Garotas Lomber

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( Ben on ) 
   Tudo havia acontecido muito rápido. Naquele dia, mais cedo, meu pai havia me ligado e pedido que eu levasse alguns papéis para ele. Ele estava de plantão naquele dia, mas pela manhã ele deveria voltar para casa. No entanto, um caso de emergência surgiu, e ele se recusou a passar o caso para outro médico. Então, eu tive que acordar um pouco mais cedo para entregar os tais papéis. Naquele dia eu deveria entrar cerca de 15:00 p.m, pois no dia anterior havia sido meu plantão. Confesso que tive certa raiva quando descobri que um paciente tinha me feito acordar mais cedo no meu dia de folga, mas a raiva passou no momento que me encontrei com April no elevador.
   Aquela menina, desde o primeiro instante, mexeu comigo. Não sei bem como explicar, talvez não tenha definição; talvez seja algo inexplicável. Então, encontrá-la ali, fez meu dia melhor. Mas ao vê-la em desespero daquele jeito, dizendo que estava indo para o hospital por conta da amiga dela, eu entendi tudo, e confesso que me senti horrível por ter sentido raiva daquela tal paciente, sendo que era alguém tão importante para April. Por isso eu soube onde Hannah estava, afinal, meu pai estava a operando. Eu sabia bem qual cirurgia era, mas eu não podia falar ali sem ter certeza, sem contar que ia quebrá-la.
   Fomos ao hospital, e quando entrei na sala de cirurgia e vi que estava tudo bem, me senti um herói por poder contar à April que sua amiga estava bem. Mas minha alegria não demorou tanto assim. Cheguei na UTI para ver como Hannah estava, e me deparo com April à beira de um ataque. Fiquei meio sem entender, mas logo me explicaram. E a partir de então, tudo voou. Foi como naqueles seriados em que tanta coisa ocorre em tão pouco tempo.
   Quando me dei conta, eu já estava voltando ao quarto em que 'internamos' April com os resultados dos testes. Ela era 100% compatível. Engraçado, pois até algumas semanas atrás ela mal sabia que aquele homem era seu pai, e agora, estava prestes a doar um pedaço de seu fígado pra ele!
   A parte mais difícil, ao meu ver, foi quando a família de Jackson chegou. Uma enfermeira me disse que a família do paciente havia chegado, então eu senti meu estômago cambalear, porém eu precisava fazer aquilo. Desci de escada, tentando enrolar ao máximo e ganhar tempo para pensar em como dizer que o marido dela tinha uma FILHA! E que ele precisava de um fígado e essa garota estava disposta a ajudar. Mil coisas passaram pela minha cabeça. E se ela fosse uma louca e me atacasse por dar aquela notícia? Era uma possibilidade. Eu já havia sido atacado por parentes de pacientes. Nem todos reagem bem à certas coisas.
   Cheguei à sala de espera, e no momento que vi sua esposa e suas filhas, senti um alívio imenso. Elas pareciam ser muito simples. Tinha sua esposa, Amanda R. Lomber, e duas garotas, uma mais ou menos da minha idade, Alina Lomber, e uma com cerca de 15 anos, Clara Lomber. Me aproximei, dizendo que eu era um dos médicos no caso de Jackson. Amanda imediatamente se levantou, com uma cara de choro, e as duas garotas levantaram junto. Clara abraçava Alina como se dissesse que tudo ia ficar bem. Eu expliquei o quadro do jeito mais sútil possível. Mesmo assim, ao dizer a situação de seu fígado, Amanda começou a chorar, dizendo que ela era a culpada, pois havia pedido pra ele ir ao banco fazer um depósito. Eu a acalmei dizendo que não era culpa dela, que foi um acidente. Alguns segundos depois, Alina perguntou:
   – Mas, e o fígado? Ele precisa de um transplante, certo?
   – Sim, ele precisa de um transplante de fígado, o mais rápido o possível... - hesitei um pouco antes de falar sobre April, mas lembrei que elas estavam sendo muito fortes e legais comigo, elas mereciam saber as opções, por isso disse - Olha, tem algo que vocês precisam saber..
   As três me olharam com um brilho nos olhos.
   – Bom, não sei exatamente como falar isso. Uma amiga minha encontrou recentemente com seu pai, que a abandonou antes mesmo que de ela nascer. Hoje, ela estava aqui por conta de uma amiga dela, que estava em cirurgia, e enquanto ela estava na UTI com a amiga dela, ela viu Jackson chegar, e ter paradas cardíacas, e tudo mais. Garotas, ele é o pai dela. Há algumas semanas ela descobriu a história toda, mas não falou com ele, pois estava com raiva. Então ela se sentiu péssima ao ver ele naquele estado. Como ela é filha, tomei o direito de contar o que aconteceu. Ela, então, pediu para ser testada para doar parte de seu fígado. Os testes foram feitos e ela é 100% compatível. Ela está completamente disposta a fazer isso. Creio que ela seja nossa melhor opção.
   Acabei de falar, e não soube se elas estavam satisfeitas, confusas ou outra coisa. Mas um tempinho depois, Alina, que estava paralisada até então, disse:
   – Eu... tenho uma irmã? Digo, outra irmã? Além da Clara eu tenho uma irmã que eu nunca conheci?
   – Sim, Alina. O nome dela é April, ela é americana. Ela veio de Portland pra cá recentemente. Ela não fala português tão bem... Mas se vocês quiserem conhecê-la, ela está lá em um quarto, posso levar-las para lá.
   – I was had a good english, so it won't be an issue. (Eu sempre tive um inglês bom, então isso não será um problema.) - Alina soltou.
   – Quer que eu te leve até ela?
   – Eu quero que me teste antes. Minha mãe é A+, não pode doar para ele. Minha irmã é O+, também não pode. Somente eu e meu irmão gêmeo, Bruno, somos O- que nem meu pai, mas ele está na Argentina. Se alguém, além dessa outra menina, pode doar o fígado, essa pessoa sou eu. Quero que me testem, por favor.
   Eu concordei e fui fazer os testes. Voltei meio decepcionado, pois ela não era compatível, e eu não queria que April realmente fizesse aquela cirurgia. Expliquei para ela, e então ela disse:
   – Posso conhecê-la?
   – Sim, claro! Ela vai ficar bem feliz em conhecer vocês!
   As três sorriram. Eu, então, as guiei até o quarto de April, no final do corredor.
  

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