um homem é um homem. Não há meias medidas.

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Acordei de um sono profundo e sentia os olhos inchados. Imagens rápidas da conversa que tivera com o meu pai passaram em passo de corrida pela minha mente e deixaram-me atordoado. Levantei-me do chão gelado e olhei para as minhas mãos – Estavam roxas de frio, todo o meu corpo tremia e eu não entendia porquê todo aquele frio repentinamente mas sentia-me como se fosse desfalecer. Tanto de frio como de dor.

Entrei na casa-de-banho e olhei-me ao espelho. Já poucas borbulhas invadiam o meu rosto e a barba começava a aparecer no fundo do meu rosto, emoldurando-o. Marcando o início de uma nova fase da minha vida. Eu tinha de me tornar um homem. Era meu dever deixar a minha família orgulhosa, mesmo que isso implicasse ter de me sacrificar.

Voltei ao quarto e quando lá cheguei o meu coração parou.

- O que raio estás aqui a fazer? Estás louco? Vai-te embora. – Ordenei mantendo a distância dele. – Harry se o meu pai souber que estás aqui vai matar-te. Tens de ir ago-

Harry agarrou-me com força e envolveu-me num abraço apertado, estreitando-me nos seus braços fortes. Agarrei a sua t-shirt com toda a minha força e as pontas dos meus dedos subiram pelas suas costas até alcançarem o topo dos seus ombros onde repousaram, tentando puxá-lo para ficar mais baixo e facilmente alcançável. Nesse momento todas as lágrimas que restavam caíram irremediavelmente, encharcando a base do pescoço de Harry onde a minha face assentava. Apertei-o com mais força e alguns soluços saíram, sendo que a cada um ele apenas passava uma das suas mãos pelas minhas costas, reconfortando-me.

- Eu vou estar aqui. Mesmo quando me empurrares para longe – Harry sussurrou junto do meu ouvido na sua voz rouca que se arrastava pela sua garganta. – Quando gritares comigo. Quando me rejeitares, evitares e fugires... Eu vou estar aqui – Harry parou por segundos e inspirou fundo. – Até ao fim.

Sequei as lágrimas o melhor possível já com um sorriso no meu rosto que permanecia escondido junto da pele do seu pescoço. Afastei-me lentamente e fiquei em silêncio.

- Nossa – Disse pausando de seguida. – Que cliché.

Harry começou a rir de imediato e voltou a abraçar-me assim como eu que não consegui conter os risos dentro de mim prontos para se deixarem contagiar pela despreocupação e tranquilidade de Harry.

- Será possível que algo que eu diga te agrade? – Ele perguntou afastando-se mais uma vez.

Eu apenas encolhi os ombros com um sorriso e ele riu abanando a cabeça.

- Amigos? – Ele perguntou ainda com um sorriso deslumbrante espalhado pela rosto e eu olhei para a sua mão esticada na minha direção.

- Amigos. – Apertei a sua mão e sorri de volta. – Mas agora tens mesmo de sair daqui. – Disse perdendo o meu sorriso e Harry riu e endireitou as costas o máximo possível, fazendo sinal de continência de seguida.

- É para já senhor. – Disse marchando para fora do quarto e eu ri, acompanhando-o até à porta para que tivesse a certeza de que ele não seria apanhado pelo meu pai.

- Depois falamos, fica bem. – Disse agarrando a porta e preparei-me para a fechar.

- Claro. – Harry sorriu e acenou mais uma vez antes de se virar e correr rua fora até sua chegar à sua casa para onde desapareceu.

Inspirei fundo e um sorriso continuava a decorar a minha face. Sentia-me agora quente e as minhas mãos tinham voltado à sua cor original. Um sorriso estava espalhado pela minha cara e eu não conseguia arranca-lo nem por nada.


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