Capítulo 3

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Meia hora depois, ela estava descendo as escadas, vestindo uma camisa social azul e uma cueca samba canção preta. Os cabelos longos e molhados batiam-lhe nas costas e o perfume de jasmins e rosas impregnou a sala no momento em que ela chegou. Harry virou o rosto em sua direção assim que sentiu o cheiro e teve que se segurar para não sorrir. Ela parecia ser tão delicada e era tão linda que às vezes ele precisava lembrar-se de que não queria mais amar.

- Você deve estar com fome. - ele disse fazendo um gesto para que ela se sentasse no grande sofá.

À sua frente, havia uma bandeja com vários sanduíches e uma jarra de suco. Fora tudo o que Harry conseguira fazer sozinho, já que não queria acordar a empregada - mais uma vez. Os olhos da garota brilharam, mostrando o tamanho de sua fome. Ele imaginou quanto tempo ela não comia decentemente e sentiu suas defesas abaixarem só um pouco. Não precisava ser um idiota com ela.

- Vamos começar pelo básico. - ele disse, entregando-lhe um sanduíche - Qual é o seu nome?

A garota pareceu pensar por um momento, analisou o sanduíche e pareceu decidir que era melhor ser alimentada e tratada bem, do que sofrer tudo novamente.

- Alice. - ela disse vagamente

- Brasileira, não é? - Harry perguntou - Seu sotaque não é muito forte, mas ainda assim... E você falou em português ainda pouco.

- Sinto muito. - ela disse, bebendo um pouco do suco.

- Não precisa se desculpar. O Brasil é um país lindo e nossas fãs brasileiras são... Intensas demais para serem esquecidas. - ele brincou.

- Disso eu sei. Minha irmã só conseguia falar de vocês, pensar em vocês. - ela comentou e logo seu olhar ficou perdido.

Em algum lugar distante, os pensamentos dela vagavam e era possível perceber que não havia alegrias nas lembranças. Fantasmas lhe assombravam e não parecia haver uma maneira de tirá-la desse mundo. Harry esperou até que seus olhos voltassem para o mundo real e chegou um pouco mais perto.

- Sente falta? Dela? Do seu país? Sua família? - ele perguntou com um tom de voz baixo, deixando sua voz mais grossa.

- Sim. Mas, preciso aprender a lidar com isso, essa saudade não vai acabar. - Alice respondeu, sacudindo a cabeça e, com ela, as lembranças.

- Porque você me pertence, agora. - não fora uma pergunta.

- Porque não há mais irmã ou família para quem voltar e matar essa saudade do meu peito. - a garota disse amargamente e o olhou: - Mas disso você entende, certo? Você perdeu sua namorada e...

Harry levantou-se abruptamente e seu semblante preocupado e tocado pela história da garota mudou para uma expressão quase feroz. Ela não o havia ofendido, nem dito alguma mentira, mas, ainda assim, ninguém deveria falar o fato em voz alta perto dele. Ouvir só tornava tudo mais doloroso, mais real.

- Dói, eu sei. - ela falou, se levantando também para encará-lo.

- Fique quieta. - Harry avisou entre os dentes.

- É por isso que você se meteu naquele lugar. Para esquecê-la! Tirar a imagem dele da sua mente e...

- CALA A BOCA! CALA A BOCA, GAROTA! - e, num piscar de olhos, ele estava segurando-a por um braço, com mais força do que esperava fazer.

Alice deu um longo grito de dor e tentou se livrar, mas ele apertou mais um pouco. Era nela que ele descontaria toda sua raiva, mas não tudo de uma vez. Um pouco a cada dia. Se sua alma definharia a cada amanhecer, ele se certificaria que a dela também fosse para o mesmo caminho.

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