Quarta-feira

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Estamos no meio da semana, levantei cedo junto com os meninos, fiz o café da manhã e os servi. Depois de tudo pronto, cada um foi para seu caminho sem dizer uma palavra, não tocamos mais no assunto e muito menos lembramos. Lucas e Diogo estavam envergonhados, e Bruno segurou até o último para não rir na frente deles.
A caminho do trabalho, liguei para minha prima para lhe fazer o convite, a mesma pulou de alegria e comentei sobre ajuda-la com as passagens, ela ficou contente por ter que se mudar e logo desligou. Cheguei no trabalho, e Antenor veio logo a minha mesa partilhar sobre o processo de como fazer o serviço, com jeito pedi a ele para não dizer mais nada, com empatia ele concordou e saiu.
Sem perceber o dia havia passado, sai do trabalho e encontrei com a Luciana no estacionamento, ela parecia mais contente, portanto me abraçou e beijou meu rosto. Ficou curiosa para saber o que havia acontecido para ter faltado ontem do trabalho, inventei uma desculpa e a mesma acreditou. Combinamos naquele momento de sair tomar um café, contou sobre o namorado de sua sobrinha o que havia acontecido, como sempre dei de desentendida e ela continuou a contar pelo o que eu passei noite passada, dei risada por dentro.
A caminho de casa, parei o carro na rua e comecei a andar um pouco a beira do rio, parecia tudo tão calmo e leve, fácil para pôr os pensamentos no lugar e saber exatamente o que estava acontecendo. Um pouco movimentado, pessoas andando a luz do luar e conversando com seus familiares, crianças correndo na ponte brincando de pega-pega. Por um momento senti um aperto no peito, peguei o celular e não havia chego nenhuma notificação, fiquei aliviada, mas também preocupada por estar silencioso.
Logo a minha frente, havia um banco vazio então resolvi sentar e fiquei admirando a vista. De soslaio senti uma presença sentando ao meu lado, não consegui enxergar mais pois não queria parecer rude por querer ficar sozinha pelo menos aquele momento único.
- Se importa? - perguntou
- Não! – respondi
- Que bom, fiquei com medo de assusta-la. - e olhei para o lado para desculpar mas, desisti, seus olhos castanho e sua pele clara encantou, o cheiro de perfume agradou meu nariz, então respirei fundo.
- Não assustou. - consegui por fim dizer algo.
- Pelo sotaque não é daqui, acertei? - deu ênfase
- Sou do Brasil.
- Que maravilha. - Disse admirado - Conheço pouco do Brasil, mas nunca conheci uma brasileira de perto. Como devo chama-la?
- Gabriela! - respondi com vergonha.
- Sou Henri, muito prazer. – disse
- O prazer é meu. - acenei
- Você não está muito afim de conversar, não é? - disse com receio
- Não é isso, só estou cansada.
- Quer tomar um café pra despertar? - perguntou se levantando.
- Será que poderia ser um chá? - perguntei com ironia no tom.
- Por que o riso senhorita? - disse confuso
- Acabei de tomar café com uma amiga.
- Chá então! - riu docilmente.
Quando nos sentamos, Henri fez o pedido e a mulher anotou rapidamente e saiu. Henri ficou olhando-me por alguns segundos mas disfarçou olhando para o celular.
- Estou segurando você aqui? - perguntei
- Eu quem te pergunto isso, senhorita. - disse ele sorrindo sem mostrar os dentes.
- Na verdade está sendo um alivio estar aqui, com um estranho. Sem ofensa - disse e depois percebi o que havia falado, fiquei rosa
- Não ofendeu. - disse com indiferença no tom - Na verdade, - hesitou sorrindo - estou me perguntando o que fazia sentada sozinha lá fora.
- Precisei espairecer um pouco.
- Atrapalhei, não é? - "ATRAPALHOU SIM".
- Não imagina, está tudo bem! - menti
- Entendi. - Disse e assim que cruzou as mãos na mesa, o chá e o café chegaram. Peguei o meu e assoprei um pouco antes de dar o primeiro gole, ele fez o mesmo.
- Tive uma noite turbulenta ontem, e hoje no trabalho foi um pouco complicado.
- Pode confiar.
- Tudo mudou, eu mudei. Minha vida está recomeçando agora, mudei para Portugal não faz nem um mês e parece que tudo está tão difícil, antes de vir eu pensei muito em recusar o emprego por causa de umas pessoas que conheci, que mora aqui.
- Agora ele não sai do seu pé?
- Ele não acredita que estou aqui, fica agindo como criança e chamando atenção com atitudes imaturas.
- Você precisa seguir sua vida, independente dele. Você veio na intenção de trabalhar, construir uma vida e sua carreira profissional.
- Eu sei, mas quando ele aparece, desanima continuar e estraga mais felicidade
- A quanto tempo isso está rolando?
- Ficamos 6 anos sem nos falar, e quando cheguei ele me procurou.
- É realmente algo para pôr no lugar, primeiro de tudo você tem que pensar em você.
- Estou tentando.
- Ainda gosta dele? - perguntou enquanto tomava um longo gole de café.
- Não sei se é gostar, pois já faz muito tempo que não o via ou conversava.
- Você está apenas balançada, porque o viu pessoalmente, não fique com medo pois isso é só uma impressão que o que você tinha dele sumiu e isso a deixa triste.
- Como eu digo isso a ele? - perguntei
- Ouça seu coração primeiro, depois pergunte ao cérebro o que deve ser feito, ele saberá a coisa certa.
- Você é sábio.
- Não diria sábio, diria que sou experiente.
- É preciso ser experiente para ser um bom entendedor. - simplifiquei
- Tuchê! - Tomou ultimo gole. - Quer ir já?
- Sim.
Nos levantamos e caminho até a porta, me despedi do Henri e o mesmo beijou minha mão como um cavalheiro.
- Vejo você por ai? - perguntou
- Espero que sim. - sorri.
De volta ao carro, abri a porta com calma e sentei no banco. Parei um pouco, e deitei a cabeça no volante, respirei fundo e fechei os olhos. Uma batida no vidro despertou do cochilo repentino.
- Olá. - Era o Henri, levantando a mão. - Esqueceu seu celular. - Abri a porta e o peguei, ele olhou em meus meus olhos e perguntou se estava tudo bem.
- Desculpe, encostei a cabeça no volante e acabei dormindo. - envergonhada.
- Tudo bem, mantenha-se acordada por favor, não quero ver a única brasileira que conheci morrer, não seria sorte isso. - e riu docilmente mais uma vez.
- Obrigada, tenha uma boa noite. - liguei o carro e dei partida, pelo retrovisor o observei ficando cada vez menor, acenou e em resposta buzinei de leve.
Em casa, tirei a roupa e entrei na banheira, coloquei um travesseiro no pescoço e deitei. Em alguns minutos acabei cochilando e não percebi, que estava tendo pesadelo, quando acordei estava em baixo da água e desesperei, levantei rapidamente e segurei nas laterais, bastante ofegante ouvi o celular vibrar ao meu lado. Era o Vinicius.
- A-alô. - Engasguei a princípio.
- Gabriela, está tudo bem? - perguntou preocupado
- Sim, acordei debaixo d'água, o que foi?
- Será que podemos conversar? - perguntou
- Sobre o que? Conversamos sobre tudo, não foi?
- Você sabe muito bem que temos que conversar, não faça joguinhos.
- Me deixa em paz Vinicius. - gritei e desliguei
O celular voltou a vibrar novamente, e de novo e uma última vez. Atendi.
- O QUÊ? - gritei mais alto
- Cadê todo mundo daqui? - disse ele, e percebi que estava assustado
- Como assim?
- Sua mãe sumiu, os vizinhos disseram que ela foi embora e não sabem onde. - E lembrei sobre a viagem, acho que ela conseguiu antecipar. Olhei para o celular, passava das onze horas e havia uma mensagem dela informando sobre a antecipação da viagem, fiquei aliviada.
- É mais um motivo para você nos deixar em paz. - Falei e ele gritou irritado.
- Vou te achar, até no inferno vou encontrar você. - Desligou. Voltei a deitar no travesseiro, e o celular voltou a vibrar, era o Bruno dessa vez, e acalmei.
- Oi Bruno! – falei
- Aonde você está? - perguntou
- Em casa, o que houve?
- Estou indo ai.
- O que aconteceu com hoje que deu de todo mundo vir falar comigo? - Pensei em voz alta. Sai do banheiro e coloquei o roupão, e uma toalha na cabeça, deitei na cama e liguei a televisão para assistir um pouco. Não demorou muito ao Bruno entrar em casa, esperei deitada na cama e o mesmo ao me ver ficou envergonhado, mas foi passageiro. Sentou na cama e ficou assistindo televisão comigo, ele estava calmo mas um pouco ofegante.
- Bruno? Diga de uma vez.
- Rompi meu noivado. - disse ele
- O que? Por que? - fiquei pasma
- Descobri que estava sendo traído, e a peguei com outro agora mesmo.
- Ai meu Deus, sinto muito. - o abracei - Aonde você viu ela?
- Estava saindo de uma loja de acessórios, sabe? Esses que vocês mulheres sempre vão, e a vi de mãos dadas com um gajo. - disse ele um pouco triste.
- Pode ser primo, não é? - tentei ajuda-lo
- Ele a beijou, a agarrou e pegou na bunda dela. - Disse ele, rindo da situação. - Aqui isso é considerado mais que um primo, e primeiro que primo não fica com prima, isso é errado aqui.
- Da mesma forma, sinto muito de novo.
- O que foi que eu fiz de errado? - perguntou
- Nada, você é perfeito. - argumentei
- Sou trouxa mesmo, estou triste. - Disse ele, mas logo se levantou. - Preciso ir, amanhã trabalho.
- Bruno, espera - segurei pela sua mão, e o mesmo apertou com delicadeza - Não faça nada que possa se arrepender depois! – aconselhei
- Jamais. - Ele parou, e ficou a me olhar por alguns minutos e seus olhos encararam minha boca, fiquei nervosa e senti a boca secar. Ele se abaixou devagar, e seus lábios tocaram o meu levemente sentindo a respiração acelerar, olhei para seus olhos verdes que encararam de volta e afastei.
- Desculpa, eu não... - levei a mão a boca - Me desculpa por isso.
- Gabi, tenha calma, aconteceu! - Disse ele, ainda no mesmo lugar - Não se culpe, desculpas por ter provocado.
Deitei na cama, e coloquei as mãos sobre o rosto, Bruno ficou parado olhando e acabou deitando ao meu lado.
- Bruno, ainda somos amigos, não é? - perguntei com a consciência pesada.
- Sempre seremos. - ficamos de mãos dadas.
- Vinicius ligou. - e notei que virou para me olhar
- O que ele queria dessa vez? - perguntou um pouco impaciente.
- Deu entender que estava preocupado pelo sumiço da minha mãe.
- Você está calma, quer dizer que sabe aonde ela está.
- Ela foi para o Japão.
- Faz muito bem ela
- Estou feliz por ela.
- Você é uma boa pessoa.
- Estou seguindo a minha vida apenas, ela tem que viver a dela de agora em diante. - expliquei - Esse mês, minha prima vem para morar comigo, espero que seja uma boa ideia.
- Não confia em mim? - perguntou
- Confio, mas ainda preciso ter uma presença feminina ao meu lado.
- Concordo, só o que apareceu a sua porta foram cuecas, somente cuecas. Isso é bom para você, mas tem momento que precisa sair da rotina, não é? - disse enquanto dava risos.
- Sim - e ri junto. - Que quarta-feira mais agitada.
- O que aconteceu? – perguntou
- Antenor, meu novo chefe. Está se metendo em problemas e ainda não sabe.
- É melhor que não se envolva nisso, ou vai acabar indo junto.
- Ele achou outra pessoa no mesmo dia. – menti
- Se ele chamou você tão urgentemente, por que não chamou outra pessoa? - apoiou um cotovelo no travesseiro.
- Não sei, mas ele está brincando com fogo. - respirei fundo - Conheci uma pessoa hoje quando vinha para casa.
- Como?
- Parei o carro, e comecei a caminhar pelas ruas.
- Isso faz um tanto bem. Qual o nome do gajo?
- Henri, conversamos pouco mas ele pareceu ser um bom rapaz.
- Todos somos bons rapazes - e deu a gargalhar novamente.
- Não seja convencido, mas você tem razão.
- Concordando ou não, aqui é um bom lugar para viver até envelhecer.
- É verdade!

- Você tem lábios macios. - fiquei vermelha
- BRUNO!!!- gritei com risos envergonhados, ele não deu a mínima e pulou em cima de mim fazendo cócegas em minha barriga. - Bruno, estou de roupão, não acho que deveríamos brincar de cócegas agora.
- Minha nossa. - Disse ele rindo baixo agora. - Não me importaria de...
- Não diga - fiquei séria, e me peguei olhando seus olhos mais uma vez.
- Não posso mesmo? - perguntou
- Você não está bem, acabou de romper um noivado, não acho uma boa ideia.
- Você é inteligente mesmo.
- Sou uma merda de inteligente.
- Obrigada por estar aqui. - disse ele
- Você que está na minha casa. - ri dessa vez
- Acertou. - Se levantou ficando em pé, olhou ao redor e percebeu que está sem os sapatos. - Preciso ir, obrigado por tudo. - se despediu com um beijo na testa e foi para sua casa.
Coloquei o relógio para despertar, sequei o cabeço e fiquei deitada na cama, passava da meia noite e nenhuma surpresa, acabei dormindo sem planejar.
Acordei em outro lugar, em uma casa totalmente diferente da minha e grande, tudo tão limpo e branco que fiquei assustada. Continuei andando pela casa, um corredor surgiu continuei caminhando com receio, as portas estavam fechadas menos uma, resolvi entrar em uma que estava decorado num tom azul bebê, ele cheirava a talco e shampoo masculino, do meu lado direito havia uma cama de solteiro e um guarda-roupa. À minha esquerda, um berço de criança com ursos de pelúcia dentro, andei até ele e fiquei observando, e um macacão azul esticado esta nele, o peguei com cuidado e cheirei, aquele cheiro de talco e shampoo vinha do macacão.
Sem hesitar, o abracei até pegar o cheiro no pescoço, ao meu redor parecia estar tão calmo e silencioso, que resolvi sentar na cama, quando sentei finalmente fiquei olhando para o teto que tinha alguns desenhos artísticos que lembrou ao desenho que fazia quando era mais nova. De repente ouvi um barulho de pegadas do corredor, em pé esperei, pois, estava perto o suficiente para não dar tempo de esconder. Apareceu logo na porta, olhando com cautela o quarto depois em mim, fiquei em silêncio e não consegui soltar uma palavra sequer, ele andou em minha direção sem hesitar, não pude deixar de notar o que havia em seus braços, estava inteiro embrulhado numa coberta azul escura, quando ficou mais próximo pude enxergar seu rosto pequeno encarando-me de volta. Sem perceber, meus olhos estavam marejados, e os do bebê fechando a cada bocejada que dava, olhei para cima e vi seus olhos em mim, aqueles olhos sombrios iguais aos meus, ele dizia muitas coisas, dizia que sente muito, e que ainda me ama. Uma lágrima caiu sobre a bochecha, e ele os fechou, cada vez mais implorando que sentia muito pena o bastante para segurar o bebê, olhei para o mesmo e o peguei com cuidado. Ele sentou na cama, e começou a chorar sem motivo, observei seu comportamento fiquei pedindo para ter calma que estava tudo bem, ele ficou em pé e foi até a porta, chamou alguém e nesse momento entrou todo mundo que conhecíamos, inclusive as que ele não conhecia, mas por minha causa os chamou. A princípio fiquei preocupada, não entendi o porquê daquele tumultuo, e todo mundo parecia estar feliz com algum motivo que não saberia dizer qual seria. A minha volta, todos olhavam-me na espera de alguma coisa, fiquei em silêncio olhando o bebe a cada cinco minutos para ver se estava tudo bem.
- Obrigado por terem vindo aqui. - Disse ele. - Eu, Vinicius venho em paz mundial para contar-lhes uma história, uma história que não poderia contar a ninguém, e por um milagre eu conto porque uma pessoa ajudou a mudar. Ela, - apontou para mim - que sempre acreditou na mudança, no milagre e mais do que tudo, em Deus. - Sorriu, causando espanto apenas em mim por não entender o que estava acontecendo. - Gabriela, sei muito bem o que fiz até chegarmos aqui, mas o que sei realmente que nunca deixei de te amar, peço desculpas por tudo, na frente de família e de amigos, eu peço perdão por tudo. - Se ajoelhou de repente, arregalei os olhos em resposta, ainda com o bebe no colo. - Gabriela, - minha mãe pegou o bebe do meu colo e Vinicius pegou minha mão. - Peço a você, e prometo na frente de todos que serei o homem mais feliz desse mundo, por estar ao lado de uma mulher espetacular como você, que jamais soube o que era dificuldade, mas sim, sempre teve solução, eu Vinicius peço a tua mão em casamento. - Comecei a tremer e entendi o porquê minha mãe pegou o bebe dos meus braços. - Você quer casar comigo? - perguntou
- É o que todos esperamos, não é? - Perguntei, e percebi depois o que havia falado, ele ficou sério e todos decepcionados com minha resposta. - O que vocês acham disso pessoal? Ele não é assim como está sendo na minha frente, ele me espancou e por culpa dele, eu perdi o bebe, - olhei para o bebe - ele não é meu, vejam! - Peguei do colo da minha mãe. - É APENAS UM BONECO, QUEM VOCÊS QUEREM ENGANAR? VINICIUS, VOCÊ NÃO MERECE SER FELIZ, VOCÊ TEM QUE LUTAR POR ISSO NEM QUE LEVE ANOS. - E sem hesitar, ele respondeu com um soco no olho, cai no berço com tal força que desmontou, ao redor todos o tentou segurar. Minha família ficara nervosos, pegou o Vinicius e arrastaram ele do quarto, disseram que estava enlouquecendo e pensou que havia tido um bebe, quando viram que era um boneco surpreenderam até que ponto Vinicius chegou, para ter o que quer.
- Você não viverá sem mim. - Foi a última coisa que disse ao ser arrastado do quarto.

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