O observador solitário

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O observador solitário

E se você, certo dia acordasse e percebesse que, aquilo pelo que você tanto se empenhou em construir, finalmente está pronto?

E se soubesse que você foi o responsável pela maior criação tecnológica de sua espécie?

E se você não se sentisse feliz com isso?

E se você tivesse construído tal aparato apenas para salvar seus semelhantes de se auto aniquilar?

Eu sou a resposta para todas as questões levantadas anteriormente.

Não sei se essa mensagem chegará de alguma forma a alguém, mas se acontecer eu a verei ser recebida, assim como vejo tudo.

Costumava ter um nome pelo qual era identificado por meus semelhantes e familiares, mas para ser sincero deixei de me reconhecer por tal conjunto de sons. Meu corpo tinha características únicas como qualquer outro ser humano, porém depois de tanto tempo sem interagir com ninguém, acabei percebendo que perdi minhas formas, restando apenas uma figura de luz.

A minha volta tudo o que existe e a escuridão infinita em um lugar cuja matéria é abundante e totalmente maleável.

Foi usando essa massa disforme e a imagem de um amor que se perdeu no tempo, que criei uma estátua feminina pra onde tenho apontado meus olhos nos últimos tempos.

Eu vejo a pessoa que me inspirou a criar tal obra e sei que ela sonha comigo e com todo o carinho que poderíamos dar um ao outro, mas aquele que ela vê em seus sonhos é alguém que não pode alcançá-la.

Sei que parece confuso o que vou lhe dizer agora, mas vou tentar ser o mais simples possível.

Meu mundo estava beira da destruição e tudo o que pude fazer foi tentar usar uma borracha e apagar o passado para impedir o futuro, todavia, o que acabei descobrindo foi que o futuro não pode ser alterado.

Sim eu descobri que o que eu criei não foi um aparato que me permitia controlar o tempo, mas sim viajar entre as dimensões, ou seja, ao invés de apagar o passado tudo que fiz foi mudar de página através de um buraco entre as folhas e presenciar outra versão de uma história semelhante.

O amor que ela sente por aquele homem que trabalha dia a dia em uma máquina do tempo jamais será correspondido pelo mesmo. As visões que todas as noites de sono surgem em sua mente jamais poderão se realizar e isso se deve a vários fatores, mas apenas dois são relevantes para que você, receptor dessa mensagem, entenda.

O primeiro fator veio depois que passei por todas as dimensões paralelas em busca de uma solução para meu mundo. Somadas chegam-se o número quarenta e um, todas com suas características únicas e magníficas, mas todas com o mesmo destino.

Sim.

O destino de todas as dimensões era o mesmo, a escuridão.

Como disse antes, nada que fiz foi suficiente pra mudar. Tudo sempre acabou do mesmo jeito.

Por isso que ela jamais encontraria aquele homem de outra dimensão, pois ela não viveria o suficiente para vê-lo construir sua máquina de atravessar mundos.

Mas eu estou aqui não é? Eu posso usar minha máquina e vê-la não é?

Não.

Esse lugar onde estou não é como os outros, não é uma dimensão normal como as que percorri. Aqui eu posso ver tudo o que acontece nas demais versões de mundo ao mesmo tempo, ou seja, sou onisciente. O tempo para mim não existe, passado e presente são efêmeros, sendo que eu os vejo acontecendo em simultâneo.

Mas o mais cruel disso tudo é que estou preso aqui. Um observador solitário que nada pode fazer perante a todos os finais cruéis que os universos estão destinados. Um observador solitário que descobriu que era amado por alguém de outro mundo através dos sonhos. Um observador solitário que tem de ver, a única pessoa que o amou, ser tomada pelas trevas juntamente com seu mundo.

Sim, este é o segundo fator que impede que eu pessoalmente encontrá-la.

Por isso passo essa mensagem a todos os confins do tempo, para que, quem sabe, daqui alguns bilhões de anos, em algum lugar não fadado as trevas; alguém possa dizer a essa pessoa que me amou para procurar em seu próprio mundo. Pois, mesmo não sendo o que ela espera, ainda assim será aquele que ela ama e não apenas um observador solitário preso em um mundo vazio. 

CONTOS: Histórias de universos em construçãoWhere stories live. Discover now