Capítulo 6

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Uma semana havia se passado desde que Alice chegara à casa de Harry e nem nos melhores sonhos ela poderia pensar que no fim do túnel haveria uma luz. Ele ainda era bem reservado, mas se esforçava para ser educado e até um pouco amigável. Tinha parado de beber e durante toda a semana esteve em reuniões com a banda para decidir o que fariam nesse retorno surpreendente.

Embora saísse cedo, Harry não tomava mais café da manhã sozinho. Ele esperava Alice, que geralmente tinha o rosto amassado e cheio de olheiras e bocejava com frequência enquanto comiam tudo em silêncio. Silêncio de palavras porque seus olhares pareciam sempre dizer alguma coisa. Não fora diferente naquela manhã. Alice desceu e foi até a cozinha vestindo, finalmente, shorts jeans e uma bata branca. O dia estava quente e ela feliz por isso.

- Bom dia! – cumprimentou Harry com um sorriso e ele retribuiu fracamente.

- Bom dia.

Ela sentou-se e as ações já haviam virado um ritual. Harry serviu-lhe um pouco de café e Alice colocou duas panquecas em cada prato. O sol já estava entrando pela janela com força, o que não era comum.

- Vocês apareceram no jornal ontem. – Alice falou calmamente. – É verdade que estão pensando num CD novo?

- Pensei que não fosse nossa fã. – Harry retrucou debochado.

- Não sou, mas sou curiosa demais para ignorar. – ela disse sorrindo de forma ironicamente doce.

- Só estamos conversando sobre o que fazer. Meu sumiço trouxe alguns problemas e questionamentos e eu não quero ser o elo fraco. – ele explicou.

- Você não é o elo fraco, Harry. – a garota protestou.

Harry balançou a cabeça, deixando o assunto morrer. Ele sabia disso, mas não se sentia assim no momento. Não estava acostumado a ser o debilitado, o que sofria. Até o acidente, sua vida tinha sido muito boa, não poderia se queixar. Ao que parece, essa foi a razão pela qual quando sofreu, se quebrou.

Tudo ficou quieto e Harry voltou à realidade quando percebeu que Alice havia se calado. Nos últimos dias ela parecia menos como um gato assustado e mais como uma maritaca. Sempre tinha um assunto, sempre tentava fazê-lo rir, mesmo que singelamente. No entanto, naquele momento, ela ficara quieta. Harry passou toda a conversa mentalmente, enquanto a observava brincar distraída com as panquecas, para ver se tinha dito algo que a deixasse triste ou com medo. Ainda fazia isso constantemente, mesmo sem querer. Não percebeu nada. O problema não havia sido a conversa, então.

- O que houve, Alice? – ele perguntou.

Ela suspirou profundamente e continuou olhando para o prato, quieta. Sua mão segurava o garfo tão firme que seus dedos estavam ficando brancos com a força que fazia.

- Alice, olhe para mim. – o tom de voz ficou mais sério – O que houve?

Levantou os olhos com as pestanas escuras que ele tanto admirava, sem uma maquiagem.

- Eu quero sair. - a frase quase não saiu, seu tom de voz era baixo, quase sufocado. Sim, ela ainda sentia medo dele.

- Você quer sair. – Harry repetiu como se as palavras não fizessem sentido. – Não, é perigoso demais. Esqueça isso.

- Não! Não é perigoso. - ela agora parecia uma criança birrenta e irracional.

Harry se levantou e, aproximando-se da garota, tentou manter a voz baixa.

- Os homens que te sequestraram no Brasil ainda estão lá fora, - ele disse - E não sei o que você pensa, mas quando eles vendem uma prostituta, não esperam encontrá-la feliz passeando pelas docas.

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