Capítulo 1 - De quem é essa jaqueta?

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Era sexta-feira, fim de expediente. Todos se preparavam para ir embora. Cinco meses atrás, sempre tinha um ou outro que ficava para fazer hora extra, mas com a nova política da empresa, que tornara essas horas em banco, ninguém se sujeitava a ficar. Entretanto, essa não fora a única mudança da empresa. A crise financeira que o país estava enfrentando, afetou a Acazzy de forma brusca, levando-a a uma rígida contenção de gastos. Ao todo, 208 pessoas foram mandadas embora. Houve atrasos no pagamento, corte na comissão e até mesmo no cafezinho. Eu que costumava tirar de 3 a 4 mil por mês, passei a receber meu salário registrado em carteira, que não passava de R$1.500, o que me gerou uma dívida de 5 mil reais.

— Vamos nos reunir no bar do Brit para um Happy Hour. — Simone anunciou, adentrando minha sala. — Posso contar com sua digníssima presença? — Ironizou, já prevendo minha recusa. Era costume do nosso setor se reunir as sextas em algum dos bares da região, mas eu nunca podia comparecer, pois às 19h eu tinha que estar na faculdade.

— Tenho aula. — Suspirei pesadamente, entortando meus lábios.

— Ainda bem que já passei dessa fase. — Respondeu, esboçando uma careta; Apesar de a Acazzy ser uma empresa voltada ao público jovem, eu era uma das mais novas ali. A maioria dos funcionários tinha de 25 a 35 anos. — Boa aula, neném. — Simone desejou e eu me limitei a sorrir, enquanto a mesma deixava minha sala.

Contudo, eu havia mentido. Meus planos para aquela noite envolviam meios que me fizessem esquecer a pergunta que tendia a se repetir em minha mente: O que a falta de dinheiro te leva a fazer?

Não é fácil ter que dormir quatro horas por dia. Isso tornava meus dias extremamente cansativos. Às 7h eu saía para trabalhar e só voltava para casa às 1h, quando eu chegava da faculdade; Era no mínimo ridículo, uma pessoa ter que ralar tanto, pra no final das contas, dever para Deus e o mundo.

Sempre fui uma pessoa responsável, do tipo que faz orçamentos e anota todos os gastos do mês. As coisas só fugiram do controle, quando fui pega desprevenida com um atraso no pagamento. Eu não luxava, mas meu cargo na Acazzy exigia visitas semanais ao salão de beleza, roupas elegantes e um curso online de inglês. Fora as contas de luz e internet, que mesmo contra a vontade dos meus pais, eu pagava; a prestação da secadora de roupas que dei para mamãe; os materiais, livros e mensalidade da faculdade. Tudo isso se tornou uma bola de neve e eu já não sabia mais o que fazer.

Meus pais não tinham como me ajudar. Meu pai era dono de uma lanchonete e minha mãe trabalhava em casa de família. O que eles ganhavam, mal dava para pagar as contas, comprar comida e pagar a escola da Tereza. Se eu pedisse, é claro que eles juntariam suas economias e me livrariam de toda a dívida, mas meu senso e orgulho sempre falaram mais alto.

Eu precisava encontrar logo uma solução, pois a mensalidade da faculdade já estava atrasada há dois meses. Com mais um, eu não poderia mais frequentar as aulas. Pensei em trabalhar em Buffet, cuidar de crianças ou vender água no farol. Mas como? Até mesmo os domingos eram corridos para mim.

O bar do Brit ficava no sentido norte da Av. Sabará. Como eu não queria encontrar com meus colegas de trabalho, segui andando para o lado sul, onde parei em um ponto de partida, a fim de pegar qualquer condução que entrasse na Av. Interlagos. O ônibus não demorou a vir. Quase meia hora depois, eu adentrava um bar de nome “Vitrine”.

— Me dê à bebida mais forte que tiver, mas que eu possa pagar apenas com cinquenta reais. — Pedi ao garçom, estendendo-lhe minha nota. Ele me analisou por alguns segundos e por fim assentiu, preparando-me um drink. Ao que parecia, não era qualquer um que ali frequentava. Tudo parecia ser caríssimo.

— Por conta da casa. — Ele piscou, estendendo-me o drink. — Não é tão forte, mas é minha preferida. — Dei de ombros, pegando a bebida de cor azul.

Anastácia (em revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora