21 de junho de 1986

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Querido Diário,

Ontem passei o dia com Donna. Durante muito tempo ela não disse realmente nada. Quando comecei a chorar, saí correndo da casa dela e não podia parar. Fiquei muito feliz quando ela veio atrás de mim, também chorando. Eu disse a ela o máximo que pude. Que eu estava preocupada em ser boa porque andava tendo sonhos maus, muito maus mesmo, e não estava brincando quando disse a ela que não estava dormindo nada. Disse também que gostaria de conversar sobre a noite no rio com os rapazes que eu tinha tido um sonho horrível e pensado que o que acontecera fora ruim. Disse que precisava ouvir o que ela pensava sobre aquela noite. Tinha que saber se ela achava que devíamos ser punidas por aquilo, ou se eu deveria, porque fizera mais que ela... eu tinha que saber!

Donna disse que tinha medo de que eu não estivesse conversando com ela porque estava furiosa por ela não ter ido tão longe quanto eu com os rapazes, e que não gostava mais dela por causa disso! Perguntei como ela podia pensar isso quando nos demos aquele abraço tão bom quando a noite terminou, e que ainda me lembrava desse abraço como uma das partes mais claras e mais bonitas da noite toda! Disse que só estava muito confusa, e disse também que metade do tempo eu não sabia se devia ter gostado daquilo tanto quanto gostei, ou se devia estar me sentindo mal.

Donna disse que a única razão de ela ter saído da água foi que não tinha certeza se achava certo fazer aquilo, mesmo que os rapazes fossem tão legais. Depois ela chorou e olhou para mim, de um modo muito estranho, e disse uma coisa que achei realmente esquisita. Disse que outro motivo de ela não ter entrado mais foi por medo, porque eu parecia tão à vontade em tudo aquilo, e ela não sabia o que devia fazer, ou como fazer. Quis saber se aconteceu comigo naturalmente, ou se eu estivera com outro cara e não tinha contado para ela.

Não consegui responder. Não sei se sabia a resposta. O que ela quis dizer com isso? Eu disse, depois de um bom tempo, que me lembrava de estar me sentindo sexy, e muito feliz por eles gostarem de mim e me quererem, mas que metade de tudo, talvez mais, eram coisas que os rapazes faziam e não eu.

Além do mais estávamos bêbados, e era tão bom fazer coisas que eu imaginara durante tanto tempo... Ela me interrompeu aí e disse que também pensava nos rapazes do mesmo jeito. Eu perguntei como era, como o que faziam quando ela sonhava com eles, e ela disse que eles a tiravam para dançar, ou olhavam para ela na escola, ou a deixavam andar em seus carros. Disse que imaginava sair com caras mais velhos que a tratavam como uma princesa, e que à noite eles entrariam numa cama bonita e bem grande ao lado dela, e eles conversariam e se beijariam, e de vez em quando fariam amor.

Ela disse que não gostava de ir tão longe porque parecia estragar o resto da fantasia. Sim, pensava em sexo, ela disse. Mas um tipo de sexo que vai muito devagar, como nas novelas água-com-açúcar. Ela disse que vê a coisa em câmera lenta, ouve a música tocando ao fundo, e eles rolando pelo chão, ela e o cara, muito lentamente, até que tudo desaparece de sua cabeça. Ela disse que esperava que as minhas fantasias fossem tão sexy quanto as dela.

Ah, Diário, foi tudo muito bem até conversarmos sobre isso! Eu tive que dizer que minhas fantasias eram idênticas às dela, e que nós não devíamos ter discutido, e eu sentia muito por tê-la magoado. Que eu devia ter me aberto mais com ela, e que só estava preocupada por ela estar me odiando por ter ido tão longe naquela noite. Ela disse que me achou muito corajosa, e que se me fez bem, então eu devia pensar que fora uma coisa boa. Mas, e quanto às fantasias dela? Eu quase morri quando soube que eram tão puras, tão delicadas e tão gentis. Por que ela não pensa as mesmas coisas que eu?

Eu esperava tanto que fosse assim... eu dependia disso.

Sei que ela falava a verdade pela maneira como ela dizia, e como ficou sem graça quando falou sobre aquele cara que ia para a cama com ela. Mal posso acreditar em como ela é pura! Acho que as vezes que fui para a floresta no meio da noite me envenenaram.

Aposto que seria como Donna, se eu ainda ficasse brincando entre as árvores, em vez de... o que acontece agora. Mas... eu jamais desejei isso que está acontecendo! Desejava coisas que me fizessem sentir sexy e brincalhona, coisas que não me obrigassem a fazer todo o trabalho, coisas como o outro tentando me dar prazer, em vez de eu estar sempre me esforçando para tornar todos felizes.

Gostaria que houvesse um lugar onde se pudesse ir e alguém desse as respostas para as perguntas, e dissesse se o que se está fazendo é certo ou errado. Como se espera que eu saiba, quando não posso sequer falar realmente sobre as coisas? Fico falando as mesmas um milhão de vezes. Estou girando em círculos, e é hora de parar.

Donna e eu ainda somos amigas, ainda gosto muito dela, mas as coisas agora são diferentes para mim. Não posso pensar como ela, não poso nem tentar mais. Pensarei no que sinto e tentarei fazer com que as pessoas vejam as coisas como eu. Gostaria de um cigarro de maconha agora. Ela me faz sentir como se eu não risse há muito, muito tempo.

Obrigada por me ouvir.

Laura

O diário secreto de Laura PalmerOnde histórias criam vida. Descubra agora