- Como é que não consegues perceber isto?
- Asher, nem toda a gente é tão magicamente inteligente quanto tu. Ajuda-me sem seres um idiota. – revirei os olhos e voltei a reler o parágrafo que Jake não estava a entender.
Estávamos há duas horas na mesma explanada, a ler o mesmo artigo, para eu explicar sempre as mesmas coisas. Jake não tinha dificuldades, aliás, era praticamente o contrário disso. A verdade é que, naquele dia, nenhum de nós os dois estava muito focado. No dia anterior, Mia não tinha aparecido nas aulas e era sábado, portanto nada me garantia que a fosse ver outra vez. Eu não tinha necessidade de a ver, não era isso, mas aquela ferida no seu braço estava a preocupar-me.
Suspirei e voltei a tentar explicar o que estava explícito no artigo a Jake. Não sabia o que se passava com ele, mas sabia que haveria de estar relacionado com o facto de o seu namorado ontem ter ido a uma festa qualquer e ainda não lhe ter dito nada. Procurei não aterrorizar muito o meu amigo com isso, mas eu achava que a situação era normal. Pobre rapaz, devia estar a sofrer de uma ressaca enorme, nem se lembrou de falar com o seu namorado. Sorri ao meu amigo, com uma expressão divertida, mas ele limitou-se a dar-me um murro no braço e obrigar-me a focar-me no trabalho em mãos.
- Eu não sou o único dos dois que não está concentrado. Asher...conta coisas.
Ri com a expressão. Conta coisas era aquilo que, desde os nossos doze ou treze anos, dizíamos um ao outro quando desconfiávamos que o outro não nos estava a contar algo. A primeira pessoa que nos disse isso foi o pai de Jake e ficou como a nossa coisa. Mas, a verdade, é que eu não tinha coisas para contar. Não estava pronto para lhe falar de Mia, porque sabia o que iria acontecer. Jake iria exagerar tudo o que eu lhe dissesse e achar que eu já estava apaixonado pela rapariga – era o que ele fazia, essa era a sua coisa. A minha era rir-me da cara dele sempre que ele me aparecia com problemas amorosos, algo que já não acontecia tão frequentemente no último ano, desde que Miles apareceu e me roubou do prazer de ver o meu melhor amigo sofrer.
- Não há coisas para contar. Agora, presta atenção que eu só vou repetir isto mais uma vez. – ele semicerrou os olhos mas deixou-me desviar o assunto, até porque ele precisava mais da explicação que eu.
Dez minutos depois, ele já tinha percebido todo o documento, mas eu certifiquei-me de ele apontou tudo para que dali a algumas horas, quando ele já se tivesse esquecido de tudo, não me fosse chatear mais uma vez. Pedi mais um chá ao empregado, quando ele veio limpar a nossa mesa, e Jake pediu um café. Sorrimos educadamente e contei até dez na minha cabeça, até que o meu amigo decidisse voltar a si mesmo a chatear-me com o assunto que tínhamos abandonado por alguns minutos.
- De certeza que não há coisas para contar?
- Sim.
- Então porque é que aquela rapariga está a olhar tão fixamente para ti?
Olhei para ele com uma expressão confusa, até ele forçar a minha cara a virar-se. Por dois segundos, pensei que fosse a Mia, mas algo na rapariga que estava a olhar para mim estava diferente. Tentei pensar o que era, até encontrar os olhos da pessoa em questão e ser confrontado com uma cor clara que, devido à distância entre nós, me parecia avelã. Não era a Mia, de certeza, mas em tudo o resto ambas eram iguais. Até que olhei um pouco mais para a esquerda e a vi. Ri com a ironia da confusão de Jake, porque ele de certeza que iria pensar que a desconhecida assustadoramente parecida com a Mia era a coisa que eu não queria contar. Mal ele sabia.
Ao lado da desconhecida, estava a Mia. Os seus cabelos compridos baloiçavam graças ao vento e à forma como ela abanava a cabeça ao ouvir música a partir de uns auriculares enormes e brilhantes que me ofuscavam. E eu estava longe. Ambas estavam sentadas na fonte grande no centro da praça onde nos encontrávamos e eu revirei os olhos, voltando a focar-me no meu melhor amigo. Grande erro, porque ele notou que eu perdi mais tempo a observar a "outra" rapariga que aquela que ele notou primeiro. Entretanto, antes que ele pudesse falar, foi interrompido pela chegada do empregado do café que colocou os nossos pedidos na mesa e recebeu o nosso dinheiro.

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Cair e Levantar
Ficção GeralAsher era um rapaz simples: gostava de chá, de ter boas notas e de não perder a sua paciência. Mia era igualmente simples: gostava de ouvir músicas pop, de cantar músicas pop e, principalmente, de irritar Asher enquanto o fazia. All Rights Reserved...