11. Até o dia clarear.

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De todos os Karas, Miguel muito possivelmente era o único a ter a noite menos interessante. Dormira na casa dos pais naquela noite. Insistência dos dois depois que ficou para jantar.

Na manhã seguinte, o líder dos Karas iria pela segunda vez na vida a penitenciária de segurança máxima. Era irônico pensar que na primeira vez que fora, era um adolescente. O mundo parecia não seguir aquela velha lógica quando se tratava dele e de seus queridos amigos. Olhava ao redor da casa dos pais e pensava no que diria quando se encontrasse com um dos homens que o queria morto naquele exato momento.

Dr. Q.I. Uma mente brilhante porém perversa. Com ideais que fariam o estômago de muitos dar cambalhotas, como aconteceu com Miguel. Aquela foi a mais pungente aventura do grupo. A partir dali, o senso de justiça deles só veio a crescer.

Caminhou tranquilamente pela cozinha da casa enquanto os pais dormiam. Serviu-se um jantar rápido e se sentou à mesa. Arroz, batatas com manteiga. Filé de peixe. E com o melhor tempero que se poderia imaginar. Tempero da mãe.

Antes mesmo de dar a primeira garfada, o telefone tocou. Miguel olhou na direção do relógio e constatou: 23h43min. Sentiu-se um pouco ofendido e pensou em não atender. Tinha os seus motivos. Há um mês, o telefonema da morte de Andrade mudará tudo em sua vida. O que poderia ser agora?

Suspirou em um evidente sinal de preguiça e foi até o telefone.

—Alo?

A Voz que veio do outro lado da linha era tão inconfundível e agradável para os ouvidos de Miguel, que era como um sopro na alma. Seus olhos se fecharam e um sorriso se abriu em seu rosto de homem. Porém, o espírito era de menino.

—Está um pouco tarde eu sei... Pensei em ligar para o Nicolas e pedir para ele o seu número novo. Mas, resolvi ligar para a casa dos seus pais. Seria mais fácil. — Ela disse do outro lado da linha -.

—Sabe que eu nem percebi o horário?— Miguel sorriu -

—Poxa, por onde anda você? Como você consegue aparecer e sumir de novo...

—No mesmo lugar de sempre.

—Está fazendo o que?

—Eu ia jantar...

—Me desculpe, eu ligo outra hora...

—Não... não tem problema...

—Tem sim! - Ela disse - Vai comer! Até daqui a pouco.

A pessoa do outro lado da linha desligou. Miguel ainda escutou a linha de telefone fazer seu peculiar som indicando que a chamada havia acabado.

Riu. Sentou-se à mesa da cozinha e comeu a comida que havia esfriado um pouquinho. A comida tem um gosto melhor depois de você escutar uma voz especial. Miguel constatou que aquilo era de fato verdade. Mesmo estando com fome, Miguel não se preocupou em momento algum em esperar para ouvir tudo o que aquela pessoa tinha a dizer. Como ela estava? Como havia sido o dia dela... Nada forçado, queria apenas deixar acontecer. Esperar as respostas das coisas que ele queria mesmo saber. Quando o telefone tocou novamente, ele saltou da cozinha para a sala de estar em uma velocidade assustadora para qualquer outra pessoa que o visse.

—Alo?

—Hey! E ai Kara!

—Chumbinho!?

Miguel sentiu uma gigantesca decepção. Ele adorava aquele garoto. Era o irmão mais novo que nunca tivera, mas esperava outra pessoa. Tentou ser breve.

Os Karas | Cigarros & Moscow Mule.Onde histórias criam vida. Descubra agora