Capítulo 40

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ELE

Hoje depois de ter dito tudo aquilo ao soldado Guimarães, ela surgiu em meus pensamentos. Não consigo parar de pensar que ela adoraria essa ideia de rebelião, e com toda a certeza acredito que ela seria muito mais eficiente em criar planos rebeldes do que eu.

Automaticamente sempre que penso nela, lembro que ela supostamente possa ter assassinado meu pai. Confesso que no começo eu senti raiva, mas agora tudo é diferente. Vejo que a culpa de ele ter morrido não foi somente dela, mas minha também, eu sou mais culpado do que ela. Nem sei se ela sobreviveu àquela queda e só de pensar nisso, meu peito se aperta e a uma dor perfura meu coração. Não consigo descrever o que realmente sinto por ela. Tudo que sei é que não é raiva, nem ódio. É algo tão mais forte que anula tudo isso, e que mesmo sem saber se ela está viva eu não consigo parar de senti-lo.

Todas as noites antes de dormir eu desejo que ela esteja aqui comigo, só assim eu descobriria a verdade de uma vez por todas. Talvez ouvindo tudo de sua boca, eu seja capaz de acreditar que ela possa ter assassinado ele. Mesmo com todas as evidencias apontando que eu matei a presidente, ela me deu um voto de confiança. E farei o mesmo por ela, pois ela me provou que é mais que merecedora do benéfico da duvida.

Fico refletindo sobre tudo que eu havia dito ao soldado Guimarães e para ser sincero comigo mesmo, ainda não tenho plena certeza sobre tudo que eu disse, mas sei que algo precisa ser feito e tem que ser logo. Pelo caminho que as coisas estão seguindo, estamos indo em direção a uma guerra sem fim.

Combinei de me encontrar com ele no jardim, na madrugada para explicar melhor o que realmente pretendo, no entanto ele já entendeu exatamente o que eu quero. Estou fazendo todas as minhas apostas nele, espero que ele realmente possa me ajudar a tirar o sargento Eduardo do poder. Eu ainda não sei o que fazer depois que ele estiver fora de rota, mas tenho certeza que tanto quanto eu desejo, sei que muitos soldados também querem o fim dessa maldita guerra.

Antes eu me perguntava como esses soldados são capazes de fazer tudo o que fazem e ainda assim conseguirem viver em paz? Contudo eu percebi que estava completamente enganado. Muito deles também são vitimas desse sistema, são escravos obrigados a lutarem nessa guerra. Grande parte deles é formada por democráticos que se renderam ao ditador, acreditando que ganhariam clemencia e liberdade, entretanto eles foram apenas escravizados com o próprio consentimento. Os que não são exterminados e nem mandados a campos de trabalho e exploração, viram soldados do ditador. Sob constantes ameaças de que suas famílias sejam bombardeadas no estado do Espirito Santo, eles fazem tudo que o ditador manda.

Eu quero mudar tudo isso. Quero eles acreditem que possam realmente ser libertados dessa escravidão, dessa falsa liberdade. Sei que por muito tempo eles irão carregar as marcas dessa guerra, mas se todos nós quisermos encontrar a paz, vamos ter que aprender a superar tudo e todas as diferenças.

Não há mais ninguém nos corredores. Eduardo já se recolheu para o seu quarto, e somente dois soldados guardam as portas. Desço as escadas cuidadosamente para não fazer alarde. Do lado de fora alguns soldados fazem a ronda, espero até a troca de turno e sigo para jardim.

Guimarães ainda não chegou. O relógio marca três e treze da madrugada. Ele está atrasado. Será que desistiu? E se ele contou tudo ao Eduardo? E se descobriram tudo? A cada minuto que ele demora, as duvidas vão se acumulando na minha cabeça e não consigo parar de pensar de que tudo deu errado. Vou esperar mais alguns minutos se ele não chegar vou embora, não posso correr risco sozinho aqui. Escuto alguém pisando nas folhas secas. Será que é ele? Meu coração se alivia quando ele surge por entre as plantas.

- Você demorou. Digo. - Já estava indo embora.

Ele me olha com um olhar estranho, como se eu não estivesse falando serio.

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