PIANO

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       Era muito tarde quando Alec chegou em casa. Ele acabou indo à um coquetel por que o cliente o aguardava lá. O negócio era importante. Pelo menos foi o que Julius berrou ao telefone.

    Entrou em casa e sentiu algo estranho no ar. Ou melhor,ouviu algo que lhe soou estranho, e logo depois,familiar... E logo depois... Piano?!

     Mas,quem estava tocando?
     Alec correu pelas escadas. Quem ousava tocar aquele piano? Como haviam encontrado o piano? Havia deixado bem claro à todos os empregados,ninguém tocava naquele piano. Nunca! Não!Não! O piano dela não! Ninguém toca no piano dela!

     Ele invadiu a biblioteca e lá estava ela. Margoth. E estava tocando. Tocando Beethoven. Tocando Fur elise, de Beethoven.
     Todos os berros que ele planejava despejar se foram ao chão,ao vê-la alí. Sentada ao piano,tocando com perfeição aquele solo. Se movia concentradamente,e parecia sentir cada nota que tocava como sendo única. Parecia se deixar levar pela melodia, a seriedade com que apertava as teclas, como se movia. Como aquilo era assustador. Ela era um fantasma. Um fastasma do passado. Tocando piano. Como ela! Era como se pudesse vê-la de presente,tocando para ele. Sentiu um calfrio ao ouvir quando ela alcançou as maiores notas. Meu Deus,como era idêntica à Jullianne. Só podia ser um presente dos céus.

-Alec?- Ela parou bruscamente de tocar,ao vê-lo alí,parado como uma estátua.- É você?

-S-Sim!- Respondeu ainda paralizado.-Eu... Eu já cheguei...

-Ah... Me desculpe! Dora falou que você não gosta que toquem nesse piano- Margoth desviou os olhos dele para o piano.- Mas,é que eu não resisti... Fazia tanto tempo que eu não via um desses...

-Onde aprendeu a tocar piano?- Alec perguntou, agora mais curioso que assustado.

- No orfanato... A madre me ensinou.

- Lhe ensinou a tocar Fur Elise? De Beethoven?- Ele perguntou,quase exasperado. Nem ele que tivera cinco anos de treinos sabia tocar Fur Elise.

-Não essa música. Essa eu não sei... Sempre soube tocar. Desde pequena.- Margoth deu de ombros. -Vai ver foi por isso que ela dizia que eu tinha futuro.

    Alec a olhou,quase indgnado. Como alguém simplesmente sabia tocar Beethoven? Como ele não sabia tocar Beethoven?

- Que orfanato era esse?- Ele perguntou. Aquela era uma boa ora para se aprofundar nela.

- Não lembro... Alguma coisa Sundelly...Não lembro mais qual era a cidade...

- E como você saiu de lá? Fugiu?- Alec perguntou,curioso. Ela estava cedendo,ele notou.

- Não! Eu fui...- Havia algo que se aglomerou na garganta dela. Parecia... Doer.- Fui adotada...

- Foi?!- Ele exclamou,surpreso. Se foi,por que não queria voltar? Será que...?

-Fui... Mas,ela morreu poucos dias depois...- Margoth respondeu,e parecia um pouco transtornada.

-Então,você fugiu...- Alec deduziu.

- Eu não podia voltar para o orfanato e eles acabaram achando que eu também tinha morrido... Eu já havia sumido...

- Por quê fez isso? Podia ser adotada de novo.

- Eu não podia...- Ela respondeu. A voz oscilava mais uma vez.

- Por que não?

-Alec,eu não quero falar disso.- Ela pediu.

    Não porque queria esconder algo. Não. Ele pôde sentir. Era porque doia tanto que ela não conseguia descrever.

- Tudo bem... Eu prometi que não iria mais perguntar sobre isso...- Alec concluiu,se reenscostando na parede.

-Bom...- Ela forçou um sorriso.- E por que te chamaram tão tarde?

- Tive que ir à um coquetel fechar um negócio... Ele era turrão.- Alec acrescentou,sorrindo.- Virei a noite para fechar esse negócio.

- Virou a noite? Que horas são?- Perguntou preocupada.

- Umas três da manhã...- Alec afirmou,e olhou para o relógio no pulso para confirmar.

- O quê?!- Exclamou quase incrédula. Já era muito tarde. Passou mesmo a noite no piano?-   Mas,já é muito tarde!

- Tava lindo...- Alec adimitiu.- Se eu não tivesse interrompido talvez nem teria parado...

     Margoth sentiu as bochechas corarem.

-Margoth...- Ele a fitou,e ambos os olhos se encontraram, havidos um pelo outro.- Você... Você toca pra mim?

      As bochechas que já estavam vermelhas piscaram como um farol vermelho agora.

-Quer que... Que eu toque?

- Era umas das coisas que costumavam me acalmar...- Ele falou,e parecia tão distante.-Mas,se estiver cansada e quizer dormir...

- Não...- Ela respondeu sentando-se ao piano,e,repousando as mãos sobre as teclas,perguntou.- Qual você quer ouvir?

- Sabe Clair de Lune, de Debussy?- Ele perguntou.

     Margoth não respondeu. Somente olhou para as teclas pretas e brancas,e com os dedos sobre elas,começou.

       Ela sabia. Alec observou com veemência. E,se reenscostando na parede,poi-se a adimirar aquela melodia e quem a tocava.

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