A morte não escolhe tempo

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      Era quarta feira, dia 11 de junho, um dia depois do aniversário de Angel, ela já tinha 6 anos e estava na 2° série, os dreads quase tocavam seus joelhos, sempre presos em tranças gigantes, eu estava terminando o almoço, ela entrou pela porta da frente correndo, largou a bolsa no chão e correu para mim, me deu um beijo demorado e disse " te amo mamãe " em 4 línguas diferentes, recentemente ela aprenderá alemão. Eu amava isso dela, ela saiu saltitando pela cozinha, tirando a farda e ficando apenas de calcinha,  a trança de dreads cobrindo suas costas e bum bum, abriu a geladeira, pegou um suco de caixinha e me disse " estou no quarto mãe. " e eu disse " tudo bem, faça a lição de casa, depois desça para comer", ela saiu correndo, subindo a escada de dois em dois degraus, eu sorri e me virei para a pia onde eu lavava o restante dos legumes,  enquanto eu raspava a casca da cenoura, senti uma dor aguda em meu peito, a visão falhando, quis chamar por Angel, mas de minha garganta não saia nada além de gemidos, espasmos tomaram conta de meu corpo, eu sentia a dor irradiar para minha cabeça, peito e cabeça queimando. Eu não fazia a menor idéia do motivo disso, eu  nem tomava chá dos sonhos com frequência,  minhas pernas sem força me levaram ao chão, a faca caiu, a cenoura caiu e eu também, minha visão foi diminuindo enquanto os espasmos tomavam conta de mim, vi Angel descer as escadas correndo em minha direção, antes de chegar em mim virou a esquerda e voltou com um telefone, e eu apaguei.

      Acordei 3 dias depois numa UTI,  passei a mão pelos cabelos, e um lado de minha cabeça estava raspado e enfaixado, Thiago entrou no quarto e começou a me explicar tudo.
     Angel ligara para a emergência e graças a Deus eles não demoraram a vir, eu havia passado por um cirurgia na cabeça, eu tinha câncer,  apenas dois tumores, o do cérebro fora retirado, mas ainda havia um em cima do meu pulmão, perto demais do meu coração, não era grande, mas era muito arriscado para uma cirurgia, optaram por quimioterapia,  não decorei o nome do meu câncer, mas pouco importa, o que importa é que eu estava morrendo, e minha filha, meu anjo havia salvado minha vida por enquanto.
     Angel entrou no quarto, seus olhos vermelhos de tanto chorar, nesse momento como eu queria voltar no tempo,  voltar àquela praia, ao meu lugar, onde todos nós éramos saudáveis ..... ela ficou comigo até dormir, Thiago a levou, eu estava com 31 anos ..... nova demais para morrer, Thiago tinha 33 e Angel tinha 6, todos jovens demais. Lembrei de minha própria mãe, no dia do acidente :

   Eu com apenas 16 anos, ela implorou para que eu fosse com eles até o sitio de minha avó,  mas eu tinha uma festa para ir, minha irmã não estava na cidade, tinha ido num show com uns amigos, eu disse não para ela, deixei que eles fossem sozinhos, e todos os dois morreram.... eu devia ter morrido, mas então, aquele anjo não existiria, Thiago precisava desse anjo em sua vida.
     Eu não podia deixar meu anjo sem mãe, por que viver sem a minha foi mais difícil que viver faltando um dos pulmões, reuni minhas forças para mais uns meses ao seu lado.

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