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Aproveito que a Emily dormiu e vou até a cobertura do hospital. Ao chegar me deparo com o Alec de costas, provavelmente fumando e olhando à vista. Abro a porta de vidro com cautela e a fecho quando passo pela mesma.

- Sabia que você apareceria - sua voz ecoa rouca.

- Como previu? - pergunto me encostando ao seu lado no muro.

- Previsível. Todas as garotas querem um segundo encontro comigo. - se gaba com um sorriso.

- Acontece, Sr. Galã, que eu venho aqui todas as tardes há um ano - pela primeira vez naquele dia ele me encara, me assusto ao ver seus olhos vermelhos e inchados, ele também não está fumando.

- Você frequenta o hospital há um ano? - assinto - Só pra vir aqui em cima?

- Infelizmente, não - dou um sorriso triste, ele fica pensativo.

- Você não parece estar doente, algum parente?

- Minha irmã - ele assente - e você? - aguardo sua resposta que demora um pouco.

- Um parente descobriu uma doença que já está bastante avançada. Porém, nós familiares, não deixamos essa pessoa desistir e estamos a obrigando a se tratar - desvia o olhar para a avenida.

- Por isso estava chorando?

- Sim - dá um sorriso de lado. O silêncio se estabelece entre nós, enquanto admiramos o espetáculo que acontecia no céu, o pôr-do-sol. Vejo a lua surgir entre as nuvens, me dando a noção de quão tarde já estava.

- Tenho que ir - me desencosto do muro.

- Te vejo amanhã?

- Você...quer me ver? - minha cabeça dói ao criar tal hipótese.

- é sempre bom ter alguém para ficar calado com você e apreciar o pôr-do-sol - balança a cabeça, conseguindo arrancar de mim uma risada.

- Talvez eu venha, talvez não - caminho até a porta.

- Não vai me dizer seu nome? - seu tom se eleva para que eu consiga escutar.

- Descubra - devolvo no mesmo tom, o vejo caminhar em minha direção.

- Você é sempre misteriosa assim ou isso é para implicar comigo?

- Não se ache tanto - sorrio abrindo a porta e saindo dali. Antes de ir embora me certifico se a Emily estar dormindo, dou um beijo em sua testa de despedida. Saio daquele ambiente hospitalar e caminho pela avenida até encontrar um ponto de ônibus. Não demora muito para passar o que me levaria para casa.

Sou recebida em casa por um delicioso aroma, o sigo até a cozinha. Encontro minha mãe com uma taça de vinho na mão, dançando enquanto prepara o jantar. A ajudo a finalizar o tal prato e logo subo para o meu quarto afim de dormir um pouco.

Acordo na hora do almoço. Já arrumada, passo pela sala em direção a porta e reparo em algo que não reparava há um tempo, meu piano. O deixei de lado desde a primeira internação da Emily, eu tocava por prazer e por me sentir bem. Quando a Emily foi para o hospital em estado grave, a minha vontade de viver alegremente foi junto. Sento naquele empoeirado e pequeno banco, deslizo meu dedo indicador pelas teclas, reproduzindo um som desarmonioso. Minha mãe aparece na sala com um pano de prato velho jogado em seu ombro e com um olhar confuso. Encaro o pequeno caderno apoiado na parte superior do piano, nele têm algumas fileiras de diferentes notas, formando uma música. Fecho meus olhos sentindo as teclas geladas e macias sob meus dedos, deixo que eles me guiem e logo me vejo tocando uma bela melodia. Passo longos minutos na mesma posição, fazendo a coisa que mais amo na vida. Ao tocar a última nota abro meus olhos, me deparando com um celular a me gravar, minha mãe. Seus olhos estão marejados e seus lábios esbanjam um sorriso.

- Mãe...- múrmuro envergonhada.

- Você tinha que ver o quão graciosa estava tocando, minha filha.

- Como eu pude esquecer essa sensação? - pergunto mais para mim mesma.

- Você parecia uma pianista profissional - minha mãe e seus exageros.

Minha Querida JúpiterOnde histórias criam vida. Descubra agora