Segundas Opções

80 24 26
                                    


Guilherme ficou sentado na minha frente durante uns minutos, ascendeu o cigarro e olhou os vaga-lumes dando voltas na gente. Ele não falou durante uns dez minutos, e eu entendia perfeitamente, ele estava prestes a se abrir como nunca fez antes.

-Comece você - ele diz. - Você deve ter outras coisas pelo oque lutar né? 

-Sim... Na verdade. Eram minhas primeiras opções até te conhecer.

-Nossa.

-Não foi um fora - digo rindo.

-Então, meu pai, Vitor, morreu quando eu tinha apenas doze anos, desde então eu morava com minha mãe, Rita e meu padrasto Arthur - respiro. Oque eu tinha feito de interessante? - Bom, eu passei em medicina em 2013, depois disso comecei a residir nesse hospital... E to aqui, conversando com o maquinista que salvei.

Ele me olha de esguelha e não pronuncia uma palavra sequer, já estava na metade de mais um cigarro.

-Saí de casa, arrumei esse emprego e moro sozinha. Deixei meus familiares, amigos e meus amores. Parecia ser o certo a se fazer...

-Parecia?

-Quer dizer, ainda é. Mas... Parece que quando atingimos um sonho, descobrimos que a raça humana é alimentada por expectativas. Sempre queremos mais e mais - termino de dizer, minha vida não era nem um pouco interessante. - Eu sei que eu amo oque faço, mas eu quero mais. Nosso corpo sente que deve atingir o êxito.

-Êxito?

-Guilherme, para de fazer perguntas, você tá entendendo.

-Eu não.

-Êxito no sentido de vida, de fazer tudo que passa na televisão, no teatro, nos livros...

-Você pensa em ser escritora?

-Escrever dá um trabalho.

-Começa por um aplicativo, sei lá - ele diz como quem já soubesse uns meios.

-Você pensa em escrever? - pergunto.

Logo seus olhos se enchem de brilho.

-Eu escrevo já, uns livros por esse aplicativo que lhe falei. Um se chama "Sonhos de Elle".

-Bonito nome, quem foi Elle? - pergunto.

Ele me olha de relance.

-Será o nome de nossa filha...

Guilherme começa a rir e eu também.

-Não teremos filhos.

-Teremos sim.

-Não.

-Veremos.

-Não seremos nem um casal.

Voltamos a rir, que saudade que eu estava daquele sorriso, daquelas covinhas e daquele jeito que ele me fazia sorrir igual. Guilherme é aquela pessoa que você conhece há tão pouco tempo, mas já sente que é de anos. Sabe?

-Agora fale.

-Tudo bem - ele diz finalmente soprando a fumaça e jogando o cigarro no chão. - Vamos lá. Por onde eu começo?

-Pelo começo.

Ele me olha de relance e coloca a cadeira do meu lado, observamos os prédios juntos.

-Sou filho de João e Maria, pode parecer brincadeira, mas é sério. É o nome deles. Com sete anos de seu filho, João bateu tão forte em Maria que ela se separou, depois disso, até os quinze anos de Guilherme, eles não se viram nunca mais. Com quinze anos... Ela viu que não tinha como viver sozinha com um filho, e voltou, não por amor, mas por condição - ele diz, os olhos cheios de lágrimas.

Alexia, Guilherme E As Segundas OpçõesOnde histórias criam vida. Descubra agora