13 de novembro de 1987

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Querido Diário,

Estou em casa. É cedo. Leo e Bobby não ficaram muito felizes por eu querer voltar para casa. Leo tinha decidido que ia ser uma noite de coisas novas e "incomuns". Bobby estava muito, mas muito alto mesmo, e achei que Leo tinha dito a ele que falasse comigo para topar tudo o que Leo quisesse, porque eu nunca o vi tão interessado em manter-me em algum lugar. Seus olhares constantes para Leo me fizeram pensar que Bobby se sentia culpado, ou talvez em dúvida se devia ou não me fazer entrar nisso. Balançar o queijo na frente do rato... um ratinho loiro e muito assustado. Está vendo a ratoeira? Está? Então vai. Você sempre quis isso, lembra-se? Leo balançou a cabeça quando eu disse que tinha resolvido ir embora porque algo acontecera e tinha me deixado tão... e parei. Não acabei a frase porque vi de repente que os dois não estavam em condições sequer de fingir que se importavam com um gato lá na rua. Um animal branco, que talvez ainda estivesse lá... ou como eu o imaginava enquanto dirigia devagar, com os faróis apagados, no caminho de volta. Vi seus olhos mortos presos na imagem de uma mãe, provavelmente cansada e preocupada em saber se sua filha estava bem. Perguntando-se, enquanto erguia o corpo do animal, se a morte parara logo ali. Talvez ela pensasse no trabalho que teria no dia seguinte, em andar sem rumo pela rua... tão cansada, sempre cansada.

Acho que estou pensando em mim mesma. Estou cansada. Sou eu que pergunto: será a morte apenas a imagem congelada do corpo de um animal? As cinzas de meu avô, apenas um jeito mais fácil de caber dentro da urna? Ele é apenas um corpo, no fim das contas: por que não enfeitar o que sobrou?

Quando eu morrer, acho que vão me enterrar. Espero que o gato tenha sido enterrado.

Pensei em ficar para ajudar, mas tudo estava perto demais. O corpo ali, como uma mensagem. Talvez os atropelamentos sejam mais do que parecem. Mensagens, como foi ontem à noite... ou exemplos aos quais nunca prestamos atenção. Isso é o que é. Silêncio. Eterna privacidade. Eu não queria ficar essa noite com os rapazes. Queria vir para casa, dormir na minha cama, ser outra vez uma menininha. Fingir uma doença ou cólicas e pedir à mamãe para cuidar de mim. Ler A Bela Adormecida ou O Pequeno Polegar, beber café enquanto ela vira as páginas e toma conta de mim.

Era o que eu queria, mas sabia que acabaria ficando naquela casa. Sair de lá às escondidas, antes de o sol nascer... desligar o alarme do despertador segundos antes de ele tocar. Despir-me completamente e enfiar-me embaixo dos lençóis. Eu sabia que lhe contaria o que aconteceu.

Simplesmente. Com uma caneta e nenhum som. As palavras têm sido estranhas para mim nesses últimos dias. São só mentiras, o tempo todo. Outra vem para ajudar a mentira anterior a sobreviver... tornar-se real. As palavras de Bobby têm sido como pequenas facas. Sei que ele não tem intenção de me magoar, mas as surpresas com meu comportamento outra noite, ontem à noite, a diferença que ele vê quando estou drogada... e tem acontecido muito isso. Ele diz que jamais pensou que eu fosse tão selvagem. Acho que ele quer dizer que jamais imaginou que eu fosse tão má. Ele nunca conheceu a Laura Palmer como a floresta, as árvores, a terra conhecem. Sempre trêmula e com raiva, ameaçada, paralisada, incapaz de correr. Ou nunca a escolheu.

Ensinaram a Laura Palmer que ela merece a dor e um tipo de intimidade em que a maioria das pessoas nunca pensa ou fala porque acha errado. Laura Palmer? Ela nasceu sem escolha. Uma noite há muito tempo disseram-lhe bem baixinho que ela iria gostar ou teria que morrer.

Eu fiquei na casa. Leo quis que eu bebesse alguma coisa. Relaxasse. Ele disse que me queria do jeito que tinha sido. Disse que eu prometera a ele. Garantiu que eu estaria em casa a tempo... ninguém ficaria sabendo. Ele se ajoelhou na minha frente e agarrou meus pulsos com força. Eu pensei em BOB e fechei os olhos. Eu devo ter gemido, emitido qualquer som, porque ele disse: "Eu sabia. Sabia que isso queria dizer alguma coisa para você".

O diário secreto de Laura PalmerOnde histórias criam vida. Descubra agora