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  Rosas

Sem a mínima intenção de despertar de seu merecido descanso, o pai, cautelosamente, encostou a porta de seu quarto. Avançou de encontro com a escrivaninha, tomou os pincéis repousados numa caneca por si ornamentada, e mais acima das prateleiras fixadas na parede de tom beije, guarnecia uma tela completamente branca. Pronta para mais uma exposição de seus sentimentos, da sua inspiração.

Certamente não se degustaria dos rouxinóis no seu previlegiado acto, então escolheu previamente as músicas que desejou fazer parte de sua nova playlist predefinida.

O sol se encolhia no manto da terra, acusando sentido para o mar, liberando a fuga de alguns fracos alaranjados filetes que atravessavam sua janela personalizada no interior, e em seu oposto a condizer com a decoração principal da casa.

Manter o foco diante de sua janela, diversas vezes, a presentiou com ideias fantásticas. Entrementes acreditava que o horizonte tinha muito ainda para a oferecer, os pássaros a entreteriam como nunca, Love story algum dia orquestraria seus traços.

Simples assim. A Natureza, era mais que uma seleccionadora de seus habitantes.

Os passos pesados sobre o soalho, soaram com aproximação de sua porta. Não esperou escutar o embater da madeira, que abriu-a em nome do entusiasmo ligeiro que corria em suas veias salientes na pele negra.

–– Não ouvi-te chegar. –– anunciou seu pai, com o tom mais afectuoso de sempre.

Gesticulou que entrasse, mesmo sendo uma desnecessidade. Entraria de qualquer modo.

–– Tenho apenas dez minutos desde que cheguei.

–– Como foi a secção de hoje?

Prolongou o que seria um breve sorriso.

–– Boa. Produtiva. Surpreendente.

Cristóvão franziu as sobrancelhas, cruzando os braços. Isso sim, era uma novidade.

–– Meu nome foi revalado no sorteio para escolher o tema do próximo sábado. Não resisti em descartar o Olimpo como única opção. –– abriu mais o sorriso, emitindo alguns sons sintonizados e hilariantes. Consequentemente, contagiando as feições másculas, perfeitamente definidas do pai.

Reuniu todo o material apressadamente e o libertou sobre a escrivaninha, para juntar-se a seu pai, sentado na cama.

–– Acabo de receber uma ligação. –– houve um declínio na tonacidade da voz grave e suave de Cristóvão.

Marie se culparia em saber que foi o seu barulho que o acordara, então expeliu um suspiro aliviado inaudível.

O homem contorceu os lábios carnudos escuros, transparecendo uma hesitação.

–– Quem era? –– desatou a perguntar, a jovem, curiosa.

–– A tua mãe. Ela diz que quer aproveitar os tempos dela cá, antes de dar continuidade com a viagem para Londres.

Diferentemente das outras vezes, uma indeferença em formato de um leve véu, caiu sobre si, porém com um burburinho de revolta em seu pobre jovial coração.

O nome de sua progenitora, tinha em anexo uma questão que nunca esperou pela resposta, pois demasiadas conclusões tirava com o passar do tempo.

–– O que tu a respondeste?

Cristóvão encolheu seus ombros.

–– Não queria corresponder nem se quer negar-lhe. Afinal, ela é tua mãe. Prometi-a que receberia até ao final do dia, um e-mail teu como resposta. Não és obrigada a nada, lembra-te.

As Rosas de VênusOnde histórias criam vida. Descubra agora