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ASSIM QUE CHEGUEI DA ESCOLA, larguei minha mochila no chão da sala de estar e corri para o andar de cima. Entrei no banheiro do corredor, onde tinha a tão desejada banheira da qual eu precisava urgentemente antes de começar a espirrar - embora tivesse certeza de que tal coisa não aconteceria.

Enquanto estava no ônibus, observei as pessoas - seus pensamentos eram repletos de frustrações e suas vidas eram uma droga. Eles mantinham segredos que até mordiam os lábios, como se fossem acabar soltando-os sem querer. Tudo ia de seus respectivos trabalhos a suas relações amorosas. Isso me fez descer na ponte Willamette e correr até Kings Heights, a vizinhança onde eu morava.

Arranquei o moletom, o suéter, a blusa fina e finalmente o jeans. Um calor anormal percorreu o meu corpo durante o tempo que todos aqueles pensamentos rodearam minha cabeça e me fizeram inclinar na direção do vaso sanitário. Um nó contínuo na minha garganta afrouxou, e meu almoço saiu em fluídos amargos.

Trêmula, apertei a descarga e me apressei em afundar na água quente da banheira cheia de espuma.

~*~

Minha nuca fervia a cada esquina que virava. Deveria ter me recolhido em casa - acabado o banho e ido me deitar apenas de toalha, tal como fazia quando estava com cólica. O problema era as pessoas - elas tinham mania de pensar tanto que a minha cabeça que doía!

Pedalei mais rápido, torcendo para o Papa Haydn estar vazio. Lembrei-me de Chace: uma vaga lembrança de quando esperávamos nossos devidos transportes. Havia me perguntado se era boa em culinária, e, definitivamente, não - estou indo ao Haydn para comprar um doce. Queria comer algo, e ainda não tivera tempo de ir ao mercado e abastecer minha geladeira.

Prendi minha bicicleta em um ponto específico do estacionamento com uma corrente. Adentrei o local, inalando o aroma de café e me dirigi no mesmo momento para o balcão. Uma mulher me atendeu, sorridente - acho que uma das quatro pessoas até agora que está realmente satisfeita com sua vida em geral.

Aliviada por não ter de carregar mais uma energia negativa comigo, pedi um cupcake de Ovomaltine para viagem e um pedaço de Schwarzwälder Kirschtorte. Sentei-me em uma mesa reservada para comer o bolo.

Pesquei a cereja pelo fino cabo em sua ponta e lancei-a na boca antes de pegar a colher para começar a comê-lo. Só que algo me chamou atenção.

- Você está fazendo exatamente o contrário.

- E você está fazendo o certo, claro.

- Pelo menos o meu modo é útil.

- Hipnotizá-la não vai resolver. E o problema não é seu, Vivyanne.

Um frio percorreu a minha espinha.

- Caso ela descubra algo, a culpa será sua.

Ao fundo, do meu lado esquerdo, Vivyanne e Chace conversavam em russo. Russo. Eu sei falar russo?

Lembrei-me de Turandot, a qual passou por mim como meras*, palavras, tão fáceis de traduzir e entender.

- Ela está aqui.

Enjoada demais, forcei o último pedaço do Floresta Negra garganta abaixo e peguei a sacola de papelão com o cupcake em um recipiente dentro. Deixei cem dólares na beira do prato para não sair voando e corri porta afora, desesperada.

~*~

Na manhã seguinte, sentia-me melhor. Minha cabeça doía menos e meus ombros pareciam mais leves.

Nunca me esforçando para chegar cedo na escola, fiquei dez minutos na cama até conseguir levantar. Tomei banho com minha tradicional lerdeza e comi um cupcake no caminho.

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