Vinte e seis

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Uma semana havia se passado. Leonardo levara Clara para passar uns dias comigo, eu estava me sentindo muito só e a companhia da Clarinha era maravilhosa. Um verdadeiro anjo. Fernanda era um doce também, sempre que podíamos, conversávamos sobre diversas coisas.

- Filha, um rapaz esteve aqui te procurando. - Desde a triste ligação com Matheus, eu não pegara mais em meu celular. Pra falar com minha mãe, eu usava o telefone fixo do Leonardo.
- Que rapaz?
- Não lembro o nome, mas ele é muito lindo. Como ele se chama, Tereza? Ah sim, Vinicius, filha, ele se chama Vinicius!
- Ah, sim. - Como eu não me despedi dele, já era de se esperar que me procurasse. - Se ele aparecer de novo, diga a ele que não demoro a voltar.

E não demorei.

- Você sumiu. - Vinicius dissera ao abrir o portão. Eu estava com saudades e o abracei de imediato, ele se mostrou firme nos primeiros segundos, mas logo me apertou em seus braços.
- A gente precisa conversar. - Ele abriu espaço e eu entrei em sua casa. Fomos até a sala e nos sentamos no sofá. Seus olhos brilhavam, ele estava feliz em me ver, mas não escondia seu descontentamento. - Desculpa não te avisar.
- Por onde esteve? Nem a porra do celular tu atendeu.
- Vou te contar tudo! - Eu estava cansada de fugir, de me omitir e de enganar. Vinicius era bom demais e não merecia alguém tão suja como eu.
- Comece… - Ele abaixou a cabeça, fitando o chão. Doeu meu coração, ele estava nitidamente magoado, e com o que eu falaria ele talvez nem olhasse em minha cara.
- Antes de ficar com você eu já conhecia o Matheus. - Ele ergueu a cabeça, tornando tudo mais difícil devido ao nosso contato visual. Suspirei fundo antes de prosseguir e enfim lhe contei tudo, fazendo com que a cada confissão seu menosprezo por mim aumentasse.
- O Matheus me contou sobre seu envolvimento com ele, me contou também sobre a prostituição, me contou a porra toda. E agora, como se não bastasse você me diz que ajudou na morte de uma amiga?
- Ele não tinha esse direito… - Sussurrei em meio a lágrimas.
- Diferente de você ele não quis me enganar. - Suas palavras só não eram mais frias que seu olhar.
- Desculpa entrar na sua vida. - Levantei-me e na hora que ia pegar minha bolsa, Vinicius se levantou e me puxou o braço. Nossos olhares voltaram a se encontrar, e dessa vez, seus olhos também estavam marejados.
- Tu foi a melhor coisa que me aconteceu e a pior também. Se você for embora agora, eu nunca mais vou querer vê-la na minha frente. Se você ficar, eu te perdoo, porque meu amor por você é maior que qualquer coisa, só não vou suportar ser trocado.

“Dizem que o seu coração, voa mais que avião; dizem que o seu amor, só tem gosto de fel; E vai trair o marido em plena lua de mel”.

- Eu te amo! - Vinicius puxou meu corpo contra o dele, e nos beijamos lentamente, até cairmos no sofá e o beijo se intensificar. Peças de roupa voaram pelo ambiente e logo estávamos nus. Seu corpo pedia pelo meu e o meu pelo dele. Fizemos amor por um bom tempo, até adormecermos devido o cansaço.

Cansada emocionalmente, demorei para abrir os olhos. Eu não queria levantar. Queria adormecer no calor do seu corpo todos os dias, mesmo sabendo que não seria justo com ele.
Movimentei-me com cautela, livrando-me de seu braço que estava envolto em minha cintura. Ele dormia feito um anjo e eu podia jurar que ele estava sorrindo. Não segurei minhas lágrimas e chorei baixinho.

- Não era pra ser assim. - Sussurrei próximo ao seu rosto e beijei o mesmo, deixando minhas lágrimas molharem sua pele. - Espero ser capaz de receber o seu perdão um dia. - O relógio marcava 5:30h, eu teria de ser rápida, pois logo ele despertaria.

“Desculpa, Vinicius. Mas você merece alguém melhor”. Escrevi no espelho do banheiro. Clichê? Talvez. Mas o batom era a única coisa acessível no momento.

Após vestir-me de qualquer jeito, peguei minhas coisas e fui embora.

Não sabia o que fazer dali pra frente, mas sabia que minha vida não seria mais a mesma. Mudei drasticamente em pouquíssimo tempo. Sem emprego, com o curso abandonado, três homens envolvidos e uma inocência perdida.

Cheguei em casa um pouco mais que 6:h. Tereza estava se arrumando para ir ao colégio, trocamos algumas palavras e tomamos café juntas. Assim que ela saiu, fui ao quarto dos meus pais, eles dormiam e não quis acordá-los. Tomei um banho demorado e me joguei na cama.
Sem conseguir dormir, pela primeira vez em semanas, peguei meu celular. Mensagens, ligações perdidas, correio de voz e muitas notificações. Ignorei tudo e liguei a TV, sintonizando no noticiário.

- Filha? - Meu pai adentrou meu quarto com um sorriso largo. - Você chega e não fala nada? - Ele caminhou até minha cama e nos abraçamos.
- De todos os abraços, o seu é o melhor!
- Deixa sua mãe ouvir isso. - Brincou. - Como foi lá?
- Cansativo, pai. Mas não quero falar sobre o trabalho. - Fiz uma careta, fazendo-o sorrir.
- Vamos tomar café.
- Eu tomei com Tereza, mas acho que não faz mal tomar de novo, né?
- Claro que não. - Ironizou. - Maldade seria você deixar seus pais comerem a sós.

Passei o dia de pijama, jogada na cama. E assim foi durante duas semanas. Inventei em casa que após a viajem, a empresa havia me dado férias. Não tive contato com ninguém. Vinicius não me procurou, e eu não fazia ideia de onde estava Matheus.

Livros, séries, jogos e eu já me sentia uma fodida sedentária.

- Pensei que não fosse me procurar nunca.
- Não sei qual o problema das pessoas em dizerem “alô”. Bom dia, Leonardo.
- Engraçadinha. Vai continuar na fossa?
- Não. Quer almoçar?
- Te pego às 11h.

Cansada de usar vestidos, roupas sociais e formais, vesti-me como uma garota da minha idade. O dia estava quente, favorecendo o uso de shorts e regata.
Pontualmente às 11h, Leonardo chegou, parecendo surpreso com minhas vestes.

- Porra, Anastácia! - Me olhou repreensivo.
- O que é?
- Você é muito mais nova do que eu, e com essa mini roupa de estudante pervertida, está parecendo minha filha.
- Vamos ao Mc? - Ignorei seu comentário, fazendo-o revirar os olhos. Entramos no carro e ele deu partida.
- Queria te levar num restaurante, sabe? Desses que servem comida de verdade. Mas é melhor entupir as veias de gordura, né docinho?
- Para de reclamar.

Fomos ao shopping, e após comermos, Leonardo quis ir ao cinema. Pegamos a sessão das 14:h. Não sei dize qual filme era, pois dormi em seu ombro durante a exibição do mesmo.

- Estive pensando… - Estávamos em seu carro presos no engarrafamento. - E a boite, Leonardo?
- O que tem ela?
- Eu não assinei minha carteira com você?
- Hm. - Ele pareceu pensar antes de continuar a falar. - Não quero mais que trabalhe lá.
- Não sei nem onde é a boite e tu já está me demitindo? - Uma pergunta idiota, tendo em vista que deveria ter começado a trabalhar há cerca de um mês.
- Você não precisa disso. - Enfim o carro andou e continuamos nosso percusso que provavelmente daria em sua casa.
- Bom, eu preciso de umtrabalho. E você assinou minha carteira, isso só irá sujá-la!
- Você tem à mim! - Disse convicto.
- Pff. - Ri nervosa.
- É sério! - Ele estava sério mesmo. Mas o que ele tinha em mente? Que eu aceitaria ser sua dondoca? Faça-me o favor! Eu não gostava de depender nem do meu pai, quanto mais de um cafetão metido a besta.
- E você tem à mim, temos um laço muito forte que envolve amor, amizade e tesão. Mas não, Leonardo! Não vou depender financeiramente de você! - Apesar de convicta, tentei falar o mais calma possível.
- Bom… Na boite você não pisa! - Como previsto, chegamos à sua casa.
- Não foi você que disse maravilhas de lá? Que é um lugar bastante conceituado e que eu não faria nada mais do que dançar?
- Anastácia, você não vai! - Disse alterado. Ótimo. Desci do carro batendo os pés e fui caminhando na direção do portão. - A entrada é no sentido contrário! - Não respondi e nem ousei virar meu corpo, estendi a mão, mostrando-lhe o dedo do meio e continuei andando. - A Clara é mais madura do que você. - Ele disse vindo atrás de mim. - Volta aqui!
- Abre o portão. - Pedi ao segurança que nem sequer me olhou. - Abre logo ess.. - Antes que eu pudesse terminar de falar, Leonardo agarrou-me pela cintura e jogou-me em suas costas. - AHHH! - Gritei me debatendo. - Não sou sua filha, Leonardo. Me solta! - O filho da puta me ignorou e seguiu pra dentro de sua casa, me soltando apenas em seu quarto.
- Tá pior que criança mimada! - Disse sério.
- Tá pior que meu pai! - Revidei de braços cruzados. Ele me olhou por um instante e caiu na risada, consequentemente, aumentando minha raiva. - Idiota!
- Ana… - Ele sentou-se ao meu lado na cama, largando a pose em que estava, agora ele falava um pouco mais calmo. - Aquele lugar não é pra você!
- Mas paga bem.
- E quem disse que vou te deixar sem dinheiro?
- Vá se foder! Já disse que não quero a porra do seu dinheiro!
- Você consegue ficar ainda mais linda quando está putinha. - Com a voz doce, Leonardo parecia um bobo apaixonado. - Hey! - Disse puxando meu queixo para si, deixando nossos olhares se encontraram. - Ao seu lado eu me sinto uma pessoa melhor, meus dias ficam radiantes. Olha como estou agora… - Ele disse com a voz falha, sem conseguir dizer-lhe uma resposta à altura, eu o beijei.

Anastácia (em revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora