Capítulo 25 - Lucas

23 7 0
                                    

"Por que você me abandonou?"

Passara-se 3 refeições desde que acordara em sua cela. Não estava com fome, mas comia para que o pior não acontecesse. Apesar de que Lucas sabia que não havia algo pior do que aquele local.

"Por que você me abandonou?"

Já havia desistido de chorar. As lágrimas que escorriam na escuridão eram aquelas que ninguém veria ou mesmo se importaria. Pois, quando se está no inferno, seu choro se transforma em piada para os outros. Lucas decidiu não ser a piada.

"Por que você me abandonou?"

"Ó chamas, ó fogo, por que me abandonou?

A maior tristeza era não poder usar os poderes. No inferno, a esperança é a maior arma do inimigo. A esperança de Lucas era seus poderes, era o fogo. Mas ele o havia abandonado. As chamas já não lhe respondiam e ele já não ouvia mais suas velhas amigas.

"Por que você me abandonou?"

A esperança doía-lhe o coração. Pois sabia que tinha o poder para mudar tudo aquilo, mas mesmo assim, não tinha nada.

"Porque? Porque?"

A escuridão então tornou-se sua amiga. Sua companheira. Era aquela que sussurrava, oferecia os generosos braços da morte. Era aquela que queria ajudar a superar todo aquele problema, esquecer todas as dores. Pois, para quem já está quase morto, a morte é apenas uma amiga que vem lhe visitar.

Lucas se lembrava do rosto do velho que morrera ao seu lado, por não saber a resposta. Lembrava-se do sorriso sádico que Morgan fizera ao mata-lo. Da felicidade. E tudo porque eles são diferentes. Tudo porque eles são superiores.

Lembrava-se do sorriso doce que a menina fez ao ouvir de Lucas que tudo estaria bem. Mas o rosto sem vida dela era o que atormentava seus sonhos. E novamente o rosto de Morgan aparecia em sua mente para tornar-se superior.

Jogado na parede no fundo da cela, sentado, olhando pro nada, Lucas pensava em todos que estava deixando para trás. Os treinos e brincadeiras ao lado de Alan, o cuidado de sua irmã, o aprendizado junto com Bryan, as noites juntos no Maine. Tudo isso estava em sua mente e sempre que lembrava deles lembrava-se que era Morgan que estava tirando toda essa felicidade dele.

-Mas não vou dar esse gostinho para ele! -disse para si mesmo Lucas em meio a escuridão.

"Porque você me abandonou?"

Lucas se levantou em meio a escuridão, determinado a encontrar a resposta. Sabia que ela tava lá, em algum lugar. Apesar dos braços estendidos que a morte lhe oferecia, ele decidiu deixar para uma outra hora. Se lembrava da promessa que fizera, ao falar que iria queimar todos naquele lugar maldito. E ele iria cumprir essa promessa. Iria cumprir para que pudesse rever seus amigos. Iria cumprir para que pudesse rever sua irmã. Iria cumprir para vingar o velho. Iria cumprir para vingar a menina. Mas acima de tudo, iria cumprir para poder ser feliz. E ele ia dar a felicidade a todos os descendentes.

"Porque você me abandonou?"

Antes, Lucas precisava resolver o enigma dos seus poderes. Mas a escuridão ensinou algo para ele : seus poderes não o abandonaram, foram tomados. E tudo que é tomado pode ser pego de volta.

"Como o tomaram de mim?"

Lucas começou a vasculhar toda a sua cela. Cada centímetro de sua nova casa precisava ser visto. Com a colher que tinha, tentava usa-la para abrir pequenos buracos nas paredes, para que pudesse ver dentro. Ele sabia que tinha que haver alguma coisa ali, impedindo ele de usar os poderes. E ele ia encontrar essa coisa, seja lá o que fosse.

Estava determinado. As imagens de sua família e amigos flutuavam em sua mente, como um redemoinho, mantendo viva a lembrança deles. Mas Lucas não queria esquecer, e muito menos esquecer o rosto daqueles que morreram naquele inferno. Estava determinado a mostrar para seus torturadores que eles podiam se achar os demônios, mas Lucas ia mostrar que ele é o verdadeiro dono do inferno.

Quando sua colher quebrou, Lucas passou a usar os próprios dedos para poder abrir os buracos nas paredes. Mas tão logo ele começou a fazer isso, e seus dedos começaram a sangrar. Grandes gotas de sangue caiam no chão, estavam quentes, pois fumaça saia de seu sangue. "Ainda está ai", pensou Lucas. Logo, sua mão estava encharcada e grudenta com o próprio sangue, mas nem isso fez Lucas desistir de seu objetivo : encontrar aquilo que limitava seus poderes e destruir.

Chegou mais uma refeição.

-Não estou com fome- disse Lucas tranquilamente.

-Mas vai comer, prisioneiro 1809- disse o guarda que trazia a comida.

-Mas não quero comer! Não precisa deixar.

Os guardas entraram na cela prontos para atacar Lucas. Lucas resolveu desistir da ideia de não comer. "Se quero sair daqui, preciso estar vivo e inteiro".

-Ta bom cara, eu como! Calma ae!

Com isso Lucas percebeu que eles desistiram de bater nele. Simplesmente se viraram e foram embora.

Lucas comeu um pouco e seus amigos ratos comeram o resto. Lucas continuou sua busca. Já havia revirado toda a cela, mas não havia nada, nada. Começou a vasculhar de novo. Nada. De novo. Nada. De novo. Nada.

Se jogou no fundo da cela, cansado e sem esperança.

Passou-se mais um tempo e a comida chegou novamente para ele. Ele comeu um pouco e novamente os ratos terminaram o resto. Ele agora estava apenas no fundo da cela, jogado, olhando pro nada. Sabia que Morgan havia atingido seu objetivo. Ele tirara a esperança de Lucas. Ele soube que Morgan venceu no exato momento que Lucas sentiu esperança.

Passou mais um tempo e veio mais comida para ele. Pela contagem de Lucas, isso seria em torno de quase um dia inteiro desde que ele acordara em sua cela. E nesse meio tempo já haviam trazido comida para ele 6 vezes. Lucas se perguntava porque traziam tanta comida e porque fazerem tanta questão de que ele comesse a comida. Em tão pouco tempo, ele havia comido várias vezes.

Foi então que na escuridão Lucas sorriu.

Pois ele compreendeu.

Ele soube quem era seu inimigo ali.

Era a comida.

Descendentes - O Último Descendente Onde histórias criam vida. Descubra agora