Capítulo 34

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Hoje era um dia ligeiramente diferente. Um dia apenas de pai e filha. Peter convidou-me para fazer uma pequena viagem a Angel Pine. Estava ligeiramente nervosa pois era um lugar de muitas lembranças. Pelo menos ficarei a saber mais sobre ele e talvez, quem sabe, sobre mim, sobre quem eu sou.

- Pronta? - Peter pergunta acordando-me do transe em que me encontrava.

Respirei fundo e sorri, afirmando sem dizer uma única palavra. Entramos no carro e seguimos viagem.

- Pai?

- Sim Emily?

- Não me desiludas, por favor.

Peter olhou-me surpreso e nada disse. Apenas abaixou a cabeça e virou-se contra a janela. Não disse mais nada e mantive-me atenta à estrada.

Chegamos a Angel Pine num instante. O dia estava simplesmente bonito, com o sol a espreitar por entre as escassas nuvens que se avistava no céu. Este lugar estava diferente. Mais alegre, mais habitado. Era um lugar muito diferente do resto. Ninguém precisava de esconder quem é realmente. Um lugar onde a magia se faz sentir a cada passo que se dá. Mas apesar disto tudo, a angústia e revolta ainda pairam aqui devido ao que aconteceu à 1 século atrás, devido àquilo que eu fiz.

- Está tudo bem Emily? - Ele pergunta abanando o meu braço levemente.

- Sim, apenas estava a pensar.

- Se não te sentires bem aqui podemos ir embora.

- Não te preocupes. - Respondi sorrindo e comecei a caminhar pelas ruas.

Passamos por várias lojas e casas, observando também as pessoas. Sentia olhar postos em nós e conseguia perceber que não estavam muito felizes com a nossa presença. Angel Pine é um lugar onde a bruxaria prevalece apesar de vampiros poderem cá viver. A única diferença é que os vampiros têm de viver segundo as regras estipuladas pelas bruxas fundadoras.

Acabamos por parar num belo jardim em frente a um lago. Sentamo-nos num banco de madeira, apreciando a paisagem característica de Angel Pine.

- Eu fui tão feliz aqui. Eu era tão alegre e vivia cada dia como se fosse o último. E isso tudo acabou a partir do momento em que eles morreram.

- Todos os dias me arrependo de não ter estado ao teu lado, de não ter lutado por ti.

- Acho que já é hora de por uma pedra sobre esse assunto e começar de novo. Estou cansada de me fechar neste meu mundo por ter medo de que tudo isto, esta felicidade, um dia acabe.

Peter sorri para mim e abraça-me.
Minutos de completo silêncio se passaram, apenas aproveitando os raios de sol tão acolhedores.

- Tenho a absoluta certeza que deves ter imensas dúvidas, não é verdade?

- Sim. É algo que nunca entendi como é possível. Como é que me tornei numa herege?

Peter olhou em frente, talvez procurando as palavras certas.

- A cada 50 anos acontece um evento mágico em todo o mundo. 5 pessoas são escolhidas para serem hereges e tu foste uma delas. Mesmo eu sendo um vampiro, tu nasceste fruto da magia e do nosso amor e bem, o resto é escusado de dizer. - Peter sorriu matreiro e percebi no momento o que ele quis dizer com aquilo. - Mas por cada evento que seja contra a natureza existem responsabilidades e consequências.

- Como assim?

- As pessoas são escolhidas mesmo antes de nascerem. Cada herege tem o dever de manter o equilíbrio entre a natureza e os vampiros. Entre a sede de sangue e a pureza da Terra, os hereges têm de se equilibrar e manter a ordem entre todos. Como se fossem os protetores do mundo sobrenatural. Mas com isso, vêm as consequências, que não só afetam a pessoa em si como também os que a rodeiam. Como a tua mãe.

- O quê? O que lhe aconteceu?

- Assim que eu e a tua mãe soubemos que tinhas sido uma das escolhidas, ela descobriu que quando tu nascesses, ela tinha que se tornar numa vampira para sobreviver. Mas ela detestou a ideia. Ela odiava vampiros.

- Oh não. Eu nunca percebi o facto de ela não praticar magia e agora percebo. Mas porque é que ela odiava vampiros?

- Uns anos antes de tudo isto um vampiro matou, durante a transição, o irmão mais novo dela. Desde aí que ela começou a odiar vampiros.

- Mas como é que ela esteve contigo?

- Ela nunca descobriu o que eu era. Esse foi o motivo da nossa separação, o motivo de ela me proibir estar contigo. Durante o tempo todo que estive com ela eu contentava-me com uma dieta animal mas é nossa natureza caçar e matar humanos. Numa noite houve um acidente de carro em frente à nossa casa. Um dos passageiros ferido veio bater à nossa porta pedindo ajuda. Ele tinha um corte na testa e o sangue escorria lentamente pela ferida. Controlei-me durante um pouco até que não consegui conter-me mais. Eu matei-o Emily, mesmo em frente à tua mãe, grávida de ti. Durante a gravidez ela permitiu que ficasse ao seu lado mas nunca mais foi o mesmo. Depois de nasceres ela proibiu-me de estar perto de ti e depois acabou por confessar que estava apaixonada por John.

- Mas continuo sem perceber. Se ela se tornou numa vampira, como é que Davina é filha dela?

- Ela não chegou a tornar-se vampira depois de nasceres. John protegeu-a com um feitiço, à base de uma mistura que ela tinha de tomar todos os dias. Algo que a enfraquecia lentamente. Mas nunca a sua magia voltou. Assim que Davina nasceu ela deixou de tomar a mistura que disfarçava o gene de vampiro. Ela estava cada vez mais fraca e se não parasse de beber aquilo, ela não iria sobreviver e não conseguiria cuidar de ti e da tua irmã.

- Como é que sabes de tudo isso?

- John tinha outra opinião em relação a vampiros e apesar de John estar naquela altura com Liz, ele permitia que eu, sem que Liz soubesse, pudesse ver-te. Mas um dia isso acabou e John nunca mais me deixou estar perto de ti.

Nada mais foi dito durante um longo tempo. Tinha a cabeça a trabalhar a mil à hora e o único pensamento que me vinha à cabeça era justamente: eu fui a culpada do sofrimento dela, da perda da sua magia. Comecei a respirar muito rápido e os meus olhos enchiam-se de lágrimas.

- Emily acalma-te por favor.

- Não Peter, não me peças para ter calma. Não depois do que me contaste. Vamos embora.

Comecei a andar em direção ao carro e entrei nele. Peter sentou-se ao meu lado e a viagem iniciou.

- Em, a culpa não foi tua.

- Não digas isso. A culpa é inteiramente minha e agora tenho que viver com isso.

Nada mais foi dito e a viagem foi vivida em silêncio absoluto. Tentei, juro que tentei mas foi mais forte que eu. Lágrimas inundavam o meu rosto e nem o meu pai sabia como me consolar.

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Finalmente a verdade foi dita!

Um capítulo maior para compensar a demora da publicação dos anteriores :)

Votem e comentem o capítulo anterior e este, obviamente!!!

Algum erro avisem.

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