Quando vi Anahí em minha sala a minha única vontade foi matá-la, arrancar a bofetadas o sorriso vaidoso e frio que ela trazia nos lábios, porém quando a vi saindo de minha casa ela estava tão debilitada, tão frágil que precisou ser carregada. Os olhos estavam tão tristes e todo o ódio que eu sentia por ela perdeu-se naquela imensidão azulada, senti vontade de arranca-la dos braços de Pablo. Rouba-la mais uma vez dele, porque ela me pertencia e não havia nada que pudesse fazer contra isso. Nem mesmo a dor dos meus filhos fez com que eu sentisse mais culpado do que ver aquele adorado rosto banhado em lágrimas. Nem mesmo as ameaças e agressões de Elizabeth machucaram mais do que o silêncio aterrador de uma magoa que jamais poderia ser explicada. Que ironia era perceber, tarde demais que ela, apenas ela era o único que eu não poderia viver sem.
Depois de ser colocado porta a fora por Elizabeth fui imediatamente para o condomínio de Annie, ao saber pelo porteiro que ela ainda não havia chegado resolvi esperar. A noite caiu gélida sobre mim e minhas esperanças, a madrugada chegou trazendo ainda mais desespero, mas só quando a manhã deu seus primeiros indícios de aparecer é que precisei admitir que Pablo não a levara para casa.
Vagueei pelas ruas conhecidas vários minutos antes de admitir para mim mesmo que se quisesse encontra-la deveria procurar por Pablo. Meus lábios estavam secos e minhas mãos suando quando com uma dificuldade inexistente antes estacionei meu carro na frente da republica onde Pablo morava. Caminhei vacilante entre o caminho de pedras e grama maltratada que dava acesso a entrada da república. Minhas pernas doíam, atribui a isso a noite em claro dentro do carro. Tossi sonoramente para desobstruir minha garganta antes de abrir a porta de madeira e sem pintura que como sempre estava aberta.
Na sala ampla encontrei alguns moradores, um deles apagado no sofá com um copo de uma bebida mal cheirosa nas mãos. A boca levemente aberta deixando escapar um enorme ronco a cada respiração. Uma mulher apoiava um espelho pequeno na janela aberta, maquiando-se na luz que havia ali, o cheiro de café vinha forte da cozinha. No corredor encontrei uma moça com não mais de dezoito anos saindo sonolenta de um dos quartos, coçando os olhos e vestindo apenas lingerie. Apenas ergueu os olhos ao me ver, não demonstrou nem uma pitada de constrangimento.
Cogitei a hipótese de bater na porta de Pablo quando parei na frente dessa, mas quando levei uma das mãos na maçaneta enferrujada percebi que estava apenas encostada. Abri.O breu era quase total graças as cortinas pesadas, a pouca luz que vinha dali era a que passava por baixo da porta do banheiro e iluminava o quarto apenas o suficiente para eu distinguir as pessoas que dormiam em cima da cama. Duas pessoas. E uma delas era Anahí, na ponta. Os cabelos claros cobriam boa parte do rosto dela, o edredom cobria apenas parte do corpo esguio, pela metade descoberta notei que ela vestia apenas uma camisa vermelha e cinza. Grande o suficiente para servir-lhe de camisola. Pablo, ao lado dela dormia ressonando sereno, com a barriga para cima e vestindo apenas uma calça de tecido grosso e uma camiseta. A mão dele estava bem próxima a de Anahí, fiquei imaginando se os dois haviam adormecido de mãos dadas.
A cena era nauseante em minha opinião, todas as células do meu corpo reagiram aquilo. Minha pulsação acelerou de maneira exacerbada e todo meu corpo foi sacudido por tremores involuntários. A sensação que tive foi que havia levado um soco no estomago impedindo-me de falar e respirar. A primeira ideia foi acabar com os dois, ali mesmo antes que acordassem. Tive vontade também de quebrar definitivamente o nariz de Pablo com um novo murro. Até de Anahí senti raiva, amaldiçoei o dia em que ela havia entrado em minha vida, como havia me enfeitiçado com aqueles olhos pérfidos, roubando-me toda a minha sanidade. Culpei-a pelo fim do meu casamento com Elizabeth. E no fim apenas lamentei em segredo todo o mal que eu havia causado a ela e desejei ardentemente tê-la de volta. Porém a única reação que tive foi sair dali, fechando a porta atrás de mim. Sem acorda-los.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Acasos II
FanfictionContinuação estendida da mini Acasos. Nas mãos de um vigarista ficou esperança, Coração e sonhos destruídos. Deixados para trás por um indivíduo, Que não fez valer meus sacrifícios. Me deixando sozinha e levando consigo Minha maior virtude: Crer na...